Promulgada na semana passada, a reforma da Previdência ainda dá dor de cabeça ao presidente Jair Bolsonaro. Deputados ameaçam não votar propostas de interesse do Palácio do Planalto até o fim do ano no plenário caso o governo não libere as emendas parlamentares que, segundo eles, foram prometidas para que apoiassem a proposta, cuja votação foi concluída em agosto na Câmara.
Pressionado, Bolsonaro se comprometeu ontem com um grupo de deputados a conversar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para acelerar a liberação dos recursos orçamentários para as bases eleitorais dos congressistas. As mediações têm sido feitas pelo ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos. “O ministro tem tido boa vontade e está tentando ajudar. Mas é um governo em que não se sabe quem manda. Os ministros não conseguem tocar as negociações”, reclama o deputado Paulo Pereira da Silva (Solidariedade-SP), o Paulinho da Força, um dos participantes do encontro com o presidente e o próprio ministro.
Paulinho disse abertamente ao Congresso em Foco o que outros parlamentares reclamam nos bastidores. “O governo prometeu emendas para aprovar a reforma da Previdência, mas não cumpriu o acordo. As emendas não foram pagas. Por isso, o pessoal não está com muita vontade de votar aqui”, disse o deputado ao site.
A primeira “vítima” dessa rebelião deve ser a medida provisória (MP 890/2019) que cria o programa Médicos pelo Brasil, sucessor do Mais Médicos. Há um mês na pauta, a MP perderá a validade se não for votada por deputados e senadores até a quinta-feira da próxima semana. “Vence dia 28? Esquece, vai caducar”, avisa Paulinho.
Parlamentares ligados à área da saúde ainda pressionam o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a votar a proposta, mesmo sem consenso em torno do seu mérito. “E como ficarão as cidades sem médicos?”, protesta a deputada Carmem Zanotto (Cidadania-SC), uma das líderes da Frente Parlamentar da Saúde. Maia disse que fará uma última tentativa ao pautar a MP para a próxima terça-feira. Nesse caso, o Senado teria apenas dois dias para apreciar o polêmico texto.
Segundo Paulinho, dos 370 deputados que votaram a favor da reforma da Previdência, 304 não tiveram um centavo sequer liberado até o momento. O Congresso em Foco procurou o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), para comentar o assunto, mas não teve retorno.
“Eu posso falar sobre isso à vontade porque votei contra a reforma”, ressalta Paulinho, que é um dos líderes do chamado Centrão, grupo informal que reúne partidos como o Solidariedade, o DEM, o PP, o PL e o PRB e exerce grande influência sobre as votações na Casa.
Parlamentares têm reclamado da falta de articulação política do governo, que não tem uma base formalizada no Congresso e trabalha votação a votação, sob o argumento de que não faz “toma lá, dá cá”, ao contrário de seus antecessores. A estratégia, porém, é considerada arriscada. “Estou há 13 anos no Congresso e nunca vi um governo tão desarticulado. A presença do governo sempre foi muito forte aqui. Agora não tem governo. É tudo muito aleatório”, critica Paulinho.
O fundador do Solidariedade e o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA), foram convidados de última hora pelo ministro Luiz Eduardo Ramos para uma reunião ontem, já prevista com o líder Major Vitor Hugo e os deputados Vinicius Carvalho (PRB-SP), Cláudio Cajado (PP-BA) e Coronel Armando (PSL-RJ) e os senadores Arolde Oliveira (PSD-RJ) e Lucas Barreto (PSD-AP).
Insatisfação com ministros
A liberação das emendas não é o único motivo de insatisfação dos deputados. Um deputado ouvido pelo Congresso em Foco explica que parlamentares têm tido dificuldade de acesso nos ministérios. “Nós queremos receber um mínimo de atenção. Ser recebido por um ministro, poder levar um prefeito, encaminhar alguma demanda de nossas bases. Mas não encontramos abertura para isso”, critica esse deputado, que pediu para não ser identificado. Paulinho endossa a reclamação: “Os ministros são muito arrogantes, agem como se fossem imperadores”.
Além de não votarem propostas de interesse do Planalto, deputados do Centrão também ameaçam impor derrotas ao governo. Para que isso não ocorresse, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), derrubou a sessão conjunta de ontem e convocou líderes partidários para uma reunião nesta quinta-feira. Na pauta, estavam vetos presidenciais e projetos de lei de abertura de crédito suplementar.
Parlamentares insatisfeitos com o Planalto querem derrubar vetos de Bolsonaro à chamada minirreforma eleitoral. Um desses itens é o que aumenta os recursos do fundo eleitoral, destinado às campanhas eleitorais. Eles querem definir critérios que permitam a elevação desses recursos para até R$ 4 bilhões, cerca de R$ 1,5 bilhão a mais do que o governo defende.
Fonte: Congresso em Foco