O governo de Dilma Rousseff foi criticado por ter sido o que menos demarcou terras indígenas desde a redemocratização do país, além de ter promovido grandes obras de infraestrutura, como a usina de Belo Monte, sem levar em conta as comunidades locais, incluindo as indígenas.
A petista foi afastada temporariamente em 12 de maio e destituída definitivamente no dia 31 de agosto por um processo de impeachment. A chegada do vice-presidente Michel Temer à Presidência da República, porém, não reduziu as preocupações de povos indígenas. Mais do que isso: ampliou os sinais de alerta.
Neste mês de setembro, 200 lideranças de comunidades guaranis do Sul e do Sudeste do Brasil se reuniram por quatro dias no município de São Paulo, na terra indígena Tenonde Porã. A assembleia geral das lideranças resultou em um manifesto, divulgado no dia 16. O documento resume alguns dos principais pontos levantados por povos indígenas desde que o governo Temer assumiu, no final de agosto.
Os guaranis compreendem um conjunto de povos distribuídos por Brasil, Argentina, Paraguai, Bolívia e Brasil. Eles estão entre os indígenas com a maior amplitude territorial da América do Sul. No Brasil, estão presentes em Pará, Tocantins, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
51 mil
Era a população guarani no Brasil em 2008, segundo dados da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e da Funai (Fundação Nacional do Índio)
Na carta divulgada pelos guaranis após a realização do congresso há três preocupações centrais. Aqui estão elas:
1) O novo ministro da Justiça – Os guaranis mostram preocupação com a nomeação de Alexandre de Moraes como ministro da Justiça. Sem citar seu nome, afirmam que temem que este permita a repressão policial contra povos indígenas. O ministro é ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo e já sofreu críticas em razão da atuação da Polícia Militar do Estado.
Em maio, logo após assumir, Moraes não descartou, em entrevista ao jornal “Folha de São Paulo”, rever as poucas demarcações de terras indígenas que haviam sido homologadas por Dilma Rousseff “no apagar das luzes”, ou seja, pouco antes de seu afastamento.
Moraes reconhece que povos indígenas têm sofrido ameaças. Entre medidas positivas de sua gestão, o ministro destaca que vem trabalhando com a Força Nacional de Segurança para evitar conflitos fundiários envolvendo indígenas no Mato Grosso do Sul e no Paraná.
2) Queda no Orçamento da Funai – Os guarani também mostraram preocupação com a queda do orçamento da Fundação Nacional do Índio nos últimos anos, que, afirmam, impossibilita os trabalhos de demarcação de suas terras e a efetivação da garantia de seus direitos. No processo de demarcação, a entidade é responsável por elaborar e aprovar relatórios nos quais constam os limites da terra a ser demarcada.
Segundo reportagem de janeiro de 2016 publicada no portal UOL, o orçamento da Funai em 2016 caiu 23% em relação ao ano anterior, e chegou a R$ 533,7 milhões. É o menor valor desde 2012.
Por esse motivo, os guaraniS também criticam a proposta de emenda constitucional 241. Apresentada em junho de 2016 por Temer, ela cria um teto de gastos para a União que está condicinado à inflação do ano anterior. O temor é de que a verba da Funai não seja ampliada ou venha até ser reduzida com o teto.
O governo Temer sustenta que a medida é necessária para recuperar a economia e reverter os déficits orçamentários que vem sendo registrados no país.
3) A CPI da Funai/Incra – Os guaranis criticam também a recriação da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga Funai e Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). “Por meio da CPI nossas lideranças e apoiadores do movimento indígena são investigados como se fossem criminosos, enquanto nenhuma justiça é feita sobre o sangue derramado de nossos parentes pelos fazendeiros e pelo Estado”, diz o documento.
Criada em 2015, a primeira CPI investigava atos da Funai e do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) nas gestões do PT e foi encerrada em agosto sem um relatório final. Agora, a comissão foi recriada com o apoio da bancada ruralista.
Os defensores da investigação parlamentar afirmam que a CPI é necessária para identificar eventuais fraudes em repasses federais a ONGs e outras entidades que trabalham com a questão indígena.
Nexo Jornal