A revolução cubana, Fidel Castro, Ernesto Che Guevara e Sierra Maestra sempre incendiaram o romantismo revolucionário no Brasil. O auge dessa paixão foi a tentativa de reproduzir a experiência cubana aqui. Ela nos chegou no livro de Regis Debray “Revolução na revolução’’. A experiência foi um fracasso, mas não se pode atribui-lo apenas às teses de Debray.
Muitos grupos revolucionários brasileiros passaram por Cuba, tentando aprender in loco os segredos daquele êxito. O romantismo revolucionário continuou sendo a lente preferencial para o enfoque da experiência cubana. O próprio Sartre olhou por essa lente em “Furacão sobre Cuba’’.
Os intelectuais europeus já tinham vivido experiência semelhante ao mitificar Stalin e demorar a reconhecer seus crimes. Talvez por isso, o romantismo revolucionário lá tenha sido mais brando. No Brasil, nos privou de ver em detalhes o que se passava em Cuba. “Antes que anoiteça’’, do poeta Reinaldo Arenas, nos deu uma ideia de como uma geração de intelectuais foi destruída pela repressão.
O papel histórico de Fidel era mais amplo do que o julgamento de intelectuais. A Revolução Cubana equacionou os problemas de saúde e educação de uma forma que impressionava os visitantes. Além disso, com sua resiliência à pressão americana, sobrevivente de centenas de tentativas de assassinato, vitorioso ao repelir a invasão da Baía dos Porcos, Fidel tornou-se um ator planetário ao trazer a Guerra Fria para poucas milhas dos Estados Unidos.
E disso me lembro também: a Crise dos Mísseis de 1962. Ali estava em jogo a História da Humanidade, uma possível terceira guerra mundial. A crise num pequeno país do Caribe poderia mandar para o espaço todo o planeta — momento em que o mundo esteva fixado em Cuba. Rússia e os EUA resolveram, mas a ilha foi o cenário de um quase apocalipse.
Fidel era um excelente orador. Falava horas e ouvi alguns dos seus discursos. No fundo da plateia, as pessoas dançavam e cantavam. Ele apresentava a conjuntura internacional, descrevia o estado do país, definia as tarefas prioritárias, combatia os Estados Unidos, fazia uma digressão histórica, enfim, dizia o que realizar e como resistir.
Tantas mortes, tanto exílio, tanta tortura, os fuzilamentos inaugurais da revolução, tudo isso valeu a pena? Olhando para o lado, para a Costa Rica, os românticos teriam um tema para refletir.
Artigo publicado no Jornal O Globo em 27/11/2016