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DIOGO BERCITO
ENVIADO ESPECIAL A BARCELONA
O governo da Catalunha declarou neste domingo (1º) a vitória de seu plebiscito separatista com 90,09% dos votos favoráveis à independência e 7,87% contrários —o restante votou em branco ou nulo.
Em um dia marcado pela violência policial, participaram da consulta 2,2 milhões de pessoas, cerca de 40% do eleitorado de 5,5 milhões.
O presidente catalão, Carles Puigdemont, disse que a região —com algum grau de autonomia— “ganhou o direito de ser um Estado independente”. Ele sinalizou que seu Parlamento deve declarar a independência de maneira unilateral em 48 horas.
O governo central em Madri, no entanto, considera a consulta ilegal e não vai reconhecer o resultado.
O premiê espanhol, o conservador Mariano Rajoy, declarou que “não houve um plebiscito”. “Não vimos nenhum tipo de consulta, mas uma mera encenação.”
“Todos os espanhóis viram que nosso Estado de direito mantém sua fortaleza e sua vigência, que responde aos contraventores com eficiência e serenidade”, disse.
O plebiscito separatista catalão deste domingo teve seções eleitorais invadidas pela polícia, eleitores retirados à força e milhares votando embaixo da chuva.
Segundo o Departamento de Saúde da Catalunha, foram atendidas 844 pessoas feridas nos embates com a polícia, que chegou a usar balas de borracha contra manifestantes. Houve também 33 policiais feridos.
A violência da polícia foi duramente criticada durante o dia. Em repúdio, sindicatos convocaram greves para esta terça-feira (3).
O presidente catalão, Puigdemont, disse que “a brutalidade policial vai envergonhar o Estado espanhol para sempre”. Autoridades catalãs denunciaram a polícia para o Tribunal Superior de Justiça da Catalunha.
O porta-voz do governo catalão, Jordi Turull, disse que o governo espanhol responderá nas cortes internacionais pela violência. “É simplesmente selvagem, um escândalo internacional.”
Um vídeo registrando a polícia destruindo as portas de um colégio eleitoral causou especial indignação, assim como cidadãos jogados ao chão pelas forças de segurança. No sábado (30), um cartaz pedindo mais democracia (“más democracia”, no original) foi destruído por manifestantes contrários ao voto.
CELEBRAÇÃO
Segundo o Ministério do Interior espanhol, 336 seções de voto de um total de mais de 2.000 foram interditadas.
O voto, apesar dos impedimentos, era feito de modo festivo. Em uma das escolas visitadas pela Folha eleitores tinham criado uma espécie de corredor batendo palma a quem saía das urnas, cantando “Votou! Votou!”.
“Isso para mim é liberdade”, diz Maria Oliva, 60. “Vivi a época franquista, me sinto como era há 40 anos.”
Ela se refere à ditadura do general Francisco Franco (1939-1975), período durante o qual o movimento separatista catalão foi reprimido.
“Não é sobre votar ‘sim’ ou ‘não’. É sobre votar. Tenho vergonha de ser espanhola, e não quero mais. Se pudesse, seria só catalã.”
Mas para Pau Freixa, 41, o plebiscito de domingo não é sobre declarar ou não a separação imediata. É sobre mostrar o apoio ao projeto de um Estado próprio, diz o professor de literatura eslava.
“É importante que as pessoas vejam quão desesperados estamos”, diz. Freixa e outras 30 pessoas dormiram em uma escola de Barcelona para impedir que a polícia fechasse o colégio eleitoral. A noite foi longa, embaixo da chuva. “Não temos um interlocutor em Madri.”
URNAS OCULTAS
Puigdemont, presidente catalão e declaradamente a favor da independência, votou pela manhã em Cornellà de Terri, onde foi celebrado pelos eleitores presentes.
Cada voto era comemorado. Madri havia confiscado milhões de cédulas e milhares de urnas, e a polícia cortou o acesso à internet em diversos pontos para impedir o plebiscito.
Ativistas esconderam urnas durante a madrugada em igrejas. As caixas de plástico foram levadas aos locais de voto em carros particulares, sem alarde.
Como medida-surpresa, o governo catalão anunciou de manhã que aceitaria votos em qualquer colégio eleitoral, e não apenas naqueles onde os eleitores estivessem registrados. Era aceito também o voto sem envelopes.
As cenas de embate foram duramente criticadas por políticos, como Pablo Iglesias, do partido de esquerda Podemos.
“Porradas, empurrões, idosos arrastados. O que o Partido Popular está fazendo à nossa democracia me repugna. Corruptos, hipócritas, inúteis”, escreveu em uma rede social. Ele pediu a demissão do premiê conservador, Mariano Rajoy, do Partido Popular.
Fonte: Folha de São Paulo