Bom Dia Brasil traz mais uma reportagem especial sobre o tráfico internacional de animais silvestres. Apesar de estar cometendo um crime, quem maltrata e comercializa animais silvestres, mesmo aqueles que estão em risco extinção, dificilmente vai para cadeia no Brasil.
O fiscal bate à porta e corre no meio do mato. De pistola em punho, está à procura do autor de um crime contra o meio ambiente. Os agentes do Ibama encontram arapucas prontas para a caça e dezenas de gaiolas, mas o dono do sítio, Aloísio Pereira, que já tinha sido autuado outras duas vezes pelo mesmo crime, conseguiu fugir.
“Na hora que você tem assim um monte de animal sendo colocado no mesmo local e tudo é porque você está acumulando para depois levar para o transportador e levar para a feira. Então é uma característica de quem trafica animal, manter o animal dessa forma”, afirma o agente ambiental Federal/IBAMA Roberto Cabral Borges.
No interior da Bahia, a fauna típica da Caatinga ainda é abundante e os traficantes aproveitam. Não tem cama, não tem banheiro. O espaço foi transformado em uma oficina, mais tem uma gaiola dentro e material. A madeira é bem porosa, ideal para fazer arapucas, alçapões. O viveiro estava sendo construído quando o dono fugiu.
No sítio vizinho, os fiscais encontram uma arma, alçapões, e dezenas de passarinhos. “Esse cardeal, meu sobrinho já deu R$ 1 mil e meu esposo disse que não vendia”, conta Maria de Souza.
Além do cardeal, tem outros passarinhos. O amarelo e preto, o pintassilgo do Nordeste, está ameaçado de extinção.
O dono do sítio Domingos Pereira Novaes disse que já pediu ao sobrinho que abandone o comércio de animais. “Já falei com ele: ‘Rapaz, tu deixa esse ramo, que esse ramo de passarinho é perigoso. Você não viu passar na televisão que esse ramo de passarinho é que nem ramo de droga?’”, afirma.
Todo o material apreendido foi queimado, e as aves em condições de voltar à natureza foram libertadas. O sofrê gosta de imitar o canto de outras aves, mas parece apenas repetir um lamento. Um cachorro divide o pequeno canil com dois jabutis.
Em Catu, a 90 quilômetros de Salvador, essa é uma situação típica encontrada pelos fiscais do Ibama: uma casa de fachada simples, com apenas uma ou duas gaiolas na entrada. Na verdade, é um chamariz para uma loja do tráfico. Na sala tem várias gaiolas penduradas nas paredes e tem passarinhos, alguns muito valiosos, em todos os cantos da casa.
Para os fiscais, o destino desses animais seria o comércio ilegal, mas o Ibama diz que tem capacidade limitada para combater o crime. Tudo o que pode fazer é dar flagrantes, apreender as aves e aplicar a multa.
De acordo com a lei, é crime comercializar, matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. A pena vai de seis meses a um ano de prisão, e multa, que varia de R$ 500 a R$ 5 mil por cada animal.
“Os animais são mantidos em uma condição insalubre, em uma condição de maus tratos, são mantidos sem iluminação solar. É uma situação de maus tratos, além da situação de tráfico”, afirma o agente do Ibama.
A dona da casa diz que tudo pertence ao irmão dela. “Não tenho nada a ver, não sou criadora de passarinho. Entendo de cozinha e de casa”, diz. O lugar fica em frente ao condomínio onde moram o delegado, o comandante da PM e a juíza da cidade. Nenhuma autoridade, no entanto, jamais denunciou o crime cometido ali.
O Bom Dia Brasil foi até o fórum, que fica a 50 metros. Na sala do tribunal, uma surpresa. É raro ver uma salamanta, que tem hábitos noturnos e vive entre as rochas. Mas a serpente desliza entre o ombro e o pescoço da juíza de Catu, Debora Moreira. “É um colar chiquérrimo e exclusivíssimo”, diz.
A Salamanta tem nota fiscal e registro de um criador licenciado e está dentro da lei. A juíza diz que a pena para o crime de tráfico de animais é muito baixa e contribui para a impunidade. “Ninguém vai preso por praticar tráfico de animais silvestres. Acaba caindo na lei 9099, que prevê uma transação penal, através do pagamento de algumas cestas básicas, algum valor ou a alguma prestação de serviços à comunidade. Você passa pelas estradas e as pessoas estão com animais, alguns até em fase de extinção. O lucro é para os atravessadores que estão repassando isso aí para frente e até para o exterior”, ressalta a juíza.
Fonte : G1