Ataque a uma escola na cidade paulista provoca debate sobre a flexibilização do Estatuto do Desarmamento
O ataque a uma escola em Suzano (SP) nesta quarta-feira (13/3) suscitou debates sobre o Estatuto do Desarmamento e a maioridade penal. No atentado, dois ex-estudantes — um de 17 e outro de 25 anos — invadiram o colégio armados e mataram sete pessoas (o tio de um deles também foi morto antes e a dupla se matou, totalizando 10 vítimas). Houve quem defendesse que a facilidade de acesso a armas tornaria tragédias deste tipo mais comuns e quem acreditasse que uma pessoa armada dentro da unidade de ensino — um professor, por exemplo — seria capaz de minimizar o massacre.
Especialistas ouvidos pelo Correio foram unânimes e categóricos ao afirmar que o maior acesso a armas provocaria mais episódios como esse. “Se você aumenta o acesso às armas, a tendência é que possa ter mais eventos envolvendo armas de fogo. É uma relação muito direta”, crava a especialista em segurança pública e professora da Universidade Católica de Brasília (UCB) Marcelle Gomes Figueira.
A docente também rechaça o argumento armamentista de que tragédias como essa também poderiam ser provocadas por armas brancas — facas, por exemplo. “A questão é a letalidade da arma. Com as armas brancas, quando você tem um conflito, a letalidade é muito menor, porque envolve a necessidade de contato físico. A arma de fogo tem um potencial lesivo muito maior. E em uma sociedade tão conflituosa como a nossa, aumentar o acesso a um instrumento que provoca lesões fatais é aumentar o número de lesões fatais”, pontuou.
Entre os que defendem que o maior acesso a armas poderia evitar tragédias do tipo está o senador Major Olimpio (PSL-SP). Durante reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, o parlamentar disse que “se tivesse um cidadão com arma regular dentro da escola — professor, servente, policial aposentado trabalhando lá —, poderia ter minimizado o tamanho da tragédia”.
O doutor em direito penal e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, Edson Knippel, porém, avalia que, com professores armados, o massacre poderia ter ainda mais vítimas. “Professor tem que ter giz na mão. Ele não é treinado para atirar em alguém. O ofício dele é ensinar. Arma é para a polícia e não para o cidadão”, opinou. Questionado sobre o modelo de escolas militarizadas — adotado em quatro unidades do DF —, em que policiais militares ajudam na gestão do colégio, o docente disse não ver uma relação direta entre o modelo e a coibição desse tipo de crime.
A professora da UCB, por sua vez, lembrou que nem mesmo nos Estados Unidos — país em que o acesso a armas é facilitado e classificado por ela como o “mais armado do mundo” — há o debate sobre armar professores. “Eles apostam em prevenção exatamente para evitar que as armas entrem nas escolas”, disse.
Maioridade penal
Em relação ao debate sobre a maioridade penal — hoje estipulada em 18 anos —, os dois especialistas afirmam não ser possível estabelecer qualquer relação entre o crime em Suzano e a possível sensação de impunidade em razão da idade de um dos atiradores. “Não vejo nenhuma ligação direta com a minoridade penal. [Essa] É uma questão muito mais social do que um caso de intervenção penal”, avaliou Edson Knippel. Marcelle Gomes Figueira destaca que o outro autor tinha 25 anos e que ambos “já estavam com intenção suicida”: “Não existe qualquer correlação com esse evento. Não sabemos quais foram as motivações de ambos para cometerem essa ação”.
Por fim, a professora fez uma crítica ao que chamou de “discurso oportunista”. “As propostas que esses atores estão propagando, em boa parte, já são realidade. A sociedade já tem uma grande quantidade de armas e a violência está relacionada à disponibilidade dessas armas. Já temos uma lei penal dura e o endurecimento não tem trazido resultados”, disse. “O que existe hoje é um discurso que tem forte apelo emocional junto à população. E é compreensível que a população se emocione com esse discurso diante da violência. O problema é como os governantes ignoram todas as evidências e todos os resultados de experiências práticas. Como nos estados de Pernambuco e Minas Gerais e no Distrito Federal, que reduziram os índices de criminalidade e não adotaram nenhuma dessas medidas. São profetas da segunda-feira. Mercadores da vida alheia. Estão realizando esses discursos em parceria com a indústria das armas e com outros fatores de grande interesse bélico”, disparou.
Fonte: Correio Braziliense