O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator do projeto (PL 4850/16) conhecido como “10 medidas contra a corrupção” na comissão especial criada para analisar a proposta, antecipou pontos do seu relatório, como a criação da figura do denunciante do bem e de um fundo nacional de combate à corrupção – com recursos provenientes, entre outras fontes, de bens apreendidos de corruptos. As informações foram dadas durante audiência pública realizada pela comissão especial nesta terça-feira (18).
Ele já tinha adiantado outros pontos do relatório. Hoje, Lorenzoni disse que vai manter a previsão de transformar em hediondos os crimes de corrupção, mas não vai acatar a restrição à concessão de habeas corpus, que, de acordo com o projeto, só poderia ser concedido pelos juízes em caso de prisão ou ameaça de prisão ilegal.
O denunciante do bem, conhecido como “whistleblower” na legislação internacional (uma referência àqueles guardas de rua que apitam para sinalizar crimes), não está vinculado ao delito investigado e pode ganhar proteção e até recompensa pela denúncia.
A proposta já foi apresentada à comissão pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), a partir de sugestão da Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro e Corrupção (ENCCLA).
Lorenzoni afirmou que não vai acatar a criação de uma nova hipótese de prisão preventiva para casos de ameaça de ocultação ou dissipação de bens provenientes de corrupção – como prevê o projeto. Ele deve trocar a medida pela interrupção da prescrição do crime e do regime de progressão da pena enquanto não for feita a reparação dos danos.
Teste de integridade
Outros pontos do projeto, como o teste de integridade para servidores públicos e o uso de provas ilícitas obtidas por boa-fé, continuam sem consenso na comissão.
O relator anunciou que ainda está analisando mudança na medida que prevê os testes de integridade. O teste consiste em simular a oferta de propina para verificar se o servidor público é honesto ou não, o que é considerado inconstitucional por muitos especialistas.
“Simplesmente negar o teste de integridade me parece dispensar uma ferramenta bem-sucedida em Nova York, Hong Kong e outros lugares, fundamental para mudar a cultura sobre o combate e a prevenção de corrupção”, disse.
Lorenzoni sugere o uso dos testes para fins administrativos, mas mediante treinamento prévio dos servidores que irão aplica-los e definição das respostas esperadas, uma maneira de evitar flagrantes preparados.
O relator deve apresentar seu parecer final na primeira semana de novembro, depois de conversar com os integrantes da comissão especial e com as bancadas dos partidos. Ele pretende buscar consenso em relação à maioria das medidas antes da votação.
As propostas foram apresentadas peloMinistério Público ao Congresso, em março, com o apoio de 2 milhões de assinaturas, mas dividem deputados e comunidade jurídica em relação a vários pontos, como restrições à concessão de habeas corpus, o teste de integridade para servidores públicos e a validação de provas ilícitas obtidas de boa-fé.
Sugestões
A inclusão do informante colaborador na proposta foi elogiada pelo juiz Glauco Costa Leite, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que participou da audiência pública desta terça-feira. Ele sugeriu, porém, um mecanismo de prevenir falsas comunicações de crimes.
“A legislação tem que ter cláusulas para desestimular falsas denúncias. No Reino Unido, quando a denúncia é falsa, se levanta o sigilo da fonte”, disse.
O juiz fez elogios, porém, à previsão de penas diferenciadas, de acordo com o volume de dinheiro desviado. O texto propõe, em casos de corrupção que ultrapassem dez salários mínimos, por exemplo, uma pena de 12 a 25 anos de reclusão. Mas ele sugeriu uma faixa mais baixa, para crimes de menor valor, que possam ser reparados por meio de acordo com o Ministério Público.
“Não adianta criar uma série de crimes e atravancar ainda mais a justiça. No pequeno caso, o MP pode ter a possibilidade de propor uma transação penal para reparar o dano”, ressaltou Leite.
Transação penal é outro ponto que não existe no projeto, mas que o relator, deputado Onyx Lorenzoni, admitiu que vai incluir. Trata-se de um instrumento pelo qual os réus podem reduzir suas penas mediante admissão de culpa.
O procurador de Justiça José Oswaldo Molineiro, de São Paulo, defendeu o projeto. “As propostas são controversas, mas temos que ter coragem de enfrentar as questões”, afirmou.
Molineiro elogiou medidas como o confisco alargado, alterações na prescrição de crimes e a transformação de crimes relacionados a corrupção em hediondos, com penas maiores e restrições a progressões de penas. “Se corrupção não é crime hediondo, eu quero saber o que é”, disse.
O procurador de Justiça defendeu ainda o uso dos recursos recuperados em um fundo de combate à corrupção.
Desabafo
Outra participante do debate, a promotora de Justiça Laila Shukair, do estado de São Paulo, se emocionou ao relatar casos em que a corrupção tem impactos diretos na vida das pessoas pobres do país.
“A quem interessa este projeto? No Maranhão, há famílias que se alimentam de pedras cozidas porque os funcionários da prefeitura ficam com os benefícios da Bolsa Família. Eu dou pareceres em processos da Vara da Infância e vejo o quanto as famílias não tem qualquer tipo de assistência do Estado. É necessário mais rigor das penas e prevenção”, declarou Shukair.