Por: José Carlos Lima
O Brasil está de mau-humor, pessimista e dividido. Foi o resumo que fiz de uma pesquisa publicada na Revista Valor Econômico, com o título Eleitor pós-Covid, sabendo que ainda não chegamos no pós-pandemia.
A divisão e o mau-humor com que o país reage (uma parcela faz piadas e dá boas gargalhadas) estão expressos também nas decisões do STF, nas medidas econômicas anunciadas pelo Governo, nas operações da PF e até em uma romaria, que donos de PET quiseram fazer em honra de Nossa Senhora de Nazaré em Belém do Pará, mas que não teve a aprovação da Igreja Católica.
Dos mais complexos aos mais simples temas, tudo tende a dividir o país, que, segundo a pesquisa, tem 28% de conservadores, 19% de liberais, 19% de socialistas, 9% de progressistas, 3% de comunistas e 22% não sabem.
Mesmo no esporte, outrora paixão nacional, o país recebe notícias polêmicas e reage. Robinho, um craque revelado pelo Santos, participou de um crime de violência sexual cometido em grupo. O jogador se diz inocente, suspendeu o contrato para não prejudicar o Clube e novamente a sociedade é chamada para arbitrar um caso em que sua opinião não terá qualquer influência prática, mas que provocará um sentimento de angústia espiritual por se ver diante de uma terrível fraqueza humana, que nos obriga a profundas reflexões.
Quando perguntado pela pesquisa sobre a expectativa com a vida nos próximos anos, 40% acham que vai piorar, 11% que ficará igual e 49% dizem que vai melhorar. Mais da metade do país está pessimista.
O caso mais recente que dividiu a cúpula do Judiciário brasileiro, foi o do André do Rap, traficante que ascendeu ao top da organização criminosa, após ser preso, aos 19 anos, e ser educado pelo crime, dentro de uma instituição oficial, criada para ressocializá-lo.
O ministro que o soltou, errou. O ministro que revogou a soltura, também errou. Eu explico. A concessão de habeas corpus com base apenas na aplicação literal de um artigo do Código Penal não é correta do ponto de vista da aplicação da Justiça, uma vez que viola outros artigos do mesmo CP. A anulação da decisão de um membro da Corte por parte do Presidente, também não tem amparo legal.
Na prática, André do Rap, que quando jovem deveria ter recebido os benefícios de uma boa educação e da ressocialização, nunca teve este apoio, aprendeu, porém, que o sistema se move por poder e dinheiro e tendo os dois adquiridos no mundo paralelo em que viveu parte de sua vida, usou em seu benefício, desmoralizando o sistema oficial.
A pandemia gerou uma grave crise econômica e fiscal. O Governo busca soluções e cada vez que apresenta as possíveis saídas, encontra reações e gera mais polêmicas. Manter o auxílio emergencial, transformá-lo em Renda Brasil ou Renda Cidadã, diminuir o valor, criar novos impostos, gerar inflação. Quem é que aguenta viver com o coração tranquilo em meio a tantas incertezas?
O senador que deveria fiscalizar os gastos com a pandemia, foi encontrado com maços de notas de real dentro das roupas íntimas. A PF foi à casa de um brasileiro, cidadão, senador da República, cumprir um mandado de busca e apreensão. Viu um volume suspeito, retangular, parecido com maços de cédulas, dentro das roupas íntimas do político. Revistou e encontrou o dinheiro de origem suspeita. Lavrou o ocorrido em detalhes, com as devidas cautelas para evitar cometer ilegalidades. Perfeito. A pergunta: quem vazou os detalhes, quem acrescentou a insinuação do dinheiro nas nádegas e com que objetivo os detalhes sórdidos foram expostos?
O senador, alvo da operação, poderia ter deixado o dinheiro à amostra, em lugar visível, até confessado que se tratava de recurso para aplicação em campanha eleitoral de seus aliados, teria evitado a espetacularização da operação e quem sabe preservaria o mandato e até o cargo de vice-líder do governo. Mas o senador se apavorou. Tremeu ao ser flagrado. Construiu a imagem que viralizaria e colocaria mais uma vez a nação entre a cruz e a caldeirinha.
A operação da PF perdeu a importância pelos outros detalhes que estão sob investigação, que, aliás, são gravíssimos. Para impactar, construiu-se uma narrativa de que o dinheiro estava nas nádegas do senador, quando na verdade estava dentro da cueca. Mas se ficasse apenas dentro da cueca, não seria inusitado, outro político já havia estreado esta comédia. Nesse momento, entrou em cena o roteirista dos nossos escândalos e incluiu a pitada de cenografia, perfeita para produção de piadas e meme. Um gênio.
O ministro do STF afastou o senador monocraticamente, mas não podia fazê-lo, não está previsto em nenhuma legislação. Um ministro do STF pode muito, mas não está entre os seus muitos poderes este de afastar um senador eleito pelo povo. Quem deve afastá-lo é o Poder Legislativo.
O senador precisa ser punido, mas o que se deseja é que tudo seja feito de acordo com a lei e sem jogar a sociedade em polêmicas e divisões. Afinal, o objetivo do Estado é a busca pela paz social.
Quanto à romaria de PETs, bom, isto é um assunto bem mais delicado. Dizem que romaria vem de romero ou romeiro, significando uma pessoa que viaja para Roma.