Por José Luiz Penna
Presidente Nacional do Partido Verde
Tenho participado de discussões e acompanhado de perto as análises políticas depois do cataclisma que foram as eleições de outubro. Em geral, o clima é de rescaldo: a busca por um caminho que refaça o sistema político-partidário. Refiro-me a quem tem a responsabilidade de promover uma revisão crítica do processo. Porque há setores da esquerda que preferem a política do avestruz, como se nada tivessem a ver com isso.
Mas o que chama atenção no que tenho lido é a derrota ser creditada à falência dos partidos. Acho que é um erro. A insolvência partidária é consequência, não causa do esvaziamento da política. A descaracterização e corrompimento de suas instâncias derivam da ação de um poder central, absolutista, vocacionado para cooptar como princípio de governabilidade.
Em nome dela os governos que se sucederam nos últimos vinte e quatro anos engalfinharam-se em uma luta pelo poder sem fim. Pra isso, multiplicaram o número de siglas à sua conveniência, fragmentaram e compraram bancadas congressuais para conquistar maioria, atuaram no atacado e no varejo parlamentar. Esse é o desenho do presidencialismo de coalizão, que tem imperado em nossa democracia recente. E o cenário ideal para fazer qualquer democracia ir para o ralo.
O fato é que a social democracia brasileira não conseguiu nesse período reverter nossa condição de estado excludente. Embrenhou-se num socialismo populista e não conseguiu responder às necessidades básicas do país. A desigualdade é crônica. Mais de quinze milhões de pessoas ainda vivem em condição de extrema pobreza. O apartheid se ampliou, com a marginalização crescente das minorias étnicas. O estado corrompido mostrou-se incapaz de prover saúde, educação e acabou acuado na segurança. Junte-se a isso o sentimento de faca nos dentes da classe média desaguamos na era bolsonarista.
Hoje, constatamos a negação do que seja uma democracia representativa. Estigmatizados, os partidos foram marginalizados na composição do novo governo e as alianças, seladas com bancadas setoriais, com destaque para o trio: bala, bíblia e boi, que já impõem seus interesses corporativos na definição das políticas governamentais.
O que vem pela frente ainda é uma incógnita. Mas temos sinais de retrocesso em várias frentes, como no meio ambiente, na cultura, na educação e nas relações exteriores, com o anúncio de diretrizes marcadas por um ranço fundamentalista e isolacionista.
Restaurar o sistema representativo e refazer o pacto social vão demandar sangue, suor e estratégia. Acho que a primeira coisa é fortalecer os partidos, fazendo com que eles readquiram organicidade e ação programática. E a partir daí caminhar em direção ao parlamentarismo, quebrando esse modelo presidencialista de cooptação. É isso ou, ao contrário do que vendem, vamos continuar reféns das práticas fisiológicas. Agora, com novos inquilinos no Planalto.