O secretário André Fraga avalia que Salvador se tornou referência nas áreas de mudanças climáticas
Guilherme Reis – Editor interino e Paulo Roberto Sampaio – Diretor de Redação
O secretário André Fraga, titular da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (SECIS), avalia que Salvador se tornou referência nas áreas de mudanças climáticas, de gestão da organização urbana, implantação de parques e de novas tecnologias. “Hoje nós, de fato, somos uma referência nacional e até internacional nesses temas. Se você avaliar, por exemplo, que Salvador é a primeira cidade no Norte e Nordeste em número de startups, se avaliar que os nossos programas de arborização já receberam prêmios nacionais e internacionais, se avaliar que toda a questão climática que a gente planeja já foi implementada… Então a gente tem aí bons resultados para apresentar”, declara, em entrevista à Tribuna. Sobre o cenário nacional, ele avalia que “há um movimento em direção contrária ao que todo planeta está indo”. “O governo federal, quase sempre na própria voz do presidente [Jair Bolsonaro], se coloca mais próximo de quem promove desmatamento ilegal, toca fogo na floresta e não quer fiscalização do Ibama e do ICMBio, passa uma mensagem para a sociedade e para o planeta de que o país não está muito preocupado com essa agenda”, critica. Sobre a eleição de 2020, Fraga afirma que o PV está aguardando uma posição do prefeito ACM Neto sobre quem será o seu candidato. “O Partido Verde, inclusive, está aguardando uma conversa que ele disse que terá com os partidos no início de janeiro para entender quem é essa candidatura e as posições dela, para que a gente possa somar-se a ela ou fazer um debate junto ao prefeito, entendendo qual será o melhor caminho”.
Tribuna da Bahia – Qual é o balanço da sua gestão na secretaria? Quais são os principais projetos?
André Fraga – É difícil avaliar a própria gestão, mas não podemos deixar de dizer que hoje Salvador se tornou referência nas áreas de mudanças climáticas, de gestão da organização urbana, implantação de parques e de novas tecnologias. Hoje nós, de fato, somos uma referência nacional e até internacional nesses temas. Se você avaliar, por exemplo, que Salvador é a primeira cidade no Norte e Nordeste em número de startups, se avaliar que os nossos programas de arborização já receberam prêmios nacionais e internacionais, se avaliar que toda a questão climática que a gente planeja já foi implementada… Então a gente tem aí bons resultados para apresentar.
Tribuna – Recentemente em Salvador tivemos um temporal que superou as expectativas e não vimos grandes problemas ambientais com vítimas fatais, como teve no passado. Isso é reflexo de políticas ambientais implementadas nos últimos tempos pela prefeitura?
Fraga – Com certeza. O que aconteceu na terça-feira é o que chamamos de evento climático extremo. O que é isso? É aquela chuva que, por exemplo, no nosso caso, em alguns lugares caiu em 24 horas 20% de tudo o que chovia no ano inteiro. Foi muita chuva. Esse tipo de evento está ficando cada vez mais frequente, porque o clima do planeta está mudando. Então, é óbvio que por um lado a prefeitura já está muito preparada para dar respostas nesses casos. Como você mesmo disse, não houve perdas de vidas. As comunidades mais vulneráveis foram preparadas e a prefeitura deu todo o suporte nessas áreas, no acompanhamento das perdas pessoais que as pessoas tiveram. Mas, por outro lado, está se preparando ainda mais. Vamos começar em janeiro o nosso plano de adaptação para mudanças climáticas. Hoje Salvador tem o Centro de Monitoramento e Alerta da Defesa Civil de Salvador [CEMADEC], que é referência nacional e internacional. Funciona 24 horas por dia, sete dias por semana, monitorando o clima para dar respostas e atuando na prevenção, principalmente. Atua no ano inteiro e não só nos períodos de chuva.
Tribuna – Na sua avaliação, quais são os principais gargalos hoje? Quais são as áreas mais necessitadas para implementar políticas ambientais em Salvador?
Fraga – Na área de mudanças climáticas, se a gente pegar, por exemplo, tudo o que a cidade emite de gases de efeito estufa, a gente tem dois grandes contribuintes: um é o transporte e o outro são os resíduosos. Essas duas frentes precisam ser atacadas para a cidade reduzir as suas emissões. Então, a prefeitura já está fazendo a transição da matriz dos ônibus, com veículos menos poluentes. A Secretaria de Mobilidade vai fazer essa transição. E na área de resíduos, a gente precisa avançar ainda mais. Tivemos uma redução considerável de geração de resíduos na cidade. Destacaria também o trabalho de saneamento e recuperação de bacias hidrográficas. Eu, particularmente, acredito que a recuperação do Mané Dendê pode dar um grande exemplo de recuperação de bacias hidrográficas para que os nossos rios possam correr limpos na cidade.
Tribuna – Como avalia a política ambiental hoje no Brasil? A gente viu nos últimos meses uma polêmica grande envolvendo as queimadas na Amazônia. E também muitas crises deflagradas inclusive pelo próprio governo federal, pela postura que assumiu aqui e lá fora. Como avalia essa questão?
Fraga – A gente avalia que há um movimento na direção contrária ao que todo planeta está indo. Os bancos de financiamento, as agências de fomento, os outros países – veja o acordo do Mercosul com a União Europeia -, tudo isso tem como critério a agenda climática e o enfrentamento das mudanças. Enquanto o governo federal, quase sempre na própria voz do presidente [Jair Bolsonaro], se coloca mais próximo de quem promove desmatamento ilegal, toca fogo na floresta e não quer fiscalização do Ibama e do ICMBio, passa uma mensagem para a sociedade e para o planeta de que o país não está muito preocupado com essa agenda. Há um movimento de prefeitos e governadores, independentemente do governo federal, de olhar essa agenda. Eu, particularmente, considero a agenda ambiental do governo federal um grande desastre, um fiasco. Por outro lado, a gente percebe que eles também jogam muito para a torcida. Por exemplo: está acontecendo agora a COP 25, em Madrid. Antes da COP, o governo federal editou um monte de norma para conseguir ter acesso ao fundo de recursos que vai ser consolidado no evento. Ou seja, faz um discurso para dentro falando mal da crise climática, e ao mesmo tempo faz um jogo para fora dizendo que vai buscar o dinheiro. Então, você vê que essa é uma agenda hoje totalmente atrelada ao desmatamento. Então, se a gente ficar assim, não haverá dinheiro externo para fazer nada.
Tribuna – Pesquisas apontam que o desmatamento na Amazônia aumentou. O senhor acha que essa postura do governo encorajou ou estimulou o aumento desse número?
Fraga – Acredito que há relação, sim. Queimada e desmatamento a gente já vem vendo há alguns anos, em uns mais e outros menos. Houve momentos em que existiam ações mais ou menos fortes. Mas em nenhum momento você teve um presidente se colocando contra pseudo ONGs internacionais, Leonardo Di Caprio agora… São coisas que a gente ri para não chorar, temos um presidente falando esse tipo de besteira. Quando o presidente, que é o cara que foi eleito e está lá [no poder], o cara que desmata se sente protegido e empoderado a fazer esse tipo de coisa. Acredito sim que há uma relação entre a postura do governo federal, especialmente do presidente e outros atores do governo, com o aumento do desmatamento. Isso aí é nítido.
Tribuna – Quais são as principais fragilidades e desafios que o senhor enxerga na política ambiental no Brasil hoje e, sobretudo, pelo governo federal? O governo precisa lidar melhor com o agronegócio?
Fraga – Acho que o governo federal precisa entender a agenda da sustentabilidade como uma agenda estratégica. Veja o caso da China, que está fazendo uma transição gigantesca e se transformando no país que mais produz energia renovável, que mais investe em recuperação de áreas degradadas e isso está gerando dinheiro e emprego. Vou dar um exemplo: o que mais polui nas cidades? Os transportes. Como a gente diminui a poluição dos transportes? Investindo em eletromobilidade, ou seja, em carros e ônibus elétricos. Imagine se o Brasil fosse o melhor lugar do mundo, com mais incentivos, para que empresas, montadoras e startups pudessem vir para o Brasil e pesquisar sobre veículos elétricos. Imagine como estaríamos estrategicamente, já que isso já está acontecendo. Não dá nem para dizer que é o futuro. Eu penso que entender a sustentabilidade de maneira estratégica é entender que o país vai se posicionar no tabuleiro do jogo do século 21. Por outro lado, o governo federal não entende isso. A gente tem também a agenda do agronegócio brasileiro não é 100% vilão. Tem muita gente séria, empresários corretos, mas o governo federal sempre se associa a quem não está querendo fazer nada de bom. E aí começam as redes internacionais a não querer receber mais nenhum tipo de produto do Brasil porque já não sabe mais se está vindo da Amazônia. Hoje não há rastreabilidade de boa parte dos produtos agrícolas e você não sabe se está vindo de um lugar desmatado ou não. Vejo os desafios da agenda estratégica do governo, que ele não entende como sendo dessa maneira, e vejo também essa questão do agronegócio associada à crise climática. A crise climática, na minha opinião, é o principal ponto por ser um grande guarda-chuva para a toda política de sustentabilidade e meio ambiente do planeta.
Tribuna – O Governo da Bahia, na sua opinião, tem sido competente e eficaz no trato dessa questão ambiental? Como avaliou as ações do Governo do Estado quando tivemos o problema das manchas de óleo no litoral?
Fraga – Veja, com o Governo do Estado temos uma relação muito protocolar e quase inexistente. Eu não consigo identificar quais são as ações do Governo do Estado para a agenda ambiental. Se você conseguir identificar, me avise, porque eu realmente não vejo. Então, não dá nem para avaliar. Se você pegar os parques estaduais no município de Salvador, estão abandonados, a exemplo do São Bartolomeu, que tem problema de esgoto que é de responsabilidade da Embasa. O Fórum Baiano de Mudanças Climáticas não se reúne há quase uma década e não promove políticas públicas. Qual foi o grande investimento da Embasa nos últimos anos e qual é o plano de investimento para limpar os rios da cidade? Eu também desconheço. Não consigo entender qual é a política ambiental do Governo do Estado. A água da Baía de Todos-os-Santos, até hoje, não tem um plano de manejo. Sobre a questão do óleo, eu vi a atuação do Governo do Estado do Espírito Santo, que foi exemplar. Se você comparar com a da Bahia… Ficou num debate, na minha opinião, infrutífero com o governo federal para questionar, brigar e fazer picuinha. O governo federal foi desastroso nesse aspecto, mas acho que o Governo do Estado também poderia ter feito muito mais. No caso de Salvador, não precisamos de ajuda e conseguimos dar a resposta rápido.
Tribuna – Quando as obras do BRT começaram criou-se uma polêmica sobre a retirada de árvores. Como é que a gestão pode atuar para mitigar os impactos ambientais que existe, não só em relação à obra do BRT, mas em todas as obras estruturantes que são feitas tanto pela prefeitura, como também pelo governo do Estado e o governo federal?
Fraga – Com relação ao BRT, houve essa polêmica que veio muito contaminada por essa disputa político-partidária. Faltou um pouco de honestidade intelectual por parte de quem fazia a crítica. Qual é o grande contribuinte para a poluição do ar, que mata oito milhões de pessoas? No Brasil, nos últimos 10 anos, aumentou em 10% o número de pessoas que morrem de problemas respiratórios. Onde precisamos investir? Primeiro, resolver o problema de mobilidade para, segundo, resolver o problema de impacto ambiental. Foram mais de 1 bilhão e 300 milhões de reais gastos pelo SUS só com problemas respiratórios em 2015. Então, o que estamos investindo em transporte público de qualidade, menos poluente. O BRT vem com essa lógica. Na questão de sustentabilidade, é importante que as pessoas entendam que ela se suposta no tripé social, econômico e ambiental. Se for só um ou dois, não é sustentável. Por outro lado, na prefeitura formulamos uma lei que determina as compensações, por exemplo, nesse caso das árvores. Foram 154 árvores que precisavam ser cortadas e outras transplantadas, e só nesse trecho você implementava mais de 800 novas árvores. Então, houve um ganho positivo tanto do ponto de vista do BRT quanto de plantação de novas árvores. É importante que as pessoas façam essa análise e deixem de lado o Fla-Flu que preferem acompanhar.
Tribuna – O que o senhor acha do projeto da Ponte Salvador-Itaparica? É um projeto grande que vai causar impacto naquela região em que vai ser implantada.
Fraga – Confesso que não tenho acompanhado tanto o projeto da Ponte Salvador-Itaparica, por conta do volume de trabalho que temos aqui. Mas acho que a ponte precisa ter um olhar cuidadoso, especialmente na chegada. Hoje aquela região da Calçada é bem complicada na questão do trânsito. Os impactos urbanísticos da chegada de pontes são sempre desafiadores. Mas, assim, é uma coisa que a gente nunca sabe. Há tanto tempo dizem que vai sair essa ponte.
Tribuna – Falando de política, quais são os planos do PV para as eleições do ano que vem? O senhor tem acompanhado essa discussão? Como o partido vai se posicionar na capital baiana?
Fraga – Estamos buscando gente da sociedade civil, pessoas que queiram se envolver com uma nova forma de fazer política de uma maneira estruturada. Estamos conversando com muita gente, trazendo muita gente para o partido. É um desafio, sobretudo com o fim das coligações. Além disso, a gente vai começar a fazer rodadas de conversas e debates para entender qual cidade a gente quer após a gestão do prefeito ACM Neto, o que é que já teve de avanço, o que está consolidado e o que precisa ser mudado. Então, começaremos em janeiro. Tem uma vontade da militância de ter candidatura própria. Isso está sendo desenhado de alguma forma. Não é algo que está descartado. Esse é o caminho, sempre com a perspectiva de olhar esse momento difícil que estamos passando no país, difícil para a pauta ambiental e da sustentabilidade. Entendemos que o PV aglutinará forças mais democráticas e sustentáveis em torno da política institucional. Por outro lado, entendemos que o partido precisa sobreviver em 2022 com a cláusula de barreira. Somos um partido pequeno.
Tribuna – Ivanilson Gomes, presidente estadual do PV, já chegou a falar que gostaria de ter um candidato a prefeito, mas pelo que você disse ainda não está decidido. Caso não tenha candidato, a possibilidade de o partido apoiar Bruno Reis é cogitada? Como avalia o desenho em relação à sucessão municipal?
Fraga – As conversas acontecem. Estudamos a possibilidade de o partido ter candidatura própria e também apoiar possíveis candidatos. Óbvio que tudo isso se desenhará de forma mais clara a partir do momento que o prefeito ACM Neto anunciar quem será o seu candidato. Vai ser Bruno Reis? Ele vai declarar publicamente isso? Vai conversar? O Partido Verde, inclusive, está aguardando uma conversa que ele disse que terá com os partidos no início de janeiro para entender quem é essa candidatura e as posições dela, para que a gente possa somar-se a ela ou fazer um debate junto ao prefeito, entendendo qual será o melhor caminho. É óbvio que temos uma relação com muita facilidade e companheirismo com o prefeito ACM Neto, que é uma pessoa muito correta com o PV. Conseguimos vencer a eleição de 2012 e o PV foi um dos primeiros partidos a assumir esse desafio junto com ele. Começamos com uma secretaria de estrutura pequena e hoje a secretaria colabora com a implementação de políticas públicas na cidade. Então, temos essa gratidão com o prefeito. Vamos conversar com o prefeito para decidir o melhor caminho.
Colaborou: Henrique Brinco
Fonte: Tribuna da Bahia