Tristeza e Esperança
Por Sarney Filho
Vejo este período, e os últimos dias, em especial, com muita tristeza. O longo alambrado metálico que divide o gramado em frente ao Congresso Nacional e estende-se pela Esplanada dos Ministérios é um símbolo frio do momento maniqueísta por que tem passado nossa sociedade.
Lamento profundamente as posições extremadas, os ódios e as agressões que surgem para desagregar e corromper nossos valores. Os dois lados que aqui, como nas ruas, se afirmam de forma tão antagônica, têm ambos suas razões e seus erros.
Nos dois campos, menos díspares do que se pretendem, há mulheres e homens dignos, que lutam por seus princípios e procuram a melhor saída para a crise – na verdade, as muitas crises que têm sufocado nosso país. Nos dois campos, porém, vejo também a busca do poder pelo poder, a prevalência de interesses pessoais em desfavor do bem comum e da democracia.
Não me coloco como parte dessa divisão. Ao longo de minha carreira política, sempre atuei de maneira crítica – e nossos embates, nas diversas gestões, sobretudo na área socioambiental, foram, muitas vezes, acirrados –, mas sem que com isso visasse a derrocada de um projeto de governo escolhido de forma democrática. Ao contrário, sempre procurei contribuir para a governabilidade, acredito que trabalhar pelo “quanto pior, melhor” é uma prática não republicana.
O Partido Verde tem sido, historicamente, independente, votando de acordo com nossos ideais, e defendendo o que acreditamos ser o melhor para o Brasil. Tantas vezes encontrei-me, nos últimos anos, com importantes interlocutores, dos mais diversos matizes, e juntos procuramos caminhos para viabilizar as reformas necessárias para o país…
No entanto, se, por um lado, não é possível negar as conquistas sociais dos governos Lula e Dilma, é igualmente evidente que o atual governo, com sucessivas decisões equivocadas, não tem conseguido oferecer aos brasileiros estabilidade e segurança para a retomada do desenvolvimento e a garantia daquelas conquistas, que hoje se encontram ameaçadas.
Diante da conjuntura política e econômica tão grave em que nos encontramos, a polarização do embate cerca o pedido de impeachment em apreciação neste Plenário de elementos externos a ele e que não encontram amparo constitucional.
Como todos os meus colegas, tenho sido pressionado pelos dois lados. Nunca temi desagradar a quem quer que fosse ao me posicionar. Nas diretas, votei contra a orientação do meu partido à época, o que teve um custo político elevado. Tínhamos um avanço palpável diante de nós, votei tranquilo com minha consciência.
Demorei a me decidir sobre a questão que agora temos nas mãos. Não poderia fazê-lo de modo açodado e leviano, por entender que um processo de impedimento é uma ruptura da normalidade democrática, excepcionalidade prevista na Constituição Federal, muito grave, a ser usada com a mais extrema prudência, a ser ponderada com serenidade e sem a violência de paixões que, por vezes, nem mesmo abrigam-se na esfera dos princípios e ideais.
Despojar esse pedido de abertura de processo de impeachment de tudo o que não lhe é pertinente, depurá-lo, custou-me tempo de reflexão e recolhimento. Hoje, tenho a convicção de que os argumentos jurídicos apontados fundamentam-se de maneira suficiente para atender aos requisitos constitucionais. Por isso, voto sim à aceitação do pedido.
Voto com a esperança de que, qualquer que seja o resultado do julgamento pelo Senado Federal, possamos superar este triste período de um país cindido ao meio e construir, juntos, um caminho de conciliação e paz, com um desenvolvimento que seja sustentável, com justiça social e com a preservação e o aprimoramento da democracia.
Por uma sociedade sem muros, viva o povo brasileiro!
Fonte : O jornal O Estado do Maranhão