Deputados aprovam texto que retira atenuantes da pena para jovens que cometerem crimes.
Estratégia é retomar protagonismo enquanto Planalto tenta ressuscitar reforma da Previdência
AFONSO BENITES
Em uma sessão confusa, em que durante alguns momentos dificilmente se sabia o que estava sendo votado, a Câmara dos Deputados iniciou nesta terça-feira a análise de um pacote de novas leis de segurança pública. Era uma tentativa de votar uma pauta “positiva” e com apelo popular para um país que registrou 61.619 mortes violentas no ano passado – é o maior número registrado no Brasil. A discussão veio como uma tentativa do Legislativo de mostrar que tem condições de ser protagonista, não ficando no esteio do Executivo. Também foi uma busca para retirar temporariamente o foco de uma iminente derrota do Governo Michel Temer (PMDB) na reforma da Previdência. Nesta semana, o presidente admitiu que essa mudança legislativa pode ser rejeitada pelo Congresso. O próprio peemedebista intensificou as conversas com os parlamentares para tentar salvar ao menos parte da principal proposta de seu Governo.
Além disso, a crise de segurança enfrentada pelo Rio de Janeiro acabou impulsionando os debates. A todo momento o nome do Estado era citado nos discursos dos parlamentares. De oito projetos pautados para essa terça-feira, dois foram aprovados e outros seis deverão ser votados até a próxima sexta-feira. Essas foram as propostas aprovadas quase que por unanimidade até agora: 1) as penitenciárias estaduais e federais serão obrigadas a instalar bloqueadores de sinal de telefones celulares; 2) não há mais atenuante de penas para os condenados que tenham entre 18 e 21 anos.
Com relação aos bloqueadores quase não houve debates. Todos os partidos sugeriram que seus membros votassem favoravelmente a esse projeto (número 3.019/2015). Se aprovado pelo Senado, as operadoras de telefonia de celular terão seis meses para instalarem os bloqueadores nas quase 1.500 penitenciárias brasileiras.
O mesmo consenso não houve na votação da proposta que tratava do fim dos atenuantes das penas. Pela atual legislação, têm direito a esse benefício os jovens entre 18 e 21 anos e os idosos com mais de 70 anos de idade. Ou seja, um delito cuja a pena prescreveria em dez anos, para essas pessoas, ele passaria a prescrever com cinco anos. O projeto de lei 2.862/2004 previa o fim da prescrição dos crimes para todos os cidadãos. Mas, após um acordo entre as lideranças partidárias, foi retirada a menção aos idosos e esse benefício só foi suspenso para os jovens. Ainda houve uma tentativa de se aprovar uma emenda para que essa idade fosse aumentada para 80 anos, mas os parlamentares rejeitaram essa sugestão.
Pelas regras atuais que foram mantidas, aos 70 anos, o prazo de prescrição nos inquéritos criminais cai pela metade e a pena é reduzida. O curioso é que boa parte dos denunciados por delitos nessa idade são os investigados por crimes de colarinho branco, muitos deles no próprio Congresso.
Debates e pacotão
No decorrer da tarde, enquanto a oposição tentava obstruir a votação, deputados da base governista se revezavam no microfone do plenário para dizer que, “as pessoas de bem” deveriam aprovar o pacotão da segurança pública. Boa parte deles, votou contra a investigação criminal de Michel Temer pelos delitos de corrupção, obstrução à Justiça e participação em organização criminosa. “Vocês [deputados] falam que os projetos são para defender o cidadão de bem. Mas quero fazer uma pergunta: Michel Temer é um cidadão de bem ou não?”, provocou no plenário, o oposicionista Glauber Braga (PSOL-RJ).
Para o deputado Miro Teixeira (REDE-RJ) a pressa em se aprovar medidas na área de seguraça pode passar uma sensação irreal aos cidadãos: “Espero que nesse momento não se transmita à população que com esses projetos se resolve o problema de segurança do país”.
Nos próximos dias, os deputados deverão analisar outros seis projetos nessa área. Os mais polêmicos são os que tratam dos autos de resistência, que é quando um policial mata um suspeito de um crime durante uma ação, e o que extingue o “saidão temporário”, que é quando os detentos do regime semiaberto têm o direito de deixar a prisão para visitarem suas famílias em feriados pré-determinados.
As outras propostas tratam do aumento de pena para quem cometer estupro coletivo, da tipificação de um delito para quem usa vítimas como “escudos humanos”, do fim com a progressão de pena para quem matar policiais e disciplina o uso de algemas.
Como houve um feriado na semana passada e haverá outro na próxima, os deputados governistas estão fazendo um esforço concentrado para limpar a pauta nesta semana e, até o fim do mês, recomeçarem as discussões sobre a reforma da Previdência. A reação negativa, incluindo dos investidores na Bolsa, a uma desistência do Governo a respeito do tema vai ser mais um incentivo para o Planalto tentar reanimar seus apoiadores. Resta saber se os congressistas vão abandonar a uma pauta com mais apelo junto ao eleitorado como a segurança para se imbricar na delicada discussão sobre mudanças na aposentadoria.
Fonte: El País