O enviado especial dos Estados Unidos para Mudança Climática, Jonathan Pershing, afirmou nesta segunda-feira (14) em Marrakesh que o Acordo de Paris será cumprido independentemente de uma mudança de postura dos EUA na gestão do recém-eleito presidente Donald Trump.
“O acordo entrou em vigor graças a um esforço global. Administrações podem e irão mudar, mas estou certo de que iremos manter a vontade e ação para mitigar mudanças climáticas”, disse Pershing a jornalistas na COP22. “Com o acordo em vigor, não é mais uma questão de se vamos acelerar sua implementação, mas uma questão de quando e como.” Ele citou declarações da China, da União Europeia e do Brasil de que manterão seus compromissos em Paris. “Eu não acho que uma mudança dos EUA afetará a trajetória de desenvolvimento de outros países.”
O negociador americano, porém, mostrou-se pouco animado com as perspectivas para a participação americana no acordo do clima – pelo menos do ponto de vista do governo federal. “Eu acredito que a comunidade econômica americana, a comunidade empresarial, os governos estaduais e locais e a sociedade civil vão se mover nessa direção e eu acho que será um imperativo para todos nós.”
A vitória do republicano, que chamou o aquecimento global de “fraude” e prometeu durante a campanha que “cancelaria” a participação americana no Acordo de Paris, tem causado apreensão nos negociadores de 195 países mais a União Europeia reunidos em Marrakesh.
Trump prometeu que retomaria incentivos à indústria do carvão nos EUA, medida que vai de encontro às recentes diminuições de emissões de carbono do país – uma queda de 2,6% em 2015, com projeção de mais 1,7% de redução em 2016, de acordo com dados do Global Carbon Budget Project.
A redução das emissões dos EUA, juntamente com a da China, contribuiu para que emissões globais por combustíveis fósseis chegassem ao terceiro ano seguido praticamente estagnadas. Em reportagem da agência de notícias Reuters publicada ontem (13), uma fonte da equipe de transição do novo presidente confirmou a má notícia: o republicano pretende retirar o país do acordo do clima assim que possível quando assumir o mandato, e da forma mais rápida possível.
Em Marrakesh, especula-se sobre as maneiras como Trump poderia fazer isso, já que retirar o país do Acordo de Paris levaria quatro anos. Outra especulação é que Trump poderia simplesmente sair da Convenção do Clima, assinada em 1992 pelo também republicano George Bush. Isso, porém, pode ter consequências: Nicolas Sarkozy, candidato à Presidência da França, ameaçou retaliar produtos americanos com barreiras tarifárias caso Trump cumpra o que vem prometendo.
Apesar de não dar detalhes, Pershing denotou a seriedade do eventual diálogo com a futura equipe de transição de Trump ao afirmar, por exemplo, que “há flexibilidades” sobre o processo do Acordo de Paris que poderiam permitir que os Estados Unidos não tivessem que aguardar os quatro anos previstos (três de espera e um entre aviso e ação) para a saída.
“Não irei especular sobre como uma nova equipe iria agir, mas, como em todo acordo, existem o procedimento para a saída. Há flexibilidade para nosso país e uma nova administração poderia tira vantagem dessa flexibilidade em suas ações. Mas é cedo demais para especular, teremos que esperar pra ver”, concluiu.
APELO DE MARRAKESH
A COP22, que terá seu segmento de alto nível aberto nesta terça-feira (15) com presença de dezenas de chefes de Estado (em sua maioria africanos) e ministros, prepara também uma resposta política a Donald Trump.
Um documento batizado “Apelo de Marrakesh por Ação Climática e Desenvolvimento Sustentável” está sendo negociado na COP22. Trata-se de uma exortação aos países pela implementação célere do Acordo de Paris, pela ampliação das estratégias de baixo carbono e pela manutenção do impulso político internacional verificado desde a adoção do acordo do clima. Uma versão inicial, produzida pela presidência marroquina e vazada ao longo do fim de semana na imprensa da Índia, causou celeuma entre os países.
“Alguns países achavam que ele estava longo demais, outros, que ele não tinha substância, e outros, que ele não tinha diferenciação [entre pobres e ricos] no texto”, afirmou um observador ao OC.
O Apelo, que foi aventado pela primeira vez nas reuniões preparatórias para a COP22 em Marrakesh, não estava previsto inicialmente como um resultado formal da conferência, que é de caráter técnico. Mas a eleição de Trump deu novo sentido à sua adoção.
Fonte : OC