Etnia, que ocupa regiões sudoeste e oeste do território Alto Turiaçu, foi surpreendida com retirada de madeira no território dela, gerando clima de tensão; dois indígenas foram baleados
Há duas semanas índios da etnia Ka”Apor estão em clima de tensão. Segundo a Rede Sustentabilidade e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a situação gerada pela retirada de madeira da área indígena é preocupante. Madeireiros nas regiões sudoeste e oeste do território Alto Turiaçu causaram pânico e revolta entre os indígenas.
O conflito armado instaurou o medo, em razão da disputa de terras. Naquela ocasião, dois índios foram baleados e outros quatro haviam desaparecido. Até o dia 24, segundo o último contato do Cimi com a aldeia, os baleados estariam se recuperando e três haviam sido encontrados. Um continuava desaparecido.
O cenário começou a ser montado desde sábado, 18 deste mês, quando 26 indígenas Ka”Apor passaram a manter o controle do incêndio nesse território, devido à conclusão do trabalho do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), após 10 dias na região.
Na manhã do domingo (19), o grupo se deparou com madeireiros que extraíam madeira ilegalmente em um dos ramais que havia sido fechado pelos indígenas para evitar extração da madeira. Além disso, os Ka”Apor descobriram que os madeireiros haviam construído uma ponte sobre o Rio Turi para facilitar o acesso à extração ilegal.
Os índios que faziam o controle da queimada apreenderam sete pessoas para entregar ao Ibama e atearam fogo em um caminhão e duas motocicletas usadas no processo de retirada de madeira.
Um dos detidos, no entanto, escapou e avisou os outros madeireiros que estavam no povoado Nova Conquista, no município de Zé Doca. A partir de então, instalou-se um clima de atrocidades e de terror, conforme a Rede.
Mais de 20 madeireiros armados invadiram o território dos Ka”Apor. E, de acordo com relato dos índios, os invasores mandaram todos ficarem na mira das armas. Com isso, atiraram pelas costas e depois correram para o mato. A ação resultou nos baleados e nos desaparecidos.
Para piorar ainda mais a situação, os invasores fecharam, ainda no domingo, a entrada da aldeia e, na segunda-feira (21) invadiram novamente o local e agrediram os homens da aldeia como também expulsaram as mulheres e as crianças. Os indígenas denunciam que dentro do território se encontram dois caminhões e dois tratores dos madeireiros.
Indignação
Para o Cimi, a situação dos Ka”Apor é grave, pois embora tenham o território demarcado e homologado, estão sendo ameaçados por madeireiro que extraem a madeira de forma ilegal.
No entendimento da Rede, a condição instalada no território indígena causa ainda mais revolta porque policiais estiveram na região acompanhados do prefeito do município de Zé Doca, Alberto Carvalho Gomes (PTB), mas nenhuma atitude foi tomada para acalmar a situação. As autoridades, conforme a Rede, ouviram apenas os não indígenas presentes na aldeia e retornaram para a cidade. No dia seguinte, a perseguição aos indígenas e os aliados da causa aumentou na cidade.
“A aldeia está sob o ataque de perigosos bandidos. Os apoiadores dos indígenas na região foram ameaçados de morte e correm o risco de se tornarem vítimas dos foras da lei, como ocorreu com a liderança indígena Eusébio Ka”Apor, assassinado por madeireiros em abril deste ano. Até o momento, esse CRIME não foi solucionado e segue impune”, diz trecho do documento elaborado pela Rede Sustentabilidade.
Lentidão
Para o movimento, o fato que também causa muita preocupação é a lentidão do Governo do Estado e dos órgãos que deveriam atuar na proteção e apoio dos indígenas em relação ao clima de conflito instalado há algum tempo na região e tem se intensificado desde que os Ka”Apor iniciaram a retomada de seu território.
“Com a retomada, aumentou a perseguição contra os indígenas e apoiadores. Caso as autoridades competentes tivessem agido com mais rigor, certamente o embate não teria atingido essas proporções”, diz a Rede.
Etnia Ka”Apor enfrentaram muitas lutas
Os índios Ka”Apor surgiram como povo distinto há cerca de 300 anos. Talvez por causa de conflitos com colonizadores luso-brasileiros e com outros povos nativos, iniciaram uma longa e lenta migração que os levou, nos idos de 1870, do Pará, através do Rio Gurupi, ao Maranhão. Quando as autoridades brasileiras tentaram pacificá-los pela primeira vez, em 1911, por intermédio do recém criado Serviço de Proteção aos Índios (SPI), os Ka apor eram considerados um dos povos nativos mais hostis.
Equipamento foram levados, dizem índios
Os Ka”Apor denunciam que os madeireiros se apropriaram dos equipamentos de trabalho de mapeamento dos focos de incêndio e estão identificando as pessoas e fazendo sérias ameaças. E foi somente após recorrer ao MINISTÉRIO PÚBLICO que os indígenas receberam a informação de que a Polícia Federal se deslocaria para a região.
Os Ka Apor, nos últimos anos, rejeitaram a Fundação Nacional do Índio (Funai) e começaram a se reorganizar política e belicamente para proteger suas terras invadidas por madeireiros e caçadores.
Quando os índios encontram caminhões estacionados pela floresta, os indígenas ateiam fogo. O mesmo acontece quando pedaços de madeira desflorestada são deixados para trás.
Sobre isso, os índios dizem que cansaram de tentar dialogar com os invasores; por isso, a guerra foi instaurada. Não dá pra gente só conversar mais. Nós não mexemos no quintal deles. Nunca fomos roubar galinha lá , afirmam.
Fonte: O Estado do Maranhão