Nesta última semana o Brasil recebeu a visita inusitada da blogueira e ativista cubana Yoni Sánchez, que veio falar do seu polêmico site “Geração Y” – uma referência a esta nova geração superconectada via internet.
Yoani apresentou para o mundo uma série matérias esclarecedoras quanto a realidade por trás da revolução cubana.
Abordando temas gerais como economia, emprego e renda, drogas, liberdade de expressão e cultura política, ela divide com o mundo os eventos cotidianos de uma Cuba que só é vista pelos cubanos.
O povo cubano não lê o blog desde que o governo bloqueou seu acesso no país. Sequer Yoani que é proprietária do site consegue ver o que posta e por isso ela é chamada de “blogueira cega”. Porém entusiastas de seu projeto, de diversas nacionalidades, tem se proposto a não apenas atualizar o blog para ela com as matérias que Yoani escreve, como tem traduzido seu conteúdo para mais de 15 idiomas, numa espécie de movimento de solidariedade internacional á favor da liberdade em seu país.
O Partido Verde que em seus 12 valores defende “o exercício da democracia representativa, através do processo eleitoral e da existência de um poder público eficiente e profissionalizado, combinado com mecanismos participativos e de democracia direta, sobretudo a nível local, através de formas de organização da sociedade civil e conselhos paritários com o poder público” – em seu valor 3 e a “liberdade de expressão política e cultural, criação artística e informação” – em seu valor 5, não poderia deixar de prestar sua opinião política diante da condição de Yoani e seu povo.
Sendo assim, em uma oportunidade especial o Partido Verde, representado pelo nosso Presidente Estadual Marco Antônio Mroz, foi ao seu encontro prestar nossa solidariedade a sua luta pela liberdade de expressão no evento “Conversa com Yoani” organizado pelo Estadão em sua sede.
O BATE PAPO
Yoani sobre Raul Castro (irmão de Fidel Castro, que está no poder desde que este apresentou sinais de debilidade física):
” Raul sabe que não sustentará o regime com a mesma energia que Fidel e ensaia reformas que vão na direção da abertura, mas num rítimo muito lento.
Sobre o direito de sair do país por exemplo, que está começando a ser permitido, hoje já não há tanto controle sobre coisas simples como as roupas, pois Raul percebe que não pode exercer o mesmo controle.”
O Estadão: O que é o comunismo para você? Se relaciona bem com ideologias?
Yoani responde: “Não. Me relaciono bem com conhecimento científico, mas não com ideologias…não creio que Cuba seja socialista, menos ainda comunista. No período soviético houveram ensaios nesse sentido, mas hoje o que há é um governo que exerce o papel do capitalismo, oprimindo o povo da mesma forma que condena.”
O Estadão : Como é a situação dos serviços públicos em Cuba?
Yoani responde: “Há uma boa infra-estrutura que recebemos de ajuda soviética, mas com a queda do muro de Berlim houve um sucateamento dos salários e materiais.”
O Estadão: Há alguns anos você escreveu uma carta contendo perguntas a Raul Castro e a Barack Obama e os enviou. Como foram estas respsotas?
Yoani responde:”Não foi nenhuma novidade o silêncio do governante cubano, mas para minha surpresa Obama me respondeu. Enviei uma carta a Barack Obama e Raul Castro no sentido de tentar uma aproximação diplomática entre nossos países e de saber o posicionamento dos Estados Unidos em relação a uma invasão que o governo cubano diz que está prestes a acontecer há 30 anos! Enviei respeitosamente as cartas. Raul não respondeu, mas Obama me respondeu dizendo que não há nenhum plano de invadir Cuba.”
Yoani disse ainda que havia até treinamento de uso de armas para se prepararem para essa invasão.
“Na Alemanha me perguntaram se eu era cubana de Miami ou de Fidel. Me senti ofendida. Sou cubana da minha mãe e do meu pai. Sou cubana de Cuba!” Yoani Sánchez
O Estadão: Sobre sua opinião sobre o bloqueio econômico Yoani brinca “Vou levar uma gravação comigo para onde eu for, pois essa é uma questão que todos querem saber!”
Yoani responde:”Ele é ruim porque aumenta a precariedade do povo, mas também porque serve sempre de desculpa para o governo cubano sobre o sucateamento e as limitações materiais da vida que levamos lá em Cuba. Então qualquer problema social será sempre culpa do bloqueio econômico e não de uma má gestão.
Os Cubanos que não recebem dinheiro enviado de parentes de fora do país, ou não possuem outras funções extra salário como um táxi clandestino, prostituição ou emprego em algum órgão público, “passam muito mal” e Raul já reconheceu que com estes trabalhos “alternativos” o salário oficial cubano não é a principal fonte de recursos no país.
Sem açúcar também não há país, mas eu penso que Cuba deveria focar mais em serviços, assim como o turismo ainda pode acrescentar muito mais.”
O Estadão: Mas e o povo, ainda assim festeja Fidel?
Yoani responde:”O mesmo povo que sofre, faz festa para os dirigentes… isso é Cuba. Eles nos fazem crer que o país não nos pertence. Então isso desanima o povo a fazer alguma coisa, além do medo da morte. Isso faz com que as pessoas busquem resolver sempre seus próprios problemas nos “trabalhos alternativos”, cada um por sí.”
O Estadão: Que sistema você considera o mais adequado no mundo?
Yoani responde:”Não consigo pensar em sistemas prontos para se encaixar em Cuba, pois nossa experiência é única e possui condições tão próprias que a alternativa para o modelo atual também deve levar em consideração essa realidade única.
Gostaria muito que em Cuba pudéssemos ter um Parlamento com a gritaria de debates de idéias que vocês tem aqui, mas não temos. É praticamente impossível um representante dissonante das idéias do Partido Comunista Cubano chegar ao poder lá, pois são todos indicados entre si e pelos comitês de defesa da revolução. A pluralidade ajudaria a mudar, mas isso não é possível no atual sistema de poder.
Estes comitês de defesa da revolução atualmente tem perdido muita força, mas ainda são células que controlavam tudo, até a decisão de quem é considerado insano mentalmente.”
O Estadão: O que pensa sobre a regulação da mídia?
Yoani responde: “A mídia tem uma importância muito grande. Mas temos uma mídia que vai em paralelo e a distancia da realidade.
A imprensa em Cuba é privada do partido comunista. Apenas dois grandes jornais, eles falam que Cuba é um paraíso e o mundo um inferno.
Adjetivos positivos para as notícias internas e verbos negativos (matou, roubou) para as internacionais.
A imprensa cubana tem uma condição de trincheira, não de informação.
Os jovens estão criando uma oposição artística inteligente e utilizando as mídias sociais para fazerem a crítica mais bem feita.”
O Estadão: E a você e suas idéias, quais as instituições que te apóiam e como você tem rodado o mundo?
Yoani responde:”Algumas me enviam o convite para eventos onde me oferecem o mínimo, como as passagens para que eu vá comparecer, mas a solidariedade é o que mais me conta. Amigos que tenho feito em minhas andanças me hospedam em seus sofás para que eu cumpra as agendas, e diante disso eu me considero uma mochileira.”
Sobre os ataques que vem sofrido de militantes ligados aos partidos brasileiros que apóiam o atual governo cubano e que vem impedido seus debates acontecerem, Yoani rebate dizendo que admira a livre expressão de idéias divergentes das suas, como uma entusiasta dessa liberdade aqui, mas não aprova a violência física e verbal que alguns desses militantes vem imprimido ao impedir que seus debates aconteçam.
Muito habilidosa Yoani, que sabe que estes militantes também apoiam o governo Dilma Rousseff. Para finalizar ainda usou uma frase da Presidenta: “Prefiro uma mídia barulhenta à uma ditadura silenciosa.”
Yoani Sánchez, atualmente é Jornalista correspondente e colunista em três jornais pelo mundo, incluindo o Estadão no Brasil e sustenta sua família e seu projeto com os salários que recebe por seu próprio trabalho.
Fonte : PV-SP