A Frente Parlamentar Ambientalista reuniu-se nesta quarta-feira (25) para discutir o desmatamento da Amazônia. O debate, presidido pelo coordenador da Frente e líder do Partido Verde, deputado Sarney Filho (PV-MA), além de avaliar os sucessos e fracassos das medidas governamentais de combate ao desmatamento, serviu à apresentação de propostas para que o Congresso Nacional possa atuar no direcionamento do País rumo ao desmatamento zero.
Sarney Filho abriu o debate mostrando a correlação entre a crise hídrica e o desmatamento da Floresta Amazônica. Afirmou que “a crise água é como um desastre aéreo, não tem uma causa única”, indicado como fatores adicionais do problema as mudanças climáticas e a má gestão. Ele comemorou o fato de que, hoje, todos reconhecem que a carência do recurso natural mais elementar para a vida decorre, diretamente, da derrubada da cobertura vegetal: “quando falava disso, anos atrás, me olhavam como se fosse louco. Atualmente, todos reconhecem que o desmatamento da Amazônia repercute no regime de águas de outras regiões”.
Paulo Barreto, pesquisador sênior do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), afirmou que “tem aumentado o conhecimento de que é possível ter crescimento agropecuário sem desmatar”. Ele explicou que, de modo geral, as áreas desmatadas são mal utilizadas e que se pode melhorar muito a produtividade com as tecnologias que já estão disponíveis. Destacou como medida bem sucedida contra o desmatamento o aumento no número de unidades de conservação, e alertou para o fato de que, nos últimos anos, há um movimento contrário, para restringi-las. Segundo ele, na área de controle e fiscalização a mudança foi a prática do confisco de bens de quem ocupava irregularmente áreas de proteção. Tal medida, no entanto, limitou-se a casos isolados. Houve, ainda, mais multas, mas com resultados pouco efetivos.
O representante do Imazon lembrou que o desmatamento e, em especial, as queimadas são responsáveis por imensa quantidade de emissão de gases na atmosfera. Barreto defendeu alguns pontos que se bem executados, acredita, conduziriam o Brasil a uma situação de desmatamento zero: destinação de 2% dos fundos de participação dos estados e municípios conforme a distribuição de áreas protegidas; rejeição, por parte do Congresso, de medidas do Executivo que reduzem áreas de unidades de conservação (procedimento que vem sendo, embora de maneira indevida, praticado via medidas provisórias); melhoria da arrecadação das multas – hoje, apenas uma parcela mínima das multas são, de fato, arrecadadas. De acordo com cálculos do pesquisador, com apenas 10% da arrecadação, seria possível a regularização fundiária de todas as unidades de conservação federais da Amazônia; e arrecadação de Imposto Territorial Rural (ITR) contra o desmatamento especulativo, cuja cobrança, se feita corretamente, serviria como grande desestímulo ao desmatamento. Ao final de sua fala, Paulo fez a observação de que grande parte de sua explanação aplica-se também ao Cerrado.
Procurador da República no Distrito Federal, o Dr. Anselmo Henrique Cordeiro analisou as estratégias preventivas e repressivas de combate ao desmatamento sob o prisma da atuação do Ministério Público Federal (MPF). Ele avaliou que“o sistema de multas não tem sido efetivo e os embargos não têm funcionado”. Como medida preventiva, o MPF criou o programa Carne Ilegal, visando impedir o desmatamento para produção de gado de corte. Vem ocorrendo, no entanto, o que o procurador denominou “aquecimento” da carne ilegal, isto é, o envio do gado para outras áreas, após a engorda, para comercializá-lo a partir dali. “Também tentamos combater a grilagem com operações, mas elas são pouco efetivas, pois as penas são muito baixas. As pessoas, mesmo condenadas, não vão presas”, completou. O procurador criticou ainda a falta de rigor na aprovação e na fiscalização da implantação dos planos de manejo e o sistema de certificação de madeira legal que, segundo ele, não está funcionando e deve ser aperfeiçoado.
Para o Dr. Anselmo Cordeiro, deve-se privilegiar as medidas preventivas: “Acho que não podemos abandonar a estratégia repressiva, mas devemos fortalecer tanto a Amazônia, quanto o Cerrado, cuja área desmatada é muito extensa”. Ele relatou que o Ministério Público constata que “as áreas onde há comunidades tradicionais, mesmo não demarcadas, são mais bem protegidas do que as demais” e continuou: “me parece lógico que essas comunidades devem ser empoderadas”. No âmbito do Congresso Nacional, defendeu a reapresentação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que foi arquivada, a qual determina que todos os tributos levem em consideração o critério de preservação ambiental.
Representando a Iniciativa Amazônia Viva, do WWF-Brasil, Cláudio Maretti levantou a importância de discutir o caso brasileiro dentro da perspectiva da Panamazônia, já que o bioma ocorre em outros oito países, além do Brasil. Ele explicou que o regime de chuvas de toda a região conhecida como “o quadrilátero da sorte, que vai de Cuiabá a Buenos Aires, depende da Amazônia saudável”. De acordo com os dados apresentados, os 60% de área do Brasil desmatam menos do que os outros 40%, especialmente na Amazônia boliviana e peruana. Há hoje, segundo Maretti, várias frentes de desmatamento, devidas a diversas causa, com destaque para a exploração de petróleo, a mineração e a agropecuária.
O WWF vai publicar os dez piores casos de desmatamento atualmente no mundo, dos quais dois estão no Brasil, a Amazônia e o Cerrado. O representante do grupo comentou que, mesmo com a redução de 70%, o país ainda é o segundo do mundo em desmatamento. “É preciso dizer que só lidamos com a parte fácil do desmatamento, já que as medidas de fiscalização têm se mostrado ineficazes”, argumentou Maretti, que criticou também a abertura de novas frentes de atração nos países da Amazônia, como a construção de estradas e, sobretudo, no caso do Brasil, hidrelétricas. O ambientalista recomendou que a Frente passe a olhar as relações internacionais, pois “para manter a Amazônia viva, temos que encará-la como um ambiente integrado”.
Márcio Astrini, coordenador da Campanha da Amazônia, do Greenpeace Brasil, iniciou sua participação citando a frase de um relatório da Embrapa de 2014, que, a respeito da necessidade de crescimento do setor produtivo no campo, avalia que “a expansão pode ser feita na área de agropecuária”. Astrini foi enfático em afirmar que o desmatamento não só é desnecessário, como é ruim: “não tem mais razão de ser por necessidade de terra, não tem mais razão de ser socialmente, e é um risco econômico para o país”. Ele avaliou o cenário atual como favorável ao trabalho de combate ao desmatamento, com a possibilidade de aproveitar do momento de crise hídrica e perspectiva de crise energética para “inflamarmos o debate”.
O deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA) disse que mesmo com os avanços constatados, “não podemos ficar numa zona de conforto, ainda vivemos uma situação muito, muito grave”. Ele destacou a dificuldade dos estados e municípios em arcar financeiramente com as responsabilidades que lhes foram legalmente repassadas. Comentou ainda que considera o orçamento do Ministério do Meio Ambiente simbólico, para o nível de desafios que enfrenta. “Temos que discutir quem paga a conta”, provocou o parlamentar.
O evento da Frente Ambientalista contou com a colaboração de entidades tais como WWF-Brasil, SOS Mata Atlântica, Rede Cerrado, Mais Cerrado, Greenpeace, Coca-Cola, ISA – Instituto Sócio Ambiental, TNC, SOS Green, UNB, Ecodata, Irsan, Tetra Pak, IPHAN , Imazon, entre outros. Acompanharam ainda o debate, no auditório Freitas Nobre, da Câmara dos Deputados, alunos de direito da Universidade Mackenzie, de São Paulo.
Fonte: Comunicação Lid-PV
Foto: Paula Laport / Lid-PV