Além das conhecidas “pedaladas fiscais”, condenadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o pedido de impeachment aceito pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, também tem como base a edição de decretos com aumento de despesas sem passar no Congresso. A prática também foi condenada pelo TCU nas contas da presidente em 2014.
De acordo com o pedido de impeachment, produzido por Hélio Bicudo e Miguel Reale, a presidente editou, nos anos de 2014 e 2015, uma série de decretos sem número que resultaram na abertura de créditos suplementares, de valores muito elevados, sem autorização do Congresso Nacional.
O documento aponta que, em 2014, os valores de créditos suplementares objeto de decretos não numerados da denunciada foram da ordem de R$ 18.448.483.379,00. “Esses decretos foram publicados após a constatação, pelo Tesouro Nacional, de que as metas estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária Anual não haviam sido cumpridas, como revelado pelo Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 5º Bimestre de 2014 do Tesouro Nacional”, explica. Os autores do pedido afiram que o mesmo aconteceu em 2015.
Dilma editou seis decretos autorizando créditos suplementares ao Orçamento da União, mesmo antes de o Congresso Nacional ter aprovado a redução da meta de superávit primário para 2015 pela primeira vez, definida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Com os decretos, a presidente ampliou os gastos federais em R$ 2,5 bilhões (R$ 95,9 bilhões menos R$ 93,4 bilhões), que serão bancados pelo superávit financeiro apurado no balanço patrimonial do exercício e do excesso de arrecadação.
“A denunciada [presidente Dilma Rousseff], por meio dos decretos acima mencionados, autorizou, nos anos de 2014 e 2015, a abertura de crédito com inobservância à LOA e à Constituição Federal, justamente por permitir a abertura de recursos suplementares quando já se sabia da inexequibilidade das metas de superávit estabelecidas por lei, como demonstrado acima”, afirmou o pedido dos juristas.
Em outubro,o Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu que Corte fizesse a inspeção sobre essa prática. A representação é do procurador Júlio Marcelo de Oliveira. “A edição dos decretos não foi precedida da necessária observância à lei, que requer responsabilidade na gestão fiscal. Os decretos editados ampliam despesas que deverão ser custeadas pelo superávit financeiro apurado no balanço patrimonial do exercício de 2015 e pelo excesso de arrecadação”, aponta a representação.
O documento aponta que a materialização da lei que disciplina e exige responsabilidade fiscal do agente público é determinante no sentido de exigir a verificação da condução orçamentária e fiscal realizada pelo governo na oportunidade de efetivação das despesas, exigindo observância aos pressupostos de responsabilidade fiscal, que incluem ação planejada e transparente, em que previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal.
De acordo com o procurador, a edição dos decretos também contraria diretamente o conceito basilar de norma disciplinadora dos gastos públicos e afronta especificamente artigo da Lei Orçamentária de 2015. No ponto, fica autorizada a abertura de créditos suplementares desde que as alterações promovidas na programação orçamentária sejam compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário estabelecida para o exercício e os limites e as condições estabelecidos neste artigo, vedado o cancelamento de valores incluídos ou acrescidos em decorrência da aprovação de emendas individuais para o atendimento de despesas.
A representação destaca que devido ao baixo crescimento econômico e à tendência de queda da arrecadação tributária vislumbra-se que as receitas extraordinárias previstas para o segundo semestre de 2015 correm sério risco de não se realizarem. “Sempre é oportuno relembrar que o objetivo do controle da evolução das contas públicas é contribuir para um trajetória administrada do endividamento do Estado, de forma a indicar a solvabilidade de suas contas fiscais. Nesse sentido, a ação rigorosa e tempestiva desta Corte de Contas para coibir as ilegalidades supramencioanadas é fundamental para a credibilidade das contas públicas brasileiras”, explica o procurador.
Dessa forma, a representação expõe que por ocasião da edição dos mencionados decretos, a principal condição estabelecida na noma autorizativa – compatibilidade com a obtenção da meta de resultado primário – não foi observada, pois inexiste lei formal alterando a referida meta.
Rombo de R$ 120 bilhões Curiosamente, o pedido de impeachment baseado em crimes de responsabilidade fiscal, o Congresso Nacional aprovou nova meta fiscal que oficializa um rombo de quase R$ 120 bilhões nas contas públicas. A aprovação aconteceu depois de várias horas de debate e várias tentativas da oposição de adiar a votação, o governo finalmente conseguiu aprovar a lei que considerava essencial para sair do sufoco. A mudança da meta fiscal quer dizer que agora o governo federal tem a autorização do Congresso para terminar 2015 com um déficit. Essa mudança era necessária para evitar exatamente novos questionamentos do Tribunal de Contas da União. O placar foi folgado. Entre os deputados, 314 a favor e 99 contra a proposta. Entre os senadores, 46 a 16.
Irregularidade de 2014 Ao analisar as contas do ano passado, o TCU considerou que Dilma editou este mesmo tipo de decreto de créditos suplementares sem comprovar que eles eram compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário estabelecido na LDO, ferindo assim, no entendimento do Tribunal, o artigo 4º da lei orçamentária e o disposto no ártico 167, inciso V. Para o TCU, os créditos não poderiam ter sido abertos porque teriam que ser compatíveis com o superávit primário previsto na LDO daquele ano que ainda estava em vigor. Qualquer ampliação do gasto, disse o TCU, só poderia ter ocorrido depois de aprovada a mudança da meta fiscal.
Fonte : Contas Abertas