Novo relatório do Fórum Econômico Mundial mostra mudanças na percepção de risco. Se em anos anteriores problemas econômicos eram considerados maiores ameaças, agora temores de colapso climático dominam.
Em seu 15º Relatório Global de Riscos publicado nesta quarta-feira (15/01), o Fórum Econômico Mundial (FEM) afirma que, pela primeira vez desde que se começou a publicar o documento, todos os “principais riscos de longo prazo, em relação à probabilidade” são ambientais.
Enquanto na década anterior as crises econômicas e financeiras tenham sido consideradas as mais perigosas, constatou-se que as percepções de risco se desviaram para condições climáticas extremas, desastres ambientais, perda de biodiversidade, catástrofes naturais e falha na mitigação das mudanças do clima.
“As mudanças climáticas são uma ameaça muito real e séria para a sociedade”, afirma Alison Martin, membro do grupo de serviços financeiros Zurich Insurance Group, que ajudou a compilar a publicação, em colaboração com a empresa de consultoria Marsh & McLennan e várias universidades de renome de todo o mundo.
“Eventos climáticos extremos, como ondas de calor e inundações, estão se tornando mais comuns e graves, fazendo com que as comunidades enfrentem custos humanitários e econômicos muitas vezes devastadores.”
Sistemas multilaterais em desintegração
O Fórum Econômico Mundial é uma organização internacional centrada na cooperação entre os setores público e privado. Ela reúne líderes empresariais, estrategistas de políticas governamentais e representantes da sociedade civil para promover discussões globais sobre questões prementes.
Publicado na véspera da reunião do 50º aniversário da reunião do Fórum Econômico Mundial em Davos, no fim de janeiro, o relatório analisou as opiniões de mais de 750 especialistas e tomadores de decisão globais, para classificar suas maiores preocupações em termos de probabilidade e impacto.
Em relação aos riscos de curto prazo que a humanidade já enfrenta em 2020, três em cada quatro entrevistados mencionaram como os mais prementes: confrontos econômicos, polarização política, ondas de calor extremas, destruição de ecossistemas de recursos naturais e ataques cibernéticos.
O FEM descreve o mundo em que vivemos como cheio de “incerteza geopolítica e geoeconômica”. Poderosas forças econômicas, demográficas e tecnológicas estão moldando um novo equilíbrio de poder, no qual os países veem cada vez mais as oportunidades e desafios por meio de “lentes unilaterais”.
Como resultado, estruturas de aliança e sistemas multilaterais ameaçam entrar em colapso, sob a pressão de “posturas nacionalistas em busca de agendas individuais e dissociação econômica”.
O presidente do Fórum Econômico Mundial, Borge Brende, observou no relatório que a renovação da arquitetura dos sistemas políticos e econômicos multilaterais seria “a tarefa definidora desta geração”.
“Será um esforço monumental, mas indispensável. O Relatório Global de Riscos demonstra a dimensão dos altos riscos”, escreveu Brende, acrescentando que as esperanças de que o sistema global simplesmente “se recupere” arriscariam fazer perder “oportunidades cruciais” de enfrentar problemas urgentes.
Estabilidade econômica e coesão social
Em meio a um consenso global sobre política e economia desgastado, o relatório do FEM diz temer que 2020 seja marcado por confrontos econômicos intensificados e polarização política doméstica.
Além disso, o retrocesso do crescimento econômico e o aumento da desigualdade financeira elevam o risco de estagnação econômica, ao mesmo tempo em que diminui o espaço de ação dos governos para estimular as economias com política monetária e fiscal.
Em meio a essa perspectiva econômica sombria, o descontentamento do povo com seus líderes políticos deve aumentar, levando a mais protestos públicos, potencialmente enfraquecendo a capacidade dos governos de tomar medidas decisivas em caso de recessão. Sem estabilidade econômica e social, contudo, os países poderão não ter os “recursos financeiros, o capital político ou o apoio social necessários a enfrentar os principais riscos globais”.
Como os últimos cinco anos já foram os mais quentes já registrados, prevê-se um aumento das mudanças climáticas nos próximos anos, tornando os desastres relacionados ao clima mais intensos e mais frequentes.
“Os impactos de curto prazo das mudanças climáticas acarretam uma emergência planetária que incluirá perda de vidas, tensões sociais e geopolíticas, assim como impactos econômicos negativos”, diz o relatório, acrescentando que o fracasso na mitigação e adaptação às mudanças climáticas é o risco número um em termos de impacto, e número dois quanto à probabilidade nos próximos dez anos.
A perda de biodiversidade – classificada como segundo risco mais impactante e terceiro mais provável para a próxima década – tem implicações críticas para a humanidade, devido ao provável colapso dos sistemas de alimentação e saúde, e as interrupções de toda a cadeia de suprimentos.
Fragmentação digital e assistência médica
Embora a tecnologia digital traga enormes benefícios econômicos e sociais a grande parte da população global, os entrevistados da pesquisa do FEM dizem acreditar que o acesso desigual à internet, a falta de uma estrutura global de governança de tecnologia e a cibersegurança representam riscos significativos. Isso “impedirá que todo o potencial das tecnologias de próxima geração seja realizado”, explica o relatório.
No campo da saúde pública, as ameaças aos sistemas existentes são vistas principalmente como advindas de “mudanças nos padrões sociais, ambientais, demográficos e tecnológicos”, que podem desfazer os ganhos dramáticos em bem-estar e prosperidade.
Aqui o relatório identifica, como ameaças aos sistemas de saúde pública em todo o mundo, o aumento, por exemplo, de doenças cardiovasculares e mentais, assim como os custos crescentes das doenças crônicas. “À medida que os riscos à saúde existentes ressurgem e novos vêm à tona, os êxitos passados da humanidade em superar os desafios à saúde não são garantia de resultados futuros”, adverte o FEM.
O Fórum Econômico Mundial conclui sua avaliação de riscos para 2020 dizendo que “à medida que a janela de oportunidades está se fechando, são necessárias ações coordenadas rápidas e com múltiplas partes interessadas, a fim de mitigar os piores resultados.”
Fonte: DW