As emissões totais de gases de efeito estufa, incluindo emissões sem CO2, devem diminuir até serem zeradas em 2100
Com o objetivo de limitar o aumento da temperatura global em 2 °C e deter os piores impactos da mudança climática, a neutralidade de carbono em âmbito mundial deve ser atingida entre a metade e o final do século. Isso também deve manter sob controle a quantidade máxima de dióxido de carbono (CO2) que pode ser emitida na atmosfera, permanecendo dentro dos limites seguros de temperatura, de 2020 em diante, afirma um novo relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
Ultrapassar o orçamento estimado de mil gigatoneladas de dióxido de carbono (Gt CO2) aumentaria o risco de impactos severos, generalizados e, em alguns casos, irreversíveis de mudança climática.
Divulgado alguns dias antes da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas em Lima, no Peru, o Relatório sobre a Lacuna de Emissões (Emissions Gap Report, em inglês) de 2014 do PNUMA é o quinto de uma série que verifica se os compromissos assumidos pelos países estão conseguindo cumprir a meta de se manter abaixo de 2 °C, acordada internacionalmente. O relatório foi elaborado por 38 cientistas renomados de 22 grupos de pesquisa, em 14 países. Com base nas conclusões do quinto relatório de avaliação do Painel Internacional sobre Mudança Climática (IPCC), o Relatório sobre a Lacuna de Emissões do PNUMA mostra os limites para as emissões globais que possibilitariam a permanência dentro dos 2 ºC, incluindo um período de pico nos próximos dez anos; a redução pela metade de todas as emissões de gases de efeito estufa até meados do século; e, na segunda metade do século, a neutralidade de carbono seguida por um saldo nulo de emissões de gases de efeito estufa (GEE).
“Um aumento da temperatura global é proporcional ao acúmulo de longa duração dos gases de efeito estufa na atmosfera, especialmente o CO2. Uma ação mais decidida agora reduz a necessidade posterior de medidas extremas adicionais para permanecer dentro dos limites seguros de emissão”, disse Achim Steiner, Sub-Secretário-Geral das Nações Unidas e Diretor-Executivo do PNUMA.
“No cenário de projeções habituais, em que é feito pouco progresso no desenvolvimento e na implementação de políticas de mudanças climáticas globais, as emissões de GEE podem chegar a 87 Gt CO2e até 2050, muito além dos limites de segurança. Os países estão cada vez mais atentos às metas que precisam ser atingidas, realisticamente, em 2025, 2030 e além, a fim de limitar o aumento da temperatura global para abaixo de 2 °C. Este quinto Relatório sobre a Lacuna de Emissões destaca que a neutralidade de carbono – e o saldo líquido zero ou o que alguns chamam de ‘neutralidade climática’ – será necessária para que as emissões cumulativas restantes sejam absorvidas de forma segura pela infraestrutura natural do planeta, como florestas e solos”, acrescentou Achim Steiner.
“Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável destacam as diversas sinergias entre os objetivos de desenvolvimento e de mitigação das mudanças climáticas. Vincular as políticas de desenvolvimento à mitigação das mudanças climáticas ajudará os países a construir as infraestruturas energéticas eficientes e de baixo teor de carbono do futuro, e a alcançar a mudança transformacional que ecoa o verdadeiro significado do desenvolvimento sustentável”, concluiu.
Para evitar de ultrapassar o orçamento, a neutralidade do carbono em âmbito mundial deve ser atingida entre 2055 e 2070, o que significa que as emissões antropogênicas anuais de CO2 deverão então atingir o saldo líquido nulo na escala global. O saldo líquido zero implica que algumas emissões restantes do CO2 podem ser compensadas pela mesma quantidade de absorção de dióxido de carbono, ou emissões “negativas”, desde que as contribuições líquidas à atmosfera devido à atividade humana sejam nulas, conclui o relatório.
Levando em conta os gases de efeito estufa sem CO2 – incluindo metano, o óxido nitroso e hidrofluorocarbonos –, as emissões totais no mundo precisam diminuir até alcançarem um saldo líquido nulo entre 2080 e 2100.
Andrew Steer, presidente e diretor executivo do World Resources Institute, declarou: “Este relatório oferece uma das análises mais claras e técnicas das emissões globais, mostrando como os compromissos e ações dos países são medidos em termos científicos.” “Infelizmente, no momento, o mundo não está no caminho certo. Mas, com o impulso crescente em direção a uma ação climática global, temos a oportunidade de diminuir a lacuna e manter as emissões dentro dos limites determinados pela ciência para evitar os piores impactos da mudança climática.”
Desde 1990, as emissões globais de gás de efeito estufa aumentaram em mais de 45%. Para que haja uma probabilidade real de permanecerem abaixo do limite de 2 °C, as emissões globais de gases de efeito estufa devem diminuir em cerca de 15% ou mais até 2030 em comparação a 2010, e serem pelo menos 50% menores em 2050 rumo ao saldo líquido nulo.
As edições anteriores do Relatório sobre a Lacuna de Emissões abordaram as boas práticas adotadas em diferentes setores e sua capacidade de estimular a atividade e o desenvolvimento econômicos e, ao mesmo tempo, reduzir as emissões.
Este ano, o relatório também analisa como as metas de desenvolvimento internacional e políticas correspondentes em nível nacional podem trazer vários benefícios, incluindo a mitigação das mudanças climáticas com foco específico na eficiência energética.
Reduzindo a lacuna
O Relatório sobre a Lacuna de Emissões de 2014 define a lacuna de emissões como sendo a diferença entre os níveis de emissões em 2025 e 2030, consistente com o cumprimento das metas climáticas em relação aos níveis esperados se forem cumpridos os compromissos dos países.
Os cientistas estimam que a lacuna em 2020 seja de até 10 Gt CO2e e, em 2030, de até 17 Gt CO2e. Em relação às projeções usuais de emissões em 2030 (68 Gt CO2e), a lacuna é ainda maior: 26 Gt CO2e.
Apesar de a lacuna não estar diminuindo, o relatório estima que ela pode ser atenuada se as reduções de emissões globais disponíveis forem empregadas: o potencial de redução de emissões em 2030 – em relação às projeções usuais de emissões – está estimado em 29 Gt CO2e.
O custo de ação retardada
Adiar uma ação rigorosa até 2020 proporcionará economias de custos de mitigação em curto prazo, mas trará posteriormente custos muito mais elevados em termos de:
Taxas mais elevadas de reduções de emissões globais em médio prazo;
Sujeição das infraestruturas com emissão intensiva de carbono;
Dependência no uso de todas as tecnologias de mitigação disponíveis em médio prazo;
Maiores custos de mitigação em médio e longo prazo e maior risco de perturbações econômicas;
Dependência de emissões negativas; e
Riscos maiores de não cumprimento da meta dos 2 °C, o que levaria a desafios e custos de adaptação substancialmente mais elevados.
A eficiência energética e a agenda de desenvolvimento pós-2015
A eficiência energética não somente reduz ou evita as emissões de efeito estufa, como também pode aumentar a produtividade e sustentabilidade graças à economia de energia e ao apoio ao desenvolvimento social, aumentando o número de empregos e a segurança energética.
Por exemplo:
Estima-se que entre 2015 e 2030 a melhoria da eficiência energética em todo o mundo pode eliminar a emissão de pelo menos 2,5 a 3,3 Gt CO2e por ano.
A Agência Internacional de Energia informa que a eficiência de combustível e energética podem economizar 6,8 Gt CO2e, e a troca do uso de combustíveis fósseis pela eficiência energética pode economizar mais 0,3 Gt CO2e até 2030. Alguns países e outros atores já estão aplicando políticas que favorecem tanto o desenvolvimento sustentável como a mitigação das mudanças climáticas. Cerca de metade dos países do mundo tem políticas nacionais para promover um uso mais eficiente da energia em edifícios.
Cerca da metade vem trabalhando para aumentar a eficiência energética de aparelhos elétricos e sistemas de iluminação.
Outras políticas e medidas nacionais estão promovendo a geração de eletricidade a partir de energias renováveis, diminuindo a demanda de transporte e provocando mudanças nos meios de transporte, reduzindo as emissões oriundas de processos industriais e impulsionando a agricultura sustentável.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável em discussão mostram as diversas relações estreitas entre os objetivos de desenvolvimento e de mitigação das mudanças climáticas. Por exemplo, se plenamente concretizados, os esforços para a erradicação da pobreza energética, a promoção do acesso universal a formas mais limpas de energia e a duplicação da eficiência energética ajudariam muito a colocar o mundo em um caminho compatível com a meta climática.
Fonte : ONU/ PNUMA