O deputado Sarney Filho (PV-MA), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, participou, nesta terça-feira (27), do seminário Usinas Nucleares – lições da experiência mundial, realizado pelo Senado Federal. O líder verde abriu o evento com um pronunciamento sobre a exploração da energia nuclear no Brasil e no mundo. Segundo ele, a ideia de que a energia nuclear é limpa e segura é completamente falsa.
“Em tempos de mudanças climáticas, a usina nuclear é uma falsa solução para evitar o aquecimento global. É que, como os reatores não emitem gás carbônico, o principal dos gases de efeito estufa, os defensores dessa energia tentam convencer a sociedade de que ela é limpa e segura. Mas ela não é limpa, pois o ciclo de produção de seu combustível apresenta importantes emissões de gases de efeito estufa. E, obviamente, ela tampouco é segura, em vista dos graves acidentes já registrados em vários países”, explicou Sarney Filho.
Ele discorreu sobre o sério problema dos rejeitos nucleares, que não contam com lugar apropriado para confinamento em nenhuma parte do mundo. “Nenhum país conseguiu até hoje equacionar definitivamente o problema da destinação dos resíduos perigosos, altamente radioativos, produzidos pelas reações nucleares, acumulando-os, em geral, nas próprias usinas, como em Angra I e II. Esses resíduos continuam ativos por milhares de anos, criando também um problema ético, pois a geração presente se beneficia dos serviços prestados pela eletricidade, mas acaba legando às gerações futuras os resíduos radioativos”, disse.
Sarney Filho lembrou a contaminação decorrente da extração de urânio em Caetité, na Bahia, problema que foi tema de audiência pública realizada a seu pedido pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, há uma semana. O município de Caetité abriga a única mina atualmente em operação no Brasil. Recentemente, pela primeira vez em quinze anos de atividade no semiárido baiano, as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) admitiram a contaminação da água de um poço local.
Evocando o acidente nuclear ocorrido em Fukushima, no Japão, em 2011, o deputado chamou atenção para a situação de insegurança das usinas Angra I, II e III. Segundo ele, “as usinas estão situadas numa região da Baía de Itaorna, que quer dizer pedra podre, pedra precária, em tupi-guarani. A região está cercada de montanhas onde, desde o século XIX, há ocorrências de deslizamentos. Portanto, a região está suscetível a um tsunami de terra, que pode inviabilizar a possibilidade de evacuação de pessoas se houver um acidente, ou uma tragédia maior ainda”.
A mesa de abertura foi completada pelos senadores Cristovam Buarque e Hélio José, presidente e vice-presidente, respectivamente, da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) do Senado. Hélio José destacou a importância do seminário para o aprofundamento da discussão sobre energia nuclear. “Uma a cada três palavras que falo aqui no Senado é sobre energia renovável”, garantiu, “não tenho dúvida de que em breve, com a abertura do mercado, estaremos à frente na exploração da energia solar”.
O senador Cristovam Buarque, promotor do evento, é autor de um projeto de lei (PLS 405/2011) que suspende, pelo prazo de 30 anos, a construção de novas usinas termonucleares no país. Para ele, a importância do seminário, que conta com convidados de cinco países, é a possibilidade de aprender com as experiências ao redor do mundo. “Qualquer acidente em usina nuclear é fatal. Foi o que aconteceu em Chernobyl e em Fukushima. Por isso, o seminário conta com a presença de personalidades que acompanharam de perto as tragédias nucleares recentemente e poderão falar melhor sobre o assunto”, explicou.
A segunda mesa, Os desafios da opção nuclear para a produção de eletricidade, foi iniciada com a apresentação de um vídeo com mensagem enviada por um protagonista do acidente de Fukushima, o japonês Naoto Kan, primeiro ministro do Japão à época. Kan rememorou o acidente, ocorrido no dia 11 de março de 2011, quando o combustível de Fukushima vazou em decorrência de um forte terremoto, seguido de violento tsunami. A área tem onze usinas nucleares. “Se o acidente atingisse as onze usinas, o Japão não existiria mais”, afirmou.
O ex-primeiro ministro contou que antes do acidente acreditava que nada poderia acontecer, pois a tecnologia iria manter o Japão seguro, mas o que aconteceu em Fukushima tornou-o forte opositor da utilização da energia nuclear. “Se um acidente nuclear pode ter uma consequência positiva, essa deve ser que não se utilize mais usinas nucleares”, disse. Kan lamentou que, após um período inicial marcado por protestos contrários, o apoio no Japão a essa fonte energética está, hoje, mais forte do que nunca.
As falas da subprocuradora geral da República Sandra Cureau, do professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro e ex-presidente da Eletrobras Luiz Pinguelli Rosa e de Francisco Whitaker, membro da Comissão Brasileira Justiça e Paz, desenvolveram a discussão da segunda mesa.
A subprocuradora, autora de um livro que trata, entre outros temas, de poluição, deu destaque especial à questão dos rejeitos radioativos. “É difícil dar-lhes uma destinação segura”, disse. Ela comentou a insegurança das usinas brasileiras, em especial Angra II, e explicou os estudos e avaliações técnicas que o Ministério Público Federal (MPF) vem realizando a esse respeito. Sandra afirmou que o MPF é muito atuante na área, mas encontra forte resistência dos setores que têm interesse na energia nuclear para levar adiante suas ações.
O professor Pinguelli Rosa, doutor em física, contou os primórdios da discussão sobre energia nuclear no país. Segundo ele, desde o governo Giesel, quando foi firmado o grande acordo de colaboração entre Brasil e Alemanha, a comunidade científica, encabeçada pelos físicos da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência, levantou o debate de forma bastante crítica.
“Os reatores brasileiros, tanto de Angra I, quanto de Angra II tiveram problemas de toda ordem”, informou. “Um laboratório inteiro já foi parar no oceano, devido a um deslizamento”, relatou, comentando o risco de desmoronamentos, foco de preocupação dos demais palestrantes. Para Pinguelli Rosa, a questão do aquecimento global mudou a visão sobre a energia nuclear, que passou a ser vista como forma de evitar os gases do efeito estufa.
“Quanto à questão nuclear, nossa sociedade é uma expectadora”, disse Francisco Whitaker, dizendo que o povo assiste de longe aos interesses dos setores político, econômico e científico. “A ela é dito: não se preocupe, tudo isso é necessário. Mas a sociedade não consegue nem mesmo sentir os bilhões que são gastos nas usinas nucleares”, completou. O ativista social esteve pessoalmente em Fukushima e contou que o tsunami matou 19 pessoas, mas, um ano depois de sua visita, 100 desalojados haviam se suicidado. “São situações assustadoras e preocupantes. Faço votos de que um seminário como este nos ajude a acordar e acordar mais gente”, concluiu.
O seminário prossegue nesta quarta-feira (28), com especialistas, cientistas e autoridades da área do Brasil e de cinco países.
Fonte: Comunicação Lid-PV