Presidente da Câmara mandou desligar luzes, ar condicionado e microfones de plenário ocupado. Durante horas, manifestantes ficaram cercados com os policiais à porta, equipados com capacetes e escudos, impedindo o acesso aos corredores
Indígenas, quilombolas e representantes de outras comunidades tradicionais ocuparam pacificamente, em vigília, durante toda a noite de hoje, um dos plenários do corredor de comissões da Câmara, em Brasília. O presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) chegou a ordenar a retirada à força dos manifestantes pela Polícia Legislativa, mas desistiu da ação, segundo o deputado Paulo Pimenta (PT-RS). Inicialmente, Cunha recusou a proposta do grupo de permanecer na sala durante a noite e mandou desligar luzes, ar condicionado e microfones. Durante horas, os participantes do protesto ficaram na sala cercados, com os policiais legislativos à porta, equipados com capacetes e escudos, impedindo o acesso aos corredores.
Na manhã de ontem (6/10), os manifestantes desocuparam o plenário e realizaram um ato no estacionamento do prédio. O protesto foi contra os assassinatos e ataques de lideranças indígenas e de comunidades tradicionais promovidos por milícias de fazendeiros, em especial no Mato Grosso do Sul. Eles também reivindicaram a regularização de Terras Indígenas, quilombos e unidades de conservação e a rejeição da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que transfere do governo federal para o Congresso a atribuição de oficializar essas áreas protegidas. A PEC pode ser votada nesta semana na Comissão Especial que a analisa e é dominada por ruralistas. “Nós vamos permanecer e vamos fazer uma vigília pelos assassinatos, pelos estupros, pelas terras não demarcadas, pelas políticas públicas não colocadas em nossos territórios, nós queremos uma resposta dessa casa!”, discursou Agnaldo Pataxó, no final da tarde, no encerramento de uma audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM). “O Congresso Nacional está movido por uma força que não permite a nossos aliados trabalhar”, concluiu.
A audiência tinha justamente o objetivo de discutir os assassinatos no campo, a ação de pistoleiros e milícias armadas de fazendeiros. Ao longo da tarde, representantes das comunidades denunciaram casos de violação dos direitos humanos e criticaram a ausência do Estado na defesa dessas populações.
Participaram da audiência indígenas Pataxós, Pataxós Hã-Hã-Hãe, Tupinambás, Krahô, Terena, Guarani Kaiowá e Xakriabá. Também falaram representantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (Renap), além da subprocuradora geral da Rpública Débora Duprat.
“A PEC 215 é para violar os direitos dos quilombolas e indígenas. Dá o direito e assegura, veementemente, dizendo assim: ‘as milícias podem matar que nada vai acontecer’. Essa PEC é um etnocídio aos povos e comunidades”, disse Antônio Nonato, do Movimento Quilombola do Maranhã (Moquibom).
“Há um conjunto de instrumentos sendo usados aqui na casa legislativa na tentativa de impedir o reconhecimento dos direitos dos povos a suas terras e de facilitar a invasão, a mercantilização, a exploração das terras indígenas que estão na posse ou sendo preservadas pelos povos”, afirmou o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Cléber Buzatto.
Débora Duprat e vários parlamentares acompanharam as negociações ao longo da noite. Presidente da CDHM, Pimenta conduziu as conversas com Cunha, intercedendo em favor dos manifestantes. O senador Lindberhg Farias (PT-RJ) e os deputados Chico Alencar (PSOL-RJ), Sibá Machado (PT-AC), Bohn Gass (PT-RS), Alessandro Molon (Rede-RJ), Moema Gramacho (PT-BA) e Odorico Monteiro (PT-CE) também ajudaram nas tratativas.
Fonte: ISA (Instituto Sócio Ambiental) /Oswaldo Braga de Souza e Victor Pires