O Ministério da Saúde decidiu abolir o uso do termo “violência obstétrica” e afirmou, em um despacho divulgado na sexta-feira (3), que “estratégias têm sido fortalecidas” para que a expressão pare de ser usada pelo órgão.
A explicação, segundo o documento, é de que o termo é inadequado por que “tanto o profissional de saúde quanto os de outras áreas não têm a intencionalidade de prejudicar ou causar dano.”
O termo se refere a uma série de procedimentos considerados violentos, praticados durante o parto por parte de profissionais da saúde. Por exemplo: cesáreas feitas sem necessidade ou consentimento da parturiente e o corte entre a vagina e o ânus, para aumentar o canal de parto, chamado de episiotomia (cuja necessidade é discutida).
“Mulher ficará mais vulnerável”, diz especialista
Para organizações que estudam e combatem a violência obstétrica, a normativa pode deixar mulheres mais vulneráveis. “Essa discussão fez muitos médicos repensarem procedimentos para não serem processados. Agora, pode ser que esses profissionais pensem que não haverá punição por violência obstétrica”, afirma a obstetra Débora Rosa, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e especialista em parto humanizado e ginecologia natural.
Além disso, a postura do ministério pode criar um obstáculo para processos em andamento, dificultando, talvez, a identificação de crimes. “A mulher corre o risco de processar um hospital público por episiotomia, por exemplo, mas o juiz não considerar violência obstétrica já que o termo, para o ministério, nem existe”, afirma a advogada Ruth Rodrigues, da ONG Nascer Direito, que escreveu uma nota de repúdio ao despacho.
“Termo é usado no mundo todo”, diz advogada
Ruth afirma que, com esse posicionamento, o governo brasileiro está negando uma discussão mundialmente reconhecida. “Legislações e pesquisas internacionais se debruçam sobre o assunto usando o termo. A própria OMS (Organização Mundial da Saúde) fala disso e cria campanhas contra práticas abusivas. Estamos indo contra uma corrente global.”
Daphne Rattner, que é presidente do Rehuna (Rede pela Humanização do Parto e Nascimento), espera que a decisão seja reconsiderada. “O Ministério Público Federal usa esse termo, a Câmara e o Senado também. Não faz sentido o Ministério da Saúde não usá-lo”, diz ela. “Espero que o órgão retome sua vocação de trabalhar pela humanização, no hospital, no parto, no nascimento, no ensino de obstetrícia…”
O que diz o Ministério da Saúde
A reportagem entrou em contato com o Ministério da Saúde para saber detalhes sobre o despacho e como, efetivamente, ele vai impactar as políticas públicas da entidade. O órgão respondeu, em nota, afirmando que o despacho atendeu “apelo de entidades médicas” e que é uma orientação para que o termo não seja “usado de maneira indiscriminada, principalmente se associado a procedimentos técnicos indispensáveis para resolução urgente de situações críticas à vida do binômio mãe-bebê relacionados ao momento do parto”.
Fonte: UOL