Do Valor Online:
O governo brasileiro corre sérios riscos de chegar de “mãos abanando”, sem instrumentos nem propostas concretas, à cúpula sobre mudanças climáticas, em Copenhague, na Dinamarca.
O projeto de lei enviado pelo governo ao Congresso Nacional, em junho do ano passado, ainda aguarda a instalação de uma comissão especial na Câmara. Os parlamentares admitem que não haverá tempo hábil para aprovar uma proposta de consenso antes da chamada “CoP-15”, marcada para dezembro. E o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, já antecipa o “mico” que resultará das discussões sobre a Política Nacional de Mudanças Climáticas.
“O momento é esse. Se não aprovarmos, vai ser um mico”, lamentou, em entrevista ao Valor. “É ruim para nossa posição em Copenhague, mas é pior ainda para nós aqui. Se o clima já é dramático hoje, imagina em 30 anos quando a temperatura aumentar”. Nem mesmo as restrições ao plantio da cana-de-açúcar no Brasil será capaz de amenizar a falta de uma proposta abrangente sobre o clima pelo Brasil.
Aprovada na Comissão de Meio Ambiente, a proposta original do governo (PL nº 3535) acabou anexada a outras iniciativas de legislação. “Não dará tempo para aprovar. O Brasil está muito atrasado, está perdendo uma oportunidade histórica porque aceitou ir a reboque nessas discussões”, avalia o líder do PV na Câmara, Sarney Filho (MA). “Mas a culpa não é do Congresso.
É do governo, que não decidiu o que quer”. Os parlamentares acusam o governo de resistir em adotar metas claras de redução das emissões de gases causadores do efeito estufa. “O governo não quer constranger a Índia e China”, analisa Sarney Filho. O Itamaraty faz, segundo ele, “contorcionismos” para evitar o termo “meta”. Mas, segundo o deputado, os diplomatas prometem apresentar “números para baixar a curva das emissões” por meio de médias aritméticas históricas.
O ministro Minc rejeita a culpa pelo atraso na aprovação da política. “Não podem dizer que o governo mandou na véspera porque foi no ano passado, junto com o plano. Estou me mexendo, jogando pesado para aprovar logo”, rebate. E insiste no apelo aos líderes do Congresso. “Temos que chegar a Copenhague com um trunfo porque, aí, poderemos cobrar mais, fazer o dever de casa para cobrar dos países ricos”.
O ministro diz que já teve reuniões com vários parlamentares, sobretudo do Nordeste – onde o drama do clima será mais severo – e que fará um novo apelo ao líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), na tentativa de acelerar a votação na comissão especial da Câmara. “O Nordeste vai sofrer mais com as mudanças no clima e a bancada parece que está mobilizada”.
Em defesa do projeto original do governo, o ministro Minc afirma que, para além das metas de redução das emissões, será fundamental a criação de um fundo com recursos do lucro da exploração do petróleo.
Minc defende o fundo composto por 6% dessa receita no combate aos efeitos das mudanças climáticas. “Teremos ao menos R$ 1 bilhão anuais. E metade disso iria para o Nordeste”, diz. “Seremos o primeiro país a ter esse fundo”. Se aprovar a iniciativa, o Brasil poderia “falar grosso” nas negociações sobre o clima em Copenhague. “Não é um imposto novo. Bolei a partir de Lei do Petróleo, que dá 10% do lucro para mitigar problemas ambientais. Podemos usar 60% disso no fundo”, argumenta.
E lamenta a não utilização desses recursos atualmente: “Como não se usa, vai para o caixa único, para o superávit fiscal. Temos que transformar isso em superávit ambiental”.
Minc conta ter remanejado o que estava previsto na Lei do Petróleo. “Era para prevenção e mitigação. Mas já que atinge ar, e o clima por tabela, vai para o clima”. O tema parece ter virado obsessão para o ministro. “Estou em cima. A ideia foi minha. É uma coisa firme porque varia em relação ao lucro do petróleo. E já deve estar acima de R$ 1 bilhão”, afirma Minc.
Mesmo diante do entusiasmo do ministro, a oposição reclama da confusão gerada ao longo da tramitação do PL do Executivo. Autor de um projeto de lei anterior ao enviado à Câmara pelo governo, o deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP) acusa uma má vontade nas tratativas sobre o tema. “Meu projeto já era para ter sido aprovado. Nunca vi isso”, diz.
O relator do projeto, deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), teria embaralhado o jogo ao sugerir novos termos em vez de apresentar um substitutivo normal. “Ele apresentou um relatório alternativo só com as ideias dele. E está caminhando em separado. É estranho. Imaginei que ele ia unir os dois projetos, meu e do governo”, reclama Thame, um especialista no tema. “Não faço ideia do porquê disso. Na verdade, o governo não quer aprovar nada”.