Presidente afastado do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) foi pessoalmente ao gabinete do colega Tasso Jereissati (CE), que o substitui no posto, para avisá-lo de que estava de volta ao comando tucano. A decisão de Aécio provocou uma onda de protestos dos chamados “cabeças pretas” do PSDB, que querem a renúncia de Aécio e o fim da aliança com o governo Michel Temer. Do outro lado da Câmara, Tasso conteve a insatisfação e cobrou “sinceridade” do correligionário. Mas, em plenário, declarações ao microfone deram o tom da revolta no ninho tucano.
“Rasgaram e jogaram no lixo a história do PSDB. Tenho certeza de que vai haver resistência interna e externa!”, vociferou Daniel Coelho (PSDB-PE), um dos principais defensores do desembarque do governo Temer, no plenário da Câmara, minutos depois da notícia sobre a decisão de Aécio. Ele disse ainda que o presidente de honra do partido, Fernando Henrique Cardoso, estava “perplexo” com a intervenção de Aécio.
Daniel sugeriu que a manobra de Aécio foi orquestrada com antecedência. Ele lembrou que o vice-presidente do partido Alberto Goldman, ex-governador de São Paulo, mora em São Paulo mas já está em Brasília – a intervenção de Aécio resultou na colocação de Goldman na presidência do PSDB para “garantir isonomia” na disputa entre Tasso, que ontem (quarta, 8) formalizou candidatura à presidência do partido, e o governador de Goiás, Marconi Perillo, aliado de Aécio. Perillo divulgou nota (veja abaixo) e classificou a decisão do parceiro como “correta”.
“Esse é um ato tão planejado que, hoje, o presidente interventor do PSDB, o Goldman, já viajou de São Paulo para cá e aqui já está. Ele está, agora, sentado na cadeira de presidente do PSDB, na sede do partido, porque já tinha combinado esse golpe rasteiro com Temer, com os ministros do PSDB e com Aécio Neves”, acrescentou Daniel Coelho, referindo-se aos quatro ministérios comandados por tucanos – algo que partidos da base condenam, uma vez que o partido está cada vez mais fora do governo e, mesmo assim, mantém pastas estratégicas como Relações Exteriores (Aloysio Nunes) e Cidades (Bruno Araújo).
O deputado Rocha (PSDB-AC) também foi ao plenário da Câmara para reclamar da situação no tucanato. “Quero mais uma vez dizer que o senador Aécio Neves envergonha o nosso partido. Sinceramente, chegou a hora de o senador Aécio Neves deixar o partido. Não podemos deixar que este partido grande, que representa certamente a esperança de muitos brasileiros, seja jogado na vala comum. Chegou a hora de o senador Aécio Neves tomar o seu rumo e não envergonhar mais o nosso partido”, discursou.
“Sinceridade”
Tasso deu declarações à imprensa tão logo sua destituição ganhou o noticiário. “Eu disse para ele exatamente o que eu vou dizer para vocês: que pedia dele uma certa sinceridade quando viesse argumentar as razões, porque afinal de contas nós éramos amigos – e somos, espero – durante 30 anos. E que eu sabia, perfeitamente, que ele não queria isso em nome da equidade, não era bem esse o pensamento dele. Até porque foi ele quem prorrogou o próprio mandato. Pedi apenas que ele falasse comigo com toda franqueza, que ele não queria que eu fosse candidato nem presidente do partido”, reclamou o senador, reafirmando as “diferenças profundas, muito profundas” com Aécio.
“Não queria que ele viesse trazer justificativas como se fossem republicanos. Decerto é que não são. E que, portanto, eu preferia que ele me afastasse a eu pedir para ficar bem nítidas as nossas diferenças”, acrescentou o parlamentar cearense. “Dito isso, ele levantou-se, foi ao seu gabinete e me mandou ofício comunicando que tinha assumido o partido novamente.”
Durante a entrevista, o parlamentar cearense manifestou por mais de uma vez sua objeção à aliança do PSDB com o governo Temer. Tasso sugeriu que Aécio usa o partido por interesse pessoal e afirmou que, se o senador mineiro estivesse pensando no futuro do partido, “isso não estaria acontecendo hoje”.
A situação no tucanato deve resolvida em 9 de dezembro, para quando está marcada a próxima convenção nacional do PSDB. Tasso, que enfrentará Marconi Perillo e a máquina partidária do governo federal, que está com Aécio, diz acreditar que sua candidatura sai ainda mais fortalecida do episódio desta quinta-feira (9). O senador garante que terá apoio suficiente no embate com os adversários.
“O meu PSDB não é o PSDB desses caras”, concluiu, referindo-se ao grupo de Aécio.
“Orgulho”
Mas houve quem defendesse Aécio Neves, denunciado ao Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção passiva e obstrução de Justiça e um dos principais investigados na Operação Lava Jato. “Nós estamos divididos. Isso é normal. Uma corrente partidária tem que ser respeitada. O divisor de águas não é o governo Temer. Nós fizemos o impeachment e tínhamos responsabilidade com o país, mas o queremos é construir um projeto de futuro e precisamos trabalhar nossa unidade”, ponderou Marcus Pestana (PSDB-MG), criticando a “autofagia pública num fórum inadequado”.
Marcus Pestana também negou que a questão do comando tucano esteja ligada à manutenção do apoio do PSDB ao governo peemedebista, como contrapartida na parceria que Aécio teve, há algumas semanas, para manter seu mandato no Senado com o apoio do PMDB.
As falas de alguns deputados de oposição sobre Aécio, principalmente proferidas por petistas, eram intercaladas com os pronunciamentos tucanos – em que a minoria manifestava apoio ao senador. “Nós temos orgulho do Aécio”, chegou a dizer Domingos Sávio (PSDB-MG), parceiro do senador na política mineira, ao ouvir críticas de petistas em plenário.
Acusações
A exemplo do presidente Michel Temer, acusado de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, Aécio é alvo da delação de executivos da JBS, entre eles os irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da empresa e presos por violação da lei de delação premiada. Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), o senador recebeu dinheiro do conglomerado empresarial, um dos maiores do país, e agiu em parceria com Temer para embaralhar investigações da Lava Jato. Além disso, dia a PGR, Aécio atuou para modificar proposições em tramitação no Congresso com o objetivo de atrapalhar as apurações judiciais.
Em um dos flagrantes que justificaram as acusações, um primo de Aécio foi filmado recebendo uma mochila de dinheiro depois da conversa em que Aécio e Joesley falam sobre diversos assuntos, inclusive pedido de dinheiro, em meio a xingamentos e linguagem chula. Depois dos registros, a irmã de Aécio, Andrea Neves – que participava de negociatas em nome do senador, segundo a acusação – e um de seus primos chegaram a ser presos em maio, mas conseguiram habeas corpus dias depois. Sob investigação no STF, o senador tucano nega as acusações e diz que procedimentos da PGR, como o pedido de sua prisão, viola a Constituição Federal.
Aécio foi gravado pedindo R$ 2 milhões a Joesley Batista. Em um dos áudios do diálogo, que durou cerca de 30 minutos, o tucano justifica de que precisava pagar despesas com sua defesa na Lava Jato. O senador usa muitos termos chulos durante a conversa.
Confira a nota de Marconi Perillo:
A decisão tomada hoje pelo presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, foi correta e justa e restabelece o equilíbrio de forças para a disputa na Convenção Nacional do partido em dezembro.
Seria antiético e nem um pouco isonômico o processo se essa decisão não fosse adotada, já que a máquina partidária poderia pender para o lado de quem estivesse no comando do partido.
O ex-governador Alberto Goldman é um líder com história e biografia respeitáveis no partido e na vida pública, e, portanto merecedor de todo o nosso respeito. Por certo, conduzirá com isenção, espírito público e ética o processo sucessório interno nos 30 dias que antecedem a Convenção, marcada para 9 de dezembro.
De minha parte, continuo determinado a manter o nível elevado dos debates e proposições e, sobretudo, aberto ao permanente diálogo em defesa da unidade e da pacificação do PSDB.
Dos 7 mandatos que exerci, 6 foram nos quadros do PSDB, e em todos os momentos da minha vida partidária fui solidário, ético e colaborativo para com meus companheiros, colaborando sempre com a unidade, em todas as convenções e momentos cruciais ou decisivos da vida do partido.
Nunca deixei de apoiar os candidatos à Presidência da República pelo PSDB, que sempre foram vitoriosos em Goiás, e jamais faltei para com meu partido. Sempre atuei com lealdade, solidariedade e em defesa das nossas teses e de nossos melhores propósitos para com o Brasil.
Goiânia, 9 de novembro de 2017
Marconi Perillo – Governador de Goiás
Fonte: Congresso em foco