Na votação dos destaques, parlamentares também derrubaram emenda que impedia políticos e seus parentes de aderirem ao programa de repactuação de dívidas; projeto segue agora para o Senado
Igor Gadelha, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – Após dois meses de negociações, a Câmara dos Deputados concluiu na noite desta terça-feira, 3, em plenário, a análise da medida provisória (MP) que cria um novo Refis. Na votação, parlamentares aprovaram oito emendas alterando as regras de adesão ao programa. A matéria foi enviada para análise do Senado Federal, que precisa aprovar o texto e enviá-lo para sanção presidencial antes de 11 de outubro, quando a MP perde a validade.
As mudanças, se chanceladas pelo Senado e sancionadas pelo presidente Michel Temer, devem reduzir arrecadação do governo com o programa de parcelamento tributário. O líder do governo na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), afirmou que Temer deve vetar algumas dessas alterações. De acordo com o parlamentar paraibano, a maioria das emendas aprovadas contrariou acordo fechado entre Executivo e Legislativo sobre o texto da MP.
Os descontos nas multas e juros de mora que contribuintes terão de pagar continuam, por enquanto, como aprovado no texto-base. Para as multas, os descontos serão os seguintes: até 70% (à vista), 50% (145 meses) e 25% (175 meses). No caso dos juros, os descontos previstos são, respectivamente: 90%, 80% e 50%.
Um dos destaques aprovados foi o perdão de dívidas tributárias com a Receita Federal de igrejas, entidades religiosas e instituições de ensino vocacional sem fins lucrativos.
A remissão vale para débitos inscritos ou não na Dívida Ativa da União, inclusive aqueles objeto de parcelamentos anteriores ou que são alvo de discussão administrativa ou judicial. O perdão da dívida para as igrejas foi incluído pelo relator da MP do Refis, deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), durante a análise da proposta na comissão mista do Congresso.
O trecho, porém, foi retirado durante a votação do texto-base da MP no plenário da Câmara. Após a retirada, o deputado Marcos Soares (DEM-RJ) apresentou destaque para que o perdão fosse incluído no texto novamente. Soares é filho do pastor R.R. Soares, líder da Igreja Internacional da Graça de Deus.
O relator da MP do Refis afirmou que o perdão da dívida “corrige” um erro. Segundo ele, essas entidades já seriam imunes à tributação e, por isso, não deveriam ser cobradas. Cardoso Júnior disse que muitas igrejas e instituições já questionam na Justiça a cobrança de dívidas como essas, a maioria delas referentes a Previdência Social de seus funcionários.
Suspeitos de corrupção. Os parlamentares também aprovaram destaque para suprimir da MP do novo Refis trecho que, na prática, permitia a suspeitos de corrupção parcelarem e terem descontos ao devolverem à União dinheiro desviado dos cofres públicos. O trecho foi incluído durante a análise da proposta em uma comissão mista do Congresso, mas acabou retirado nesta terça-feira no plenário da Câmara após a imprensa divulgar a brecha.
No primeiro artigo da MP, que prevê a criação do programa, parlamentares haviam incluído a permissão para contribuintes parcelarem dívidas com a Procuradoria-Geral da União (PGU). Na avaliação de procuradores, isso permite que suspeitos de corrupção possam usufruir dos descontos em multas e juros.
Parentes de políticos. Durante a votação, deputados rejeitaram, por 205 votos a 164, emenda que visava proibir políticos, funcionários públicos e suas empresas de aderirem ao Refis. Com a rejeição, eles poderão aderir ao programa para parcelarem suas dívidas tributárias e previdenciárias, assim como seus cônjuges, parentes até segundo grau e sócios. Na primeira versão do programa, no primeiro semestre deste ano, esse público não pôde aderir ao Refis.
A emenda chegou a ser rejeitada de forma simbólica, mas deputados do PSOL, PSB e PV pediram votação nominal. Orientaram voto contra a emenda e, consequentemente, contra a proibição os seguintes partidos: PMDB, PP, PSDB, PSD, PR, DEM, PRB, PDT, Solidariedade, PSC, PPS, PEN. A liderança do governo também se posicionou contra a emenda. “Daqui a pouco só em ser político já vai ser crime”, disse Aguinaldo Ribeiro..
Em julho, o Estadão/Broadcast mostrou que deputados e senadores deviam naquele mês R$ 532,9 milhões à União, de acordo com dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O valor inclui dívidas inscritas nos CPFs dos parlamentares, débitos nos quais eles são corresponsáveis ou fiadores e o endividamento de empresas das quais são sócios ou diretores.
Os R$ 532,9 milhões em dívida dos parlamentares consideram apenas as dívidas em aberto, ou seja, o endividamento classificado como “irregular” pela PGFN. Isso porque deputados e senadores já foram beneficiados por parcelamentos passados. O total de débitos ligados aos parlamentares inscritos em Refis anteriores – ou seja, que estão sendo pagos e se encontram em situação “regular” – é de R$ 299 milhões.
Simples Nacional e Carf. Deputados também aprovaram emenda para permitir que empresas que participam do Simples Nacional possam aderir ao Refis. O líder do governo disse, contudo, que a medida é inconstitucional e, por isso, deve ser vetada. Isso porque o Simples é um regime tributário simplificado para micro e pequenas empresas que permite recolhimento de todos os tributos federais, estaduais e municipais em uma única guia e que tem um regime específico para parcelamento de dívidas.
Outro destaque aprovado acabou com o chamado “voto de qualidade” no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Atualmente, quando há empate nos julgamentos do Carf, o voto de desempate deve ser do presidente da turma em que o caso está sendo julgado. Esse representanteé indicado pelo Ministério da Fazenda. Com a proposta aprovada pela Câmara, em caso de empate, a decisão deverá ser sempre favorável ao contribuinte.
Isenção de honorários advocatícios. Além disso, parlamentares aprovaram durante a sessão destaque que isenta os contribuintes que aderirem ao Refis do pagamento de encargos legais e honorários advocatícios. O texto-base da MP que criou o programa previa apenas desconto de 25% nos valores dos encargos e honorários que deverão ser pagos.
A emenda foi aprovada em votação simbólica. Com isso, contribuintes terão desconto de 100% nos encargos e honorários advocatícios nas três formas de pagamento das dívidas: à vista e parcelado em 145 meses e 175 meses. O aumento do desconto tem objetivo de atingir procuradores, que recebem parte da arrecadação do governo com esses encargos e honorários.
Fonte: Estadão