Como se não bastasse o PL do Veneno pra nos assombrar – ele ainda tramita no Congresso e aguarda data para votação no Plenário -, ainda há outros que também visam apenas interesses de deputados ruralistas (sempre eles!!) e empresários inescrupulosos, em detrimento dos brasileiros e da natureza. Um deles é o PL 6268/2016 – projeto de lei de autoria do deputado Valdir Colatto (MDB-SC) -, que propõe alterações na Política Nacional de Fauna. O texto, na íntegra, está neste link.
Entre as propostas deste senhor, estão: permitir o abate de animais silvestres em todo território nacional, inclusive em Unidades de Conservação (UCs) e a criação de campos de caça esportiva e comercial (!!), o que pode provocar a extinção de espécies, como já aconteceu em países da África e da América do Norte. Mas ele não para por aí: ao mesmo tempo que quer proibir o porte de armas por fiscais ambientais, propõe flexibilizar sua posse por proprietários de áreas rurais.
Em resumo, esse PL não só representa riscos inimagináveis ao meio ambiente como também às pessoas e deve ser combatido de forma veemente. E é isso que vêm fazendo organizações, pesquisadores, deputados defensores dos animais e outros representantes da sociedade civil.
Na semana passada, 3/7, em encontro realizado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados (Cmads) – sim, a mesma que aprovou, a portas fechadas (sem ouvir a sociedade e instituições científicas) -, representantes do WWF-Brasil (ONG que acompanhou tudo e publicou os detalhes em seu site), do Ibama, ICMBio, de universidades, além de deputados contrários ao projeto, debateram-no com o autor e seus defensores.
Lá, Rafael Giovanelli, advogado do WWF-Brasil, resumiu bem porque esse PL não pode ser aprovado: “Há uma série de critérios para se saber se um projeto pode se tornar uma boa lei. Um deles é a representatividade. Outro é a constitucionalidade. Esse projeto não representa o desejo da população, que já se manifestou, inclusive em pesquisa realizada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), amplamente contrária à caça. Tampouco está de acordo com a Constituição Federal, que, em seu Artigo 225, estabelece que incumbe ao poder público proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.
Mas o autor do projeto deixou claro, durante a sessão, que não se importa em ouvir a sociedade, ressaltando que a bancada ruralista é maioria na Comissão e o PL vai ser aprovado. É assim que esses deputados seguem propondo e aprovando leis no país: sem ouvir a sociedade que os elegeu.
As argumentações são muito variadas, mas não faltam provas de que o PL é um absurdo. E muita gente interessante e bem preparada contra.
O pesquisador Rômulo Ribon, da Universidade Federal de Viçosa, por exemplo, defendeu o PL por considerar que a proibição da caça impede que proprietários tenham mais alternativas econômicas, além de destruir oportunidades de emprego, prejudicando a economia. Mas falou sem usar nenhum estudo científico como base. Por outro lado, com base em pesquisas, Michel Santos, coordenador de Políticas Públicas do WWF, rebateu essa ideia dizendo que existem muitas alternativas econômicas sustentáveis e que não é preciso caçar animas silvestres. Basta promover turismo de observação. Pois é… só não vê quem não quer.
Rogério Cunha de Paula, coordenador de Programas do ICMBio, complementou esse raciocínio ao salientar que a caça não ajuda a diminuir a pobreza, como provam as comunidades pobres da África, “porque o dinheiro nunca chega a elas”. E ainda lembrou que, em geral, o caçador mata o animal que está disponível e não aquele que está autorizado. “Nas reservas de caça na África, as pessoas vão para caçar elefantes e caçam rinocerontes”.
Pois é… a ilegalidade já é praticada. Precisamos combatê-la, não legalizá-la. Como disse o coordenador de Operações de Fiscalização do Ibama, Roberto Cabral, ao site do WWF Brasil: “Não se acaba com o roubo e o assassinato tornando isso legal”. E a promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Vânia Tuglio, completou o pensamento de Cabral. “O projeto muda a natureza jurídica dos animais silvestres, permitindo que qualquer um faça o que bem entender com qualquer animal e nada vai acontecer”. E acrescentou: “Se esse projeto virar lei, significa que, na prática, todos os processos criminais (contra a fauna) em curso serão arquivados, todas as condenações serão revogadas, todos os inquéritos serão arquivados, todas as sanções administrativas serão arquivadas, todas as munições serão devolvidas aos caçadores”. É sério demais. A impunidade premiada.
Líderes ambientalistas em perigo, também
Como costumam fazer os deputados da bancada ruralista, quando defendem seus projetos e o de seus parceiros, o deputado Colatto negou que o objetivo maior do seu PL seja liberar a caça: “Se houver um artigo nesse sentido, eu retiro”.
Ué, como assim? Todos que analisaram o projeto – e são contra – entendem assim: organizações ambientalistas, vereadores, parte dos deputados, técnicos de instituições como o ICMBio, Ibama, MMA e Ministérios Públicos estaduais. Segundo o site do WWF, até a Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe) é contra o PL de Colatto.
No encontro da semana passada, na reunião da Comissão, o deputado Nilto Tatto (PT-SP) explicou bem: “Conceitualmente, esse projeto coloca a biodiversidade como propriedade do caçador; coloca a natureza a serviço do homem; coloca os animais como propriedade do homem. Assim era a legislação até 1967, que tratava os animais como propriedade daquele que os visse primeiro. Então, esse projeto é um atraso”. E ironizou: “Esse projeto propõe que o fiscal entre na mata para coibir a caça ilegal com uma caneta e um caderninho para enfrentar os caçadores. Ao mesmo tempo, permite que os fazendeiros se armem. No ano passado, batemos o recorde de assassinatos no campo, e a tendência é matar ainda mais lideranças. Vão caçar aqueles que lutam por direitos”.
Tatto ainda lembrou que o autor do PL da Caça pertence à bancada que quer a criminalização dos movimentos sociais e seu enquadramento como organizações terroristas. Por aí, é possível compreender bem seus objetivos.
Este PL é um retrocesso, sem dúvida, como muitos que estão acontecendo neste país, principalmente nos dois últimos anos. Por isso, é importantíssimo que a sociedade participe deste debate também. Ainda está previsto mais um debate na Comissão. Se aprovado, o PL seguirá para o Plenário para votação final. Ele não pode chegar lá!
Como em todas as páginas de projetos de lei no site da Câmara dos Deputados, o PL 6268/2016 tem CONSULTA PÚBLICA disponível para que todos possam votar. Se você é contra, vá lá e vote DISCORDO. E espalhe em suas redes sociais.
Fontes: ICMBio, Ibama, Ministério do Meio Ambiente e WWF-Brasil
Foto: Wilfredorrh/Flickr
Via: Conexão Planeta