Peixe do dia de são nunca
Amanhã completa um mês que o governo federal publicou uma medida que restringirá a pesca de 475 espécies de peixes e invertebrados aquáticos (como caranguejos) ameaçadas. A portaria 445, elaborada com mais de 1.300 especialistas, proíbe a captura de 334 delas e impõe uma série de critérios para uso sustentável das demais espécies a partir do dia 15 de junho.
Apesar dos fins ambientais, a inclusão na lista de peixes populares no comércio, como mero e pargo, inflamou a indústria pesqueira. Manifestações se espalharam pela costa, visto Santa Catarina, onde pescadores fecharam dois portos por mais de 30 horas pela revogação da portaria.
As reações levaram à criação, no último dia 8, de um grupo de trabalho dos ministérios da Pesca e do Meio Ambiente para ouvir o setor e reavaliar o rol de animais, apelidado por críticos de “lista da mentira”. Pescadores defendem seleção baseada em estudos in loco, e não em metodologia internacional. Para acadêmicos e especialistas, a revogação seria um retrocesso.
Mas a ausência de espécies de maior interesse comercial na lista, como sardinha e anchova, sugere que a insatisfação do setor pesqueiro é bem mais profunda. A pesca no Brasil vive eterna penúria. Faltam gestão, fiscalização, incentivo governamental, tecnologia, métodos sustentáveis de captura, pesquisa.
Esses fatores resultam num produto de qualidade inferior no prato do brasileiro. Já no início da cadeia, o principal método de pesca industrial no Brasil, o arrasto, maltrata animais e destrói o Ecossistema. Barcos carecem de estrutura e, em terra firme, o produto enfrenta lenta distribuição. (Já ouviu a expressão “peixe do dia”? Em São Paulo, é, de fato, só uma expressão.)
O consumo crescente no país contrasta com o conhecimento dos comerciantes. Um levantamento das universidades federais do Rio e de São Paulo no ano passado em 99 estabelecimentos das duas cidades, entre feiras, supermercados, peixarias e restaurantes, apontou que os vendedores desconheciam épocas de veto da pesca e tamanhos mínimos de pescados permitidos por lei para a venda.
Na outra ponta, consumidores compram “peixe por lebre” à exaustão. A mesma pesquisa concluiu que 66% dos locais visitados na capital paulista, por exemplo, vendiam peixes com rotulagem trocada. As motivações geralmente estão apoiadas em comércio ilegal, disponibilidade e lucro. Ou seja, vender tilápia como se fosse badejo eleva o preço do produto em mais de 70%. Ninguém contesta.
Diante de tanto descontrole no setor pesqueiro –e de um consumo acrítico–, será que o prato do brasileiro terá peixes selvagens da nossa costa nas próximas décadas?
Quais peixes não poderão ser fisgados nos rios – Depois da lista dos peixes de água salgada na semana passada, a coluna traz nesta sexta-feira as espécies de rios que terão a pesca proibida por dois anos, segundo portaria do IBAMA. A relação tem desde peixinhos, como lambaris e piabinhas — que funcionam como ótimas iscas naturais —, a peixões, considerados troféus da pesca esportiva, como surubim, matrinxã e pacu. A nova regra gerou protestos. Uma comissão foi instalada com prazo de 30 dias para emitir uma análise. Enquanto isso, o melhor é acatá-la. Confira abaixo alguns dos peixes de água doce na nova lista do IBAMA:
Acari — Acari-cachimbo — Acari-da-pedra — Andirá — Aracu — Aracu-boca-pra-cima — Bagre — Bagre-branco — Bagrinho — Bagrinho-cego – Bagrinho-listrado — Bagrinho-do-tietê — Bagrinho-de-caverna — Cascudo — Cascudinho — Cascudinho-do-tietê — Cambeva — Cambeva-do-tietê – Candiru — Curimatã — Lambari — Lambari-azul-listrado — Lambari-da-restinga — Lambari-listrado — Mangangá — Matrinxã — Pacu-capivara – Pacu-dente-seco — Pacu-prata — Piaba — Piaba-branca — Piabinha — Piabanha — Piracanjuba — Pirapitinga — Surubim — Surubim-do-Jequitinho – Surubim-do-iguaçu — Surubim-do-paraíba — Timburé
Fonte: Folha de São Paulo /ODia on line