Apesar de as depredações e pichações da noite de ontem terem conseguido ofuscar o caráter pacífico das manifestações em Brasília, a grande maioria das 35 mil pessoas esteve no gramado central do Congresso com ideias bem nítidas do que quer. Boa parte dos manifestantes ouvidos pelo Congresso em Foco reclamou dos gastos estatais para a Copa do Mundo de 2014.
Mas também não faltaram reclamações contra a mídia, contra os próprios manifestantes e até pedidos de uma reforma política. Outras reivindicações, como a derrubada da PEC 37, que proíbe o Ministério Público de investigar, o fim do voto secreto nas votações do Congresso, e investimentos em educação e saúde, também estiveram presentes. Por aproximadamente seis horas, o gramado em frente à sede do Legislativo foi palco de danças, palavras de ordem, brincadeiras e, por uma minoria barulhenta, confrontos e destruição.
No meio da confusão, o empresário Gabriel Emiliano de Andrade aproveitou um equipamento eletrônico que tinha em casa para transmitir mensagens a todos os manifestantes. Com um computador, um gerador de energia e um projetor de raio-laser, o empresário projetou na cúpula da Câmara a palavra “paz”. Na hora em que os primeiros traços verdes surgiram, os manifestantes aplaudiram e cantaram o hino nacional. Depois, mensagens de apoio foram projetadas.
“É a minha forma de levar a mensagem sem interferir no patrimônio. Eu sou contra as pichações, então encontrei essa forma de levar a minha mensagem a todos”, disse. Momentos antes, uma parte dos manifestantes correu para o Palácio do Itamaraty. Vidraças foram quebradas, uma porta incediada e paredes pichadas. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, disse ter ficado “muito indignado” com o que aconteceu. A Polícia Federal passou a manhã no prédio fazendo a perícia do local.
Veja alguns dos depoimentos colhidos pelo Congresso em Foco:
Ivan Veit, 38, autônomo – “Vim para reivindicar os meus direitos. Fico indignado sempre que leio que o governo gastou bilhões nos estádios. A gente chega nos hospitais e não tem nada. Nossos filhos não têm escola. Queria mesmo que eles devolvessem o dinheiro mas sei que não vai ser possível. Então quero que eles pensem melhor daqui para a frente.”
Pedro Matos, 27, servidor – “Eu vim sozinho ver as manifestações. Acho preocupante ter uma pauta genérica porque ela acaba se tornando inócua. A mídia se apropriou do discurso e usa ele do jeito que quer. Então destaca as pautas de reivindicação que interessam para ela. O movimento precisa ter uma pauta definida que eu acho que devia ser a tarifa zero do transporte público. Agora, o que eu acho mais válido desse movimento todo é que as pessoas estão ocupando as ruas. As pessoas estão vendo que a rua é um espaço político.”
Guilherme Marques Sousa, 19, estudante – “Acho que as manifestações são um pouco atrasadas. O país já gastou bilhões de reais com a Copa e todo mundo ficou sabendo disso. A gente tinha que ter manifestado antes para evitar os gastos. Mas agora já foi. E outra coisa, se o país quisesse ter investido mais, poderia ter investido. O país arrecada trilhões em impostos e para onde vai todo esse dinheiro? O mau investimento só vai acabar quando o Brasil chegar em uma ordem. Mas agora, diante disso tudo, o governo vai passar a pensar melhor no que fazer antes de investir. O governo está com medo.”
Marco Antônio Siqueira, 18, estudante – “Sou a favor da manifestação claro, mas esses atos de vandalismo acabam com qualquer animação nossa. Precisamos ajudar a construir o Brasil e não destruir nosso patrimônio.
Rodrigues Gomes, 37, psicólogo – “Esse legislativo não representa o povo. Precisamos convocar um plebiscito porque o governo precisa ouvir o povo. Precisamos fazer uma reforma geral e isso só vai acontecer se vier do povo. A reforma política que está no Congresso não vai mudar nada. O povo precisa agir e começou a fazer isso agora. O país com certeza já mudou com essas manifestações.Eu também estou protestando contra o uso da urna eletrônica. A UnB e outros já provaram que ela é facilmente fraudável. Já está esquematizado quem vai ganhar no ano que vem.”
Rosalba Nunes, 65, aposentada – Eu sempre participo de todas as manifestações. Venho com a minha família e amigos. Acredito nas manifestações porque a gente tem que lutar pelos nossos direitos. Participei das diretas já, do Fora Collor e de várias outras. Acho que estamos sim vivendo um momento de mudanças e eu quero ajudar a fazer isso. [Ela estava participando de uma roda de samba] O samba tocado aqui no meio da manifestação agrega a nossa cultura, o que nos faz ser brasileiros e engrossa os nossos gritos por um país melhor.
Fonte : Congresso em Foco