O presidente lembrou que conflitos no País resultaram em concentração de poderes: ‘Temos de governar com espírito de abertura’
José Maria Tomazela, O Estado de S.Paulo
ITU – O presidente Michel Temer (PMDB) disse em Itu nesta quarta-feira, 15, dia em que se comemora a Proclamação da República, que o brasileiro tem tendência para o autoritarismo. “Se não prestigiarmos certos princípios constitucionais, nossa tendência é caminhar para o autoritarismo. Nós brasileiros temos tendência para a centralização”, afirmou.
Ele lembrou que, após a República, o País viveu longos períodos de conflitos que resultaram numa concentração de poderes, referindo-se à ditadura de Getúlio Vargas e à tomada do poder pelos militares em 1964. “Temos de governar com espírito de abertura, fazendo harmonia entre os Poderes, com diálogo e respeito ao Legislativo e Judiciário, em diálogo com a sociedade.”
Segundo Temer, o fato de ter transferido o governo para Itu tem uma simbologia, por ter se iniciado na cidade o movimento pela República, que considerou uma fórmula de impedir o movimento centralizador. “As pessoas ficam preocupadas com o que está acontecendo no Brasil. Nós sabemos que as instituições funcionam tranquilamente no País. A autonomia entre os Poderes está havendo e nós só fazemos reforçá-la. Tivemos várias contestações, vários eventos que tentaram paralisar o Brasil, mas a caravana foi passando.”
O presidente foi ao interior entregar o título de cidadão ituano ao empresário e amigo José Eduardo Bandeira de Mello, de 78 anos, seu ex-sócio num escritório de advocacia na década de 1960. Acompanhado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) e pelo ministro tucano Antonio Imbassahy, da Secretaria de Governo, Temer chegou de helicóptero e, após desembarcar no Quartel do Exército, seguiu para o prédio da prefeitura.
O presidente lembrou sua ligação com a cidade. Além de ser natural de Tietê, cidade vizinha, Temer foi professor e diretor da Faculdade de Direito de Itu (Faditu). “A vinda para cá revela aspecto familiar, sou aqui da região e me sinto em casa. Itu deixou sua marca na história do movimento republicano.”
Itu é conhecida como “berço da República” por ter sediado, em abril de 1873, uma reunião de personalidades paulistas com ideais republicanos, entre elas Prudente de Moraes, que viria a ser o primeiro civil a assumir a Presidência. O evento ficou conhecido como Convenção Republicana de Itu.
Protesto. Um enorme aparato foi mobilizado para a rápida passagem do presidente pela cidade do interior. Cerca de 150 homens do Exército foram destacados para proteger o trajeto de 300 metros entre o quartel e a prefeitura.
Viaturas da Guarda Municipal e da Polícia Militar bloquearam as ruas do entorno da prefeitura. Mesmo assim, um grupo de 20 pessoas ligadas ao PSOL e ao Sindicato dos Metalúrgicos de Itu e Região fez muito barulho do lado de fora, com faixas, aos gritos de “fora Temer” e contra a reforma da Previdência.
O grupo foi parado numa barreira policial. “Itu é a Mombaça do Temer”, disse o ex-vereador de Sorocaba, Osvaldo Duarte Filho. Em 1989, o então presidente da Câmara dos Deputados, Antonio Paes de Andrade (PMDB), que assumiu a Presidência da República numa viagem do presidente à época, José Sarney (PMDB), fez de sua cidade, Mombaça, no Ceará, a capital federal por um dia.
O presidente deixou o local pouco antes do meio-dia, sem falar com a imprensa. O ministro Imbassahy, que pode deixar a pasta com o desembarque do PSDB do governo, iniciado com a saída do agora ex-ministro das Cidades, Bruno Araújo, também se esquivou dos jornalistas.
Veja o discurso do presidente na íntegra:
Quero começar cumprimentando, naturalmente, José Eduardo Bandeira de Mello e a Maria Lúcia. E dizer desde já, viu Eduardo, pelo discurso que você fez e pelo tamanho das coisas aqui em Itu. Aqui é tudo muito grande.
Eu acho que você, embora receba o título de cidadão ituano, tendo em vista as coisas grandes de Itu, você é um cidadão do Brasil, não é verdade? Tenho absoluta convicção disso. Quero saudá-lo.
Quero cumprimentar o nosso querido governador, Geraldo Alckmin, e o Antonio Imbassahy, ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, os deputados federais: Fábio Ramalho, Beto Mansur, Herculano Passos, Marcio Alvino, Guilherme Gazzola, o prefeito, a deputada estadual Rita Passos, o vereador José Galvão Moreira Filho, presidente da Câmara dos Vereadores, e o vereador Givanildo Soares, que é o autor do projeto.
E quero cumprimentar, portanto, todos os senhores e as senhoras, os prefeitos que estão aqui, vice-prefeitos, vereadores, alguns municípios vizinhos. Vocês sabem que eu sou aqui da região.
Então, a vinda para cá revela um aspecto familiar, uma vez que está aqui a minha sobrinha Creuza representando a família. E sempre que eu venho para essa região eu me sinto em casa. É uma espécie, viu Beto, de uma cobertura emocional.
Nós que vivemos lá em Brasília, com aquelas grandes e naturais, mas superáveis dificuldades, Drª Maria Lúcia, nós quando chegamos aqui na região, nós sentimos precisamente acobertados, agasalhados e bem recepcionados.
E exatamente para celebrar hoje os 128 anos da República é que nós decidimos, governador, voltar a Itu, cidade como salientado pelo governador Alckmin, que deixou sua marca na história do movimento republicano.
Foi precisamente aqui, em 1873, que mais de uma centena de brasileiros de convicção republicana, se reuniram na famosa “Convenção de Itu”. E movidos, interessante, pelo propósito de fazer o Brasil entrar na modernidade.
A República é uma obra em constante evolução. A história nunca parte do zero, ela avança com etapas e cada geração encontra desafios próprios no seu tempo, e naturalmente faz o melhor para resolvê-los. Mas se é verdade que cada tempo impõe seus próprios desafios, os iguais republicanos permanecem.
Há mais de século continua a ser fonte de seguríssima inspiração, tanto é assim que o primeiro desses ideais da República é a democracia. E nós sabemos que só com muitos sacrifícios foi possível restaurá-la em nosso País.
A nossa Constituição de 88, que refundou o Estado brasileiro, ela é categórica, como fizeram outras constituições. Ou seja, todo o poder emana do povo.
As autoridades, nós aqui todos prefeitos, governador, deputados, vereadores, nós somos autoridades constituídas. Nós não somos autoridades diretamente, porque autoridades diretas no País é o povo. O povo nos constitui como tais e portanto, nós devemos ser sempre instrumentos da vontade popular, porque nós exercemos sempre mandatos meramente transitórios. E por isso o nosso dever é sempre tratar com responsabilidade a coisa pública.
Como até lembra o governador Geraldo Alckmin o próprio vocábulo República vem de coisa pública, reza pública, a reza do povo.
Um pouco diferentemente da monarquia, a história da transitoriedade dos mandatos significa a República. Na monarquia, embora haja setores com mandatos temporários, há um vitaliciedade do chefe de estado. Portanto, o nosso dever aqui na República é promover o bem comum, porque o bem comum é uma frase do nosso governador Montoro, é fundamental para confecção de outro ideal da cidadania e da República, que é precisamente pela cidadania.
Nós não devemos iludir enquanto persistirem carências sociais, estaremos distantes dessa cidadania plena. Nós sabemos, temos coragem de dizê-lo que esse ainda é o caso do Brasil, mas nós temos avançado muito. No Brasil, aqui na cidade de São Paulo, nos vários estados brasileiros. Trabalhando pelo emprego, pelo desenvolvimento social. Portanto trabalhar pela cidadania é trabalhar pela democracia.
Outro fundamento da nossa República, e até registro um fato curioso, nós comemoramos muito a República no dia 15 de novembro, mas é outro fato relevante do decreto nº 01 de 15 de novembro de 1889, foi a instauração da federação. Porque foi nesta data que se instaurou a República e a Federação no Brasil.
E, ao mesmo tempo, sempre foi ideal da nossa República a independência e a harmonia entre os poderes, este é um tópico fundamental da República. Que é o ideal que temos colocado na ação desde o primeiro dia, por exemplo, umas das palavras chaves do nosso governo, é o diálogo, diálogo e respeito, com o Legislativo e o Judiciário.
Portanto, pautados pela ideia da separação de poderes. Como temos diálogo com a sociedade, quando o José Eduardo, mencionou a chamada modernização trabalhista, nós o fizemos pautados por um acordo entre empresários e trabalhadores. Portanto, as forças produtivas do País se reuniram para elaborar, como elaborado foi, um projeto de lei que entrou em vigor, agora no dia 11.
E nós temos, portanto, uma colaboração extraordinária com o Congresso Nacional, e que nós temos levado adiante, num esforço coletivo para recuperação do Brasil.
Vocês podem até me dizer: “É interessante, mas Temer, porque você está dizendo isso, como se fosse uma coisa relevantíssima? ” Pois é, se nós não prestigiarmos certos princípios constitucionais, a nossa tendência é sempre caminhar para os autoritarismos, para uma certa centralização.
Nós temos uma certa, digamos, uma certa tendência para centralização. E eu revelo historicamente para você como essa tendência é verdadeira.
Vamos pegar de 1891, governador, primeira Constituição Republicana Federativa, até 1930, foram um período em que lá estava escrito também que o poder emana do povo. Mas na verdade só houve conflitos. Em [19]30 nós começamos um sistema centralizador, que foi se centralizando cada vez mais até chegar em [19]37 com centralização absoluta. E assim foi até [19]45, de [19]30 a [19]45.
Novamente os ventos da democracia sopraram no mundo. E sopraram no País. Nós restauramos a democracia com a Constituição de 18 de setembro de 1946. E daí, vivemos um período em que mais uma vez se dizia que o poder emana do povo de setembro de [19]46 a [19]64. Mas a nossa vocação centralizadora e, convenhamos, quando os movimentos centralizadores ocorrem, não por um… simplesmente um golpe de estado, é porque o povo também quer, acaba desejando, no fundo é isso.
Eu me recordo, nos idos de [19]64 os vários movimentos que pleiteavam uma concentração de poderes. E com isso destruiu-se um dos princípios republicanos que era a harmonia e independência dos poderes, e assim foi de [19]64 até [19]88, quando nós recuperamos a democracia.
Estou dando esse panorama histórico, tomando um pouco o tempo dos senhores e das senhoras, mas apenas para revelar como hoje é importante nós enaltecemos, Gazzola, esses princípios republicanos.
Que foram, é interessante, a história se repete um pouco, quem lê o manifesto da Convenção Republicana aqui de Itu, verifica que isso que estou dizendo é de uma trivialidade, de uma frugalidade extraordinária, porque lá atrás já se pensava nessas palavras que eu estou aqui mencionando.
Portanto, nós temos que sempre governar com espírito de abertura, ouvindo a todos. Fazendo a harmonia entre os poderes, que é uma coisa que deve estender-se, digo eu, para estados e municípios, e nada é mais natural. Porque se estou dizendo que o decreto número 01 instaurou a República e Federação é natural que nós ganhamos até uma Federação verdadeira, e não uma Federação disfarçada.
Porque quando eu fiz esse histórico aos senhores e as senhoras eu quis significar também que nesses momentos de centralização não só os poderes eram destituídos das suas funções, como a autonomia municipal e a autonomia estadual tornava-se algo quebrada, frágil, fragilizada.
Então quando nós falamos da República nós estamos falando da Federação, e quando falamos da Federação nós estamos falando da descentralização da atividade pública, da atividade política, da atividade administrativa.
Então, digo eu, nós temos hoje mais do que nunca, eu quero aproveitar este auditório, este cenário, esta cidade, este município, que foi berço da República e da Federação, para dizer: vamos enfatizar também uma reforma federativa. Não apenas a reforma social, não apenas a responsabilidade fiscal, mas também uma reformulação federativa, de maneira em que estados e municípios tenham cada vez mais autonomia, não apenas competências, mas recursos próprios para gerir essas competências. Se chegarmos a isso nós estamos, José Eduardo, exatamente nos pautando pelos princípios da Convenção Republicana que se deu aqui em Itu.
Então eu quero dizer aos senhores e as senhoras que o fato de nós termos praticamente transferidos, digamos, o governo aqui para Itu, é de uma simbologia muito forte, muito significativa. É para dizer: olhe, não é apenas em função do município, claro que também é, eu que frequentei tanto tempo o município de Itu como professor, aqui foi dito. Mas também pela simbologia de aqui nós termos inaugurado uma fórmula que a rigor, deveria impedir aqueles movimentos centralizadores que se deram no histórico que eu fiz. O ideal seria que nunca tivéssemos essa centralização, o autoritarismo em certo momento que houve no passado.
Então, eu digo isso também porque muitas e muitas vezes eu vejo que as pessoas ficam preocupadas com o que está acontecendo no Brasil. Ora bem, nós todos sabemos que hoje as instituições funcionam tranquilamente no nosso País, os poderes são independentes, o Judiciário e as suas funções, o Executivo tem as suas funções, o Legislativo igualmente.
A autonomia dos estados e municípios está presente e nós só fazemos reforçá-la. O governador Geraldo Alckmin se lembra que num dado momento havia uma grande dificuldade financeira nos estados e nos municípios, tendo em vista uma dívida contraída lá atrás, e que gerava para os estados um pagamento muito elevado para a União Federal mensalmente.
Logo que eu assumi, fizemos uma repactuação. Tanto que nos primeiros seis meses deste acordo, desta repactuação, os estados nada precisaram que pagar a União, depois fomos restabelecendo na base Ou seja, é uma homenagem ao princípio federativo.
Quando os municípios no final do ano tiveram dificuldades para fechar o seu balanço, eu fiz editar no caso uma medida provisória para dividir a chamada multa da repatriação de recursos. E com esta divisão, que não estava prevista em lei, com essa repactuação os municípios puderam fechar os seus balanços.
Então é interessante, me permitam aproveitar esse auditório, presente nós temos, viu governador, no nosso governo a ideia do diálogo, em primeiro lugar, a palavra-chave do governo, a segunda palavra-chave é a responsabilidade fiscal. Por isso que nós, aqui o José Eduardo mencionou o teto dos gastos públicos, que é uma coisa também de uma trivialidade extraordinária, mas jamais foi cogitada no nosso País, ou seja, você só pode gastar aquilo que você arrecada, porque isso é que dá a verdadeira responsabilidade para o governo.
E de outro lado nós temos a responsabilidade social, que é outra expressão, outro vocábulo do nosso governo, onde nós nos voltamos para os mais carentes. Evidentemente há teses, há coisas, há projetos de governos anteriores, que nós mantemos e elevamos ainda com aumentos como o Bolsa Família, o financiamento estudantil. Só do financiamento estudantil colocamos mais de 300 mil bolsas neste ano e meio.
E notem, nós conseguimos ao longo do tempo com algumas medidas tomadas, por exemplo, a recuperação das estatais. Vocês sabem que as estatais com a Petrobras. Convenhamos, a Petrobras até dois anos atrás mais ou menos, virou quase, se permitem a expressão forte, um palavrão. Hoje a Petrobras dá um lucro excepcional, nós recuperamos em menos de 16 meses. Assim foi com o Banco do Brasil, assim é com a Eletrobras, assim com as estatais todas, fruto precisamente desta ideia da responsabilidade fiscal conectada com a responsabilidade social.
Nós pegamos o governo com mais de 14 milhões de desempregados. Hoje precisamente hoje, pelo IBGE nós verificamos que há 1 milhão e 60 mil pessoas ocupadas, com carteira assinada, com contrato informal, ou que retomaram uma determinada atividade. E as previsões revelam que em pouquíssimo tempo nós teremos mais de dois ou três milhões de desempregados que obterão emprego.
Também não preciso dizer que pegamos uma inflação, não é governador, extraordinária. A inflação era de 9.28, 9.38 quando apanhamos, e hoje está em 2.54 e a tendência é cair ainda mais.
Os juros estavam em 14.25 e hoje estão em 7.25 caminhando para 7% até o final do ano como dizem os analistas.
O risco-Brasil, ou seja a credibilidade do Brasil no exterior quando apanhamos o governo estava em 568 pontos, hoje caiu para 239 pontos. Portanto uma credibilidade extraordinária no nosso País, e nós não estamos falando de um governo de 4 anos 8 anos, nós estamos falando de um governo de 16 meses, 17 meses, e com várias contestações. Vários eventos que tentam paralisar o governo, mas que não paralisaram porque a caravana foi passando tranquilamente e nós chegamos até para vir comemorar hoje recordando.
E é importante recordar no Brasil, porque é interessante nós aqui não tributamos homenagem aos nossos antepassados, aos fatos históricos que marcaram o Brasil.
Então eu quis vir aqui para dizer: a República e a Federação foram fatos extraordinários, como Itu foi o berço desses fatos, desses fatores relevantíssimos para a democracia, para separação de poderes. Nós viemos aqui para comemorar este evento.
E até muito agradavelmente dar um abraço no José Eduardo Bandeira de Mello pelo título ituano brasileiro que ele acabou de receber.
Muito obrigado.
Fonte: Estadão