Hydro Alunorte, que tem entre um de seus maiores acionistas o governo da Noruega, ainda responde a processos judiciais de outro vazamento ocorrido em 2009 na mesma região
Reponsável pelo contaminação com resíduos tóxicos de rios na região de Barcarena, no Pará, a Hydro Alunorte, empresa da qual o governo norueguês é o maior acionista, acumula mais de 2.000 processos relacionados a crimes ambientais no Brasil.
A Alunorte opera sobre o controle da Norsk Hydro, que é hoje uma das maiores empresas de alumínio do mundo, tendo como maior acionista o Estado da Noruega (34,3% das ações) e o fundo de pensão do governo norueguês (6,5%). A Norsk Hydro se transformou em uma gigante com presença em 40 países – entre eles o Brasil, controlando, além da Alunorte, a mineradora Albras, também envolvida em casos de vazamentos na região. O restante das ações da companhia está dividido entre outros 18 sócios minoritários, que possuem uma porcentagem que vai de 0,7% a 2,9%.
A maior parte destes 2.000 processos é composta por processos individuais de pessoas afetadas por outros vazamentos da empresa, de acordo com o procurador da República Bruno Valente, do Ministério Público Federal do Pará (MPF-PA). À BBC, a própria companhia afirmou que o número já foi maior – na casa dos 5.000 – mas que venceu a maior parte deles.
O maior dos vazamentos – e origem da maioria das ações judiciais em trâmite – ocorreu em 2009, quando a Alunorte foi responsabilizada por um transbordamento de lama tóxica. Na época, um laudo constatou que a empresa despejou resíduos de bauxita, matéria prima usada na produção de alumina, no rio Murucupi, contaminando bacias da região.
Na ocasião, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) aplicou três multas à empresa, que, somadas, chegaram ao valor de R$ 17,1 milhões – quantia nunca paga pela Alunorte, que se defendeu alegando que o vazamento aconteceu por conta das fortes chuvas que atingiram Barcarena. Questionada por Opera Mundi, a companhia afirmou que o valor nunca foi pago “porque as multas ainda estão em fase de processo administrativo”.
A Hydro apelou, também, contra todos os pedidos de indenização. Até hoje, não houve nenhuma compensação ou pagamento de multa às famílias atingidas na época. Além disso, as vítimas do vazamento reclamam que a empresa tem fornecido apenas 20 litros de água por semana a cada dois habitantes, número inferior ao exigido pelo MPF em uma ação civil pública movida contra ela em 2016.
Fevereiro
No caso mais recente, ocorrido em fevereiro deste ano, um laudo do Instituto Evandro Chagas (IEC) comprovou que as regiões de Bom Futuro, Vila Nova e Burajuba registraram altos índices de contaminação. Segundo o relatório, “as águas apresentaram níveis elevados de alumínio e outras variedades associadas aos rejeitos gerados pela Hydro Alunorte”. A análise apontou ainda que as amostras de água colhidas pelo instituto apresentaram níveis de sódio, nitrato e alumínio acima do permitido, além de quantidades elevadas de chumbo.
A vistoria do IEC encontrou também uma “tubulação clandestina de lançamento de efluentes não tratados” em um conjunto de nascentes do rio Murici, o que, segundo o órgão, não deixou dúvidas sobre o envolvimento da empresa no desastre.
Questionada, a Hydro reafirmou que “não houve vazamento das áreas de depósito de resíduos sólidos”. Disse também que “tem realizado diariamente reuniões de diálogos com as comunidades e está comprometida com uma análise abrangente nas comunidades próximas à sua refinaria para entender em toda sua complexidade as condições da água nesta área de Barcarena”. A empresa chegou a afirmar que as bacias da região são 100% seguras.
“Sem fundamento”
No entanto, segundo o pesquisador em saúde Pública do IEC, Marcelo Lima, responsável pela elaboração do laudo, “a alegação de que não há risco se apresenta sem fundamentos. Resultados emitidos pelo IEC mostram sim que há contaminação das águas e que nesta condição não se recomenda o consumo ou contato primário com as mesmas.”
Lima afirmou também que a exposição aos contaminantes “pode causar irritações na pele e sintomas associados ao sistema gástrico. A longo prazo, pode trazer danos neurológicos e consequências mais graves”.
Por conta do vazamento, a Justiça do Pará determinou a suspensão parcial das atividades da empresa. A decisão obriga a Alunorte a reduzir 50% de toda a produção industrial. A Justiça também ordenou o embargo da bacia de rejeitos até que uma licença para operação seja apresentada.
A reportagem de Opera Mundi procurou a embaixada da Noruega no Brasil para comentar o caso da empresa da qual o país é acionista. Em nota, a representação diplomática afirmou que que “a Norsk Hydro é uma propriedade diversificada: 47% dos acionistas da empresa são investidores internacionais de fora da Noruega. O Estado norueguês possui 34,3% das ações. Ele é acionista minoritário e não está envolvido na gestão operacional da empresa”.
A empresa negava a existência de vazamentos em sua área de depósitos de resíduos sólidos. Somente nesta segunda-feira (19/03), a companhia reconheceu que houve vazamento. “Descartamos água de chuva e de superfície da refinaria não tratada no rio Pará”, afirmou o CEO da empresa, Svein Richard Brandtzaeg, em comunicado.
A nota afirma ainda que o vazamento ”é totalmente inaceitável e rompe com o que a Hydro representa. Em nome da empresa me desculpo pessoalmente com as comunidades, as autoridades e a sociedade”. “Toda a água da chuva e da superfície da refinaria da Alunorte deveria ter sido levada para o sistema de tratamento de água”, afirmou o grupo.
Fonte: Opera Mundi