Foram mantidos os sete indiciamentos feitos pela Polícia Civil, de seis diretores e gerentes afastados da Samarco e um engenheiro da VogBR. Também foi incluído um gerente da Mina Alegria, da Vale
Inquérito da Polícia Federal, apresentado na tarde desta quinta-feira, reitera falta de monitoramento da Barragem do Fundão, plano de emergência “ruim” e acusa mineradora de reduzir verba de geotecnia. Foram mantidos os sete indiciamentos feitos pela Polícia Civil, de seis diretores e gerentes afastados da Samarco e de um engenheiro da VogBR. Também foi incluído um gerente da Mina Alegria, da Vale, como culpado. Todos vão responder por crimes ambientais e danos contra o patrimônio histórico e cultural.
O inquérito possui 12 volumes, com 3,7 mil páginas, e mais 24 apêndices, que tem o dobro de páginas do inquérito principal. Segundo o delegado Roger Lima de Moura, chefe da Delegacia de Crimes contra o Meio Ambiente e Patrimônio Histórico, foram diversas as constatações que puderam ser obtidas por meio de laudos e depoimentos que indicam que a barragem foi mal construída, mal monitorada, usada acima da capacidade e que a Samarco não tomou providência para evitar o acidente, mesmo tendo ciência de todos os problemas.
De acordo com o inquérito, a taxa de alteamento da Barragem do Fundão, representada por obras para ampliação, foi elevada acima do recomendado por normas técnicas. “A Samarco, visando a produção em detrimento da segurança, fez alteamento acima do limite das normas técnicas e também de seu manual”, disse o delegado Roger Lima, referindo-se aos alteamentos que chegaram a 15 metros ao ano, enquanto o manual da mineradora previa seis metros ao ano. As normas técnicas permitem até 10 metros anuais. Ficou constatado que o manual de operação da empresa estava desatualizado havia mais de dois anos e que ele teria que ser mudado, porque houve, além dos alteamentos, recuou no eixo da barragem.
As investigações mostram que a mineradora não tinha um responsável técnico credenciado no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea) desde 2012. Sobre o licenciamento, segundo a PF, foi feito sem cumprir condicionantes.
A PF também apontou falhas na construção da Barragem do Fundão. Perícias detectaram que ela foi construída com materiais de baixa qualidade. Em vez de brita e rocha, foi usado minério fino. Ficou constado que houve assoreamento do dique dois, o que transferiu a água para a barragem, os diques 1 e 2 se fundiram, provocando a mistura de água e material arenoso. Foi feita a construção do recuou da ombreira (local onde a barragem começou a se romper) sem o uso de projeto.
Recursos diminuídos
A carta de risco que prevê o grau de emergência estava desatualizada desde 2013, segundo a PF. Apesar disso, a Samarco, de acordo com o inquérito, aumentou o investimento e orçamento em produção e reduziu o investimento em geotecnia, área que faz o controle da barragem. No período entre 2012 e 2015, a redução foi de 29%. De acordo com a PF, em 2012 o investimento foi de R$ 25.320.000; em 2015, R$ 18.062.000 e em 2016, teve quatro revisões, que chegaram no último valor de R$ 15.737.000.
O delegado Roger Lima também falou sobre a responsabilidade da Vale. Ele sustenta ter sido constatado que, apesar de a empresa negar que jogava rejeto em Fundão em um primeiro momento – e depois ter declarado jogar um percentual de 5% – a mineradora lançou 27% do total de lama depositado em Fundão e em todo complexo de Germano. Segundo o delegado, a Samarco não tinha controle dos depósitos.
Em nota, a Vale informou que “repudia, com veemência, o indiciamento de um funcionário no inquérito conduzido pela Polícia Federal, haja vista que jamais teve qualquer responsabilidade pela gestão da Barragem do Fundão”. Afirmou, ainda, que, na média dos últimos três anos, destinou aproximadamente 5% do volume total de rejeitos depositados pela Samarco na Barragem do Fundão. Antes desse período, segundo a empresa, a barragem não tinha sequer atingido 50% de sua capacidade total. “Além disso, nunca houve variação significativa, em tonelagem, do volume de rejeitos enviado pela Vale à Samarco”, completou.
A Samarco afirmou que teve acesso ao laudo da PF no fim da tarde desta quinta-feira. A empresa diz que repudia qualquer especulação sobre “conhecimento prévio de risco iminente de ruptura na Barragem do Fundão”. “A barragem sempre foi declarada estável. Em nenhuma oportunidade, qualquer inspeção, avaliação, relatório de consultorias especializadas internas ou externas registraram ou fizeram qualquer advertência de que a operação da barragem estivesse sujeita a qualquer risco de ruptura”, completou.
Informou, ainda, que sempre operou com altos padrões de segurança em todos os seus processos e mantém todos os seus monitoramentos em linha com as exigências legais e com as melhores práticas do mercado internacional de mineração. Sobre o processo de alteamento, disse que foi realizado de acordo com o manual de operações elaborado pelo projetista da obra. Já em relação ao recuo iniciado em 2012, afirmou que o procedimento era parte da operação da barragem. “Toda a intervenção foi realizada segundo as premissas e requisitos constantes do manual de operação da barragem, elaborado pelo seu projetista. A operação da barragem, inclusive seu recuo temporário, sempre foi do conhecimento dos órgãos ambientais e de fiscalização, não sendo necessária a apresentação do projeto do recuo por ser mera intervenção decorrente da operação”, completou.
Por fim, informou que a barragem estava licenciada até a cota 940 metros, em relação ao nível do mar, sendo que no dia do rompimento estava em 898 metros. “Ou seja, a barragem nem sequer tinha alcançado ainda a cota de 920 metros prevista no projeto original”, afirmou.
Fonte: O Estado de Minas