O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados instaurou nesta terça-feira processo disciplinar que pode levar à cassação do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Enquanto aliados de Cunha trabalham para arquivar o processo na fase preliminar, adversários já preparam estratégia para levar o debate ao plenário da Câmara caso isso ocorra. Na reunião marcada para esta tarde, será feito um sorteio de três integrantes do Conselho. O presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PSD-BA), escolherá posteriormente um deles para relatar o caso. O escolhido vai apresentar um parecer preliminar para que o Conselho decida se há motivos para investigar o presidente da Casa por quebra de decoro.
A representação do PSOL e da Rede contra Cunha aponta que ele mentiu a seus pares ao negar, na CPI da Petrobras, ter contas no exterior. O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu um inquérito no mês passado, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), para apurar crimes de lavagem de dinheiro e corrupção com base em documentação do Ministério Público da Suíça apontando Cunha e sua mulher, Cláudia Cruz, como beneficiários de quatro contas no banco Julius Baer. Contas que teriam sido abastecidas com recursos desviados de contrato com a Petrobras. Além disso, o presidente da Câmara já foi denunciado pela PGR por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo recebimento de propina relativa à contratação de navios-sonda pela estatal.
Os aliados de Cunha, porém, trabalham para encerrar o processo no Conselho ainda na fase preliminar. O parecer apresentado nesta primeira fase vai avaliar se a representação deve ou não ser admitida. Somente se a maioria do Conselho entender que o processo deve seguir adiante é que começarão os depoimentos e demais diligências para coleta de provas. Os opositores de Cunha já falam em recorrer ao plenário da Câmara, caso o Conselho aprove um parecer preliminar pelo arquivamento. O Código de Ética prevê que, para ser levado ao plenário, é necessário que esse recurso tenha o apoio de um décimo dos 513 deputados (51 assinaturas). No plenário, essa votação, se ocorrer, será simbólica, com os favoráveis ou contra Cunha levantando as mãos. Se um dos partidos pedir verificação, aí a votação será nominal, com cada parlamentar se manifestando no painel eletrônico.
O próprio presidente do colegiado disse que assinará o eventual recurso. Como não há previsão de que Cunha se defenda oficialmente nesta fase, ele argumenta que o Conselho não pode encerrar o processo sem ouvir o presidente da Casa:
— Se for rejeitada a admissibilidade, eu assinarei o recurso. Tem que dar a oportunidade ao representado de se defender e provar sua inocência — afirmou Araújo.
Titular no Conselho, Júlio Delgado (PSB-MG) também diz que assinará um eventual pedido de recurso. O deputado do PSB antecipou ao GLOBO que, antes da reunião de hoje, irá se declarar impedido de ser o relator. O próprio presidente já tinha defendido a exclusão de Delgado por ele ter enfrentado Cunha na disputa contra a presidência da Câmara. Mas continuará titular e vai votar no caso.
— Sabendo que uma eventual escolha do meu nome pode levar o presidente Cunha a requerer meu impedimento e protelar ainda mais o processo, vou requerer meu afastamento — disse Delgado.
Apesar de o Código de Ética não prever a apresentação de defesa já nesta fase, o presidente da Câmara afirma que irá se pronunciar.
— Depois de notificado verei o que fazer. E irei me manifestar, sim. Antes do preliminar — afirmou Cunha ao GLOBO, por mensagem de texto.
Presidente do Conselho, José Carlos Araújo afirma que não há previsão de qualquer defesa nesta primeira fase. O Código de Ética prevê que, somente se o processo for adiante, haverá a notificação de Cunha. Araújo disse que deve nomear o relator do caso amanhã.
— Teremos o sorteio e preciso ter pelo menos 24 horas para conversar, para saber qual a disposição deles — afirmou.
O deputado Silvio Costa (PSC-PE), um dos parlamentares mais críticos a Cunha, acha que não há risco de ser rejeitada a admissibilidade, mas diz que, caso isso ocorra, vai liderar o recolhimento de apoios para levar o caso ao plenário:
— Claro que vou recorrer. E não faltarão deputados para assinar. Mas acho que esse risco não se corre de jeito nenhum.
Fonte : Jornal O Globo