As evidências continuam a apontar que a mudança do clima empurrou o Ártico a um novo estado. As altíssimas temperaturas estão alterando a essência da região, derretendo o gelo na terra e no mar, provocando incêndios mais intensos, alterando a circulação oceânica e dissolvendo o pergelissolo.
Um novo relatório descreve todas essas mudanças e adverte que, mesmo que o mundo consiga manter o aquecimento global abaixo do limite de 2° C, algumas das mudanças podem ser permanentes. Entre as mais angustiantes estão o desaparecimento do gelo marinho na década de 2030 e mais derretimento de gelo terrestre do que se pensava, levando os mares a alturas mais extremas.
As descobertas, divulgadas mês passado no relatório SWIPA – que analisa neve, água, gelo e pergelissolo no Ártico – vêm após um inverno de extremo descontentamento para a região. O gelo marinho recuou um pouco em novembro, uma ocorrência rara, e bateu o recorde pelo terceiro ano consecutivo. Temperaturas médias 11 ° F acima do normal, impulsionadas pelo clima suave sustentado que foi abalado por períodos de calor quase nunca vistos, quando as temperaturas atingiram até 50 ° F acima do normal.
O último inverno é apenas o mais recente de uma série de invernos bizarros e o relatório, criado por 90 especialistas no Ártico, é o mais recente de uma longa linha de avisos cada vez mais terríveis para a região de aquecimento mais rápido do planeta. Se a poluição de carbono não for freada, partes do Ártico poderão aquecer a uma enorme taxa de 16 ° F até 2050.
“Com o passar dos anos e a obtenção de novos dados, torna-se cada vez mais claro que o Ártico, como conhecemos, está sendo substituído por um ambiente mais quente, mais úmido e mais variável”, relataram os cientistas. “Esta transformação tem profundas implicações para as pessoas, recursos e ecossistemas em todo o mundo.”
O gelo do mar está desaparecendo e poderá não existir mais por volta de 2030. O declínio do gelo marinho está bem documentado, desaparecendo em todas as estações, com um encolhimento mais rápido nos meses de verão. O gelo mais velho, que formou o rochas de gelo marinho por décadas, está declinando também de forma rápida, deixando gelo novo e suscetível a derretimento em seu lugar.
A nova análise mostra que o número médio de dias com cobertura de gelo marinho caiu de 10 a 20 dias por década desde 1979. Algumas áreas, como o Barents e o Karas, viram declínios ainda mais acentuados. O desaparecimento do gelo marinho faz com que o oceano mais escuro deixado em seu rastro absorva mais energia do sol, acelerando o aquecimento na região.
É por isso que a nova análise sugere que o Ártico poderá não ter mais gelo no verão de 2030. Um ártico sem gelo abriria rotas marítimas, aumentando a poluição em uma região frágil. Também abriria o acesso ao petróleo e ao gás marinho, o que poderia estimular a concorrência por esses recursos.
O pergelissolo está se tornando cada vez menor e de forma permanente. O solo ártico detém até 50% do carbono encontrado em solo de todo o mundo. O aumento das temperaturas está derretendo o pergelissolo, fazendo com que ele libere parte desse carbono na atmosfera.
Embora a liberação de carbono até agora tenha sido relativamente pequena, o aumento das temperaturas tem o potencial de remodelar rapidamente a paisagem e acelerar o derretimento.
“Podemos começar a ver a degradação generalizada no pergelissolo em uma escala de tempo de 20 ou 30 anos”, disse Vladimir Romanovsky, especialista em pergelissolo da Universidade do Alasca.
O derretimento do pergelissolo também representa um problema enorme para as comunidades no Ártico, que são construídas sobre o que antes era terreno sólido. O terreno da Sibéria, do Alasca e de parte do Canadá está afundando e mais descongelamento só vai piorar esses impactos.
O gelo terrestre está desaparecendo, aumentando mares e alterando a circulação oceânica. O maior impacto para o globo é o derretimento da camada de gelo maciça da Groenlândia. Essa camada é a maior responsável pela regulação do nível do mar, e tem derretido a uma taxa de aceleração desde 2011.
O relatório SWIPA usa novos dados e achados para atualizar as estimativas do aumento do nível do mar do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas feitas há apenas quatro anos.
“Quero enfatizar que esses números são provavelmente subestimados”, disse Jason Box, pesquisador da camada de gelo da Groenlândia e um dos autores do relatório. “Eles ainda não foram ralacionados aos que estamos encontrando nos relatórios SWIPA. Esses são números que ainda não tínhamos em mente e estão sendo somados aos anteriores.”
Se as emissões de carbono continuarem em suas tendências atuais, o relatório indica que 73,66 cm seria a estimativa de baixa elevação do nível do mar até 2100, cerca de 22,86 cm mais alta do que a estimativa mínima do IPCC. E isso seria apenas o nível mais baixo, podendo ser maior devido ao derretimento da Groenlândia e da Antártida.
O grande escoamento de água doce para o Oceano Ártico também está remodelando a circulação oceânica e a ecologia da região. Os pesquisadores têm visto uma marcada desaceleração na circulação do Atlântico Norte como água fria para a ponta sul da Groenlândia, que atuou como um obstáculo às correntes que dirigem a água através da região. Isso tem o potencial de mexer com a circulação oceânica, bem como padrões climáticos, especialmente na Europa.
As mudanças no Ártico são um prenúncio do que está reservado para o planeta se continuarmos a emitir poluição de carbono. Algumas dessas mudanças são provavelmente irreversíveis. Mas o relatório observa que se o mundo aderir ao seu objetivo no Acordo de Paris, a região poderia alcançar um equilíbrio que, embora diferente de seu estado atual, seria menos radical do que o destino que ela enfrenta se continuarmos trilhando o atual caminho do carbono.
Fonte: Climatologia Geografica