Índios da América Latina não se sentem representados pela atuação dos seus respectivos governantes na Conferência do Clima da ONU.
“Os governos do mundo deveriam estar aqui ouvindo os povos indígenas do mundo. Então, isso não é do interesse deles”, afirma Rosimeire Teles, da etnia Arapaso, e coordenadora da Associação das Mulheres do Alto Rio Negro, no Amazonas. A indígena faz referência ao Pavilhão da População Indígena localizado na Conferência Mundial de Mudanças Climáticas da ONU (COP 22), que encerra nesta sexta-feira (18) em Marrakesh, no Marrocos.
Diversos povos indígenas do mundo estão reunidos para debater, junto ao público, diversas pautas importantes, como a questão da terra, da agricultura e de gênero. Uma oportunidade para alertar o mundo sobre essa realidade pouco divulgada.
Há diversas fotos de povos espalhados pelo mundo no espaço. A decoração é sustentável, assim como no resto do espaço, um chão de grama sintética, cadeiras de palhas. Algumas mulheres indígenas vendem artesanato e outros produtos nativos.
Para o líder indígena do povo Ashaninka, Héctor Martín Manchi, do Peru, o pavilhão tem como objetivo criar consciência entre os empresários, os governos e os grandes países para que compreendam que os povos originários do mundo são vulneráveis às mudanças climáticas que estão acontecendo.
As lideranças indígenas participam das negociações na COP 22, mas não enxergam uma efetividade partindo dos governantes de seus respectivos países. Héctor diz que no Peru não existe nenhum representante dos povos originários dentro da política.
Rosimeire Teles alerta que no Brasil as hidrelétricas, as estradas e os grandes projetos nos parques indígenas e a aprovação da PEC 215 – que transfere do Executivo para o Legislativo o poder sobre a demarcação de terras indígenas – são os grandes obstáculos para os indígenas do Brasil.
“Mas o que, de fato, nós povos indígenas, que somos os guardiões da floresta, ganhamos? Praticamente nada. São essas coisas que o governo atual não tem a preocupação, tanto que em Brasília está tendo uma mobilização desde que o Presidente Michel Temer assumiu, e nós indígenas estamos lá”, comenta Rosimeire, que nasceu em uma comunidade indígena do município de São Gabriel da Cachoeira, no extremo norte do estado do Amazonas, no Alto Rio Negro.
A questão financeira causa outro embate cultural entre os governantes e a população indígena. Bartolo Alejando Ushigua, líder da comunidade indígena Zápara, no Equador, afirma que o dinheiro não vai salvar a população, porque não tem vida. Ele diz que dinheiro é somente um papel, não tem espírito. Em sua ótica, a terra, a lua, o sol e o ar são os responsáveis para o equilíbrio do mundo.
“O país não precisa de dinheiro, necessita controlar a corrupção, que não é problema da selva e do petróleo, é problema de quem administra esses recursos”, conta Ushigua.
Rosimeire Teles avalia que os governantes não estão preocupados em procurar um crescimento econômico sustentável dentro das terras dos povos tradicionais e com as populações ribeirinhas e quilombolas. E que o olhar do Brasil está muito focado na economia internacional. Ela destaca que a relação dos indígenas com a terra, na visão de ambos, é diferente, pois os indígenas mantêm uma conexão espiritual e de proteção à natureza.
Entre os aliados dos indígenas estão ambientalistas, indigenistas e pesquisadores das mudanças climáticas. Eles ajudaram na elaboração da programação do pavilhão.
A diretora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ane Alencar, afirma que os indígenas estão sendo reconhecidos na Convenção da COP 22, mas acredita que o papel deles como agentes que contribuem com a diminuição dos impactos ambientais ainda é pouco reconhecido – ainda mais por serem as principais vítimas das mudanças climáticas.
O papel do Ipam, de acordo com Ane, tem sido de apoio e de empoderamento das lideranças indígenas, com dados e informações tanto sobre o efeito dessas mudanças no clima como também sobre a segurança alimentar e a conservação da natureza e a vida de quem protege a natureza.
Em diversas mesas que acontecem diariamente, muitos indígenas afirmam solidariedade para com todas as comunidades nativas do mundo. Bartolo do Equador afirma que o pavilhão indígena é uma oportunidade para se criar uma rede de organização indígena, onde todos os povos presentes trocam experiências e discutem pautas importantes.
“Todos os povos originários do mundo estão lutando para conseguir os seus direitos. Não somos agricultores, somos povos originários e de autonomia própria”, afirma Ane Alencar.
Felipe Sakamoto é aluno do 2º. Ano da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero e participa do Projeto Cásper na COP 22, que é a cobertura da Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas (ONU) sobre as Mudanças Climáticas no Marrocos. O projeto, que tem a parceria de 15 veículos jornalísticos do Brasil, entre eles, a agência Amazônia Real, visa inserir os estudantes na prática internacional de comunicação e jornalismo envolvendo questões de cunho ambiental e humanitário. Apoiam o projeto a Fundação Cásper Líbero, a Air Royal Maroc e a JHL Agência de Turismo. Conheça o projeto aqui.
Por: Felipe Sakamoto
Fonte: Amazônia Real