Com a chegada do governo de Jair Messias Bolsonaro [PSL/RJ], diversas pautas sociais e ambientais foram colocadas em xeque, sob o risco de vermos conquistas populares e proteção a certos segmentos da sociedade serem ameaçados. Os indígenas integram este grupo e veem seus direitos serem tolhidos a cada pronunciamento oficial, mesmo a demarcação de terras sendo prevista nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal.
Nas últimas semanas, manchetes de todos os jornais vêm estampando notícias que alertam sobre a redução de terras indígenas. Segundo o Datafolha, 6 em cada 10 pessoas se opõem a corte em demarcações. Mesmo assim, Bolsonaro e seus aliados ministeriais seguem na missão implacável de reduzir cada vez mais o espaço verde, sagrado e legal desta comunidade no território nacional.
A pesquisadora Silvia Beatriz Adoue, alerta que “há, hoje, 436 terras indígenas regularizadas, num total de quase 106 milhões de hectares. Há, também, 130 processos demarcatórios pendentes, entre terras delimitadas, declaradas e homologadas, que correspondem a pouco mais de 12 milhões de hectares. Além do mais, há 115 áreas em estudo. Seis áreas, num total de um pouco mais de um milhão de hectares, estão interditadas para proteção de indígenas isolados. As terras regularizadas correspondem a 12% do território nacional e a maior área indígena concentra-se na Amazônia Legal.”
Com o avanço e o apoio da bancada do boi, ou banda dos ruralistas, a defesa por retirar indígenas e suas terras ganha força e confirma que a política fundiária do Estado brasileiro vem priorizando o impulsionamento do agronegócio exportador de maneira contínua. Isso se dá ao fato de que, após a posse de Bolsonaro, duas Medias Provisórias foram assinadas: o Ministério da Agricultura passou a ficar a cargo das demarcações de terras indígenas e a Secretaria de Assuntos Fundiários assumiu o licenciamento de obras que afetam tais locais. Assim, a proteção da terra perde espaço para o capital especulativo, onde o dinheiro possui mais valia do que as tradições populares e seculares do povo que descobriu esta terra chamada Brasil.
Em matéria publicada pelo jornal El País, a etnia Guató foi o último povo a ter terra demarcada e pode ser o primeiro a perdê-la sob o atual governo. A terra indígena Baía dos Guató foi homologada por Temer em 2018, mas a decisão acabou anulada no Judiciário, seguindo regras defendidas pelo novo presidente brasileiro. Em declaração, Jair Bolsonaro alega que já há demarcações em excesso: “Temos uma área maior que a região Sudeste demarcada como terra indígena. E qual a segurança para o campo? Um fazendeiro não pode acordar hoje e, de repente, tomar conhecimento que vai perder sua fazenda para uma nova terra indígena”.
A incerteza no futuro que cerne as terras indígenas reflete o momento de crescente preocupação com as identidades que se perderão no decorrer dos anos e a possível alta no índice de violência contra os índios. No Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil que analisa 19 itens e é apresentado anualmente pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), mostra que em 2017 houve um significativo aumento em ao menos 7 dos 9 tipos de “violência contra a pessoa”. Entre assassinato, homicídio culposo, ameaças (de morte e variadas), lesões corporais, violência sexual e racismo e discriminação étnico-cultural, somam-se 124 casos registrados.
Após as reviravoltas de um começo de gestão governamental com decisões alarmantes, os líderes indígenas de aldeias do Amazonas também se posicionaram. Em carta aberta enviada para Bolsonaro no dia 2 de janeiro, reiteraram a posição de autonomia de suas culturas e de todo um povo: “Já fomos dizimados, tutelados e vítimas de política integracionista de governos e Estado Nacional Brasileiro, por isso vimos em público afirmar que não aceitamos mais política de integração, política de tutela e não queremos ser dizimados por meios de novas ações de governo e do Estado Nacional Brasileiro”. Em outro trecho, afirmam que “quem não é indígena não pode sugerir ou ditar regras de como devemos nos comportar ou agir em nosso território e em nosso país. Temos capacidade e autonomia para falar por nós mesmos.” E por fim, solicitam: “Senhor Presidente, cumpra com suas falas e discursos de campanha de fazer valer a democracia, pois somos brasileiros que merecemos respeito sobre nossos direitos.”
Fontes: Folha / Nexo Jornal / Elpais / Brasil247 / G1 /Cimi / Em Tempo