Um novo modelo de produção e consumo sustentáveis
A Grande Depressão econômica que teve início em 1929 com o crash da Bolsa de Nova York provocou um colapso econômico sem precedentes no sistema capitalista mundial, e desmoralizou as teorias então dominantes do liberalismo econômico, que garantiam que a “mão invisível” do mercado resolveria tudo naturalmente. Não resolveu. Então, entre 1933 e 1937, o presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt criou o chamado “New Deal” (“Novo Acordo” ou “Novo Pacto”), um ousado plano de intervenção do Estado na economia para investir em obras públicas de modo a gerar empregos e a retomar o crescimento econômico do país. A recuperação foi notável, e vários países adotaram projetos semelhantes depois da II Guerra Mundial.
Desde os anos 80, contudo, o mundo foi assolado por uma ofensiva neoliberal contra o welfare state que praticamente destruiu as grandes conquistas sociais do pós-guerra. Pior foi o Brasil, que não construiu esse colchão social e, por isso, vem sofrendo mais duramente com os efeitos do crescimento econômico pífio, do desemprego estrutural, do aumento da desigualdade e da enorme degradação ambiental.
A eclosão da pandemia da Covid-19 agravou brutalmente essas contradições, sobretudo em países emergentes como o nosso. Mas quem sabe não seja essa a oportunidade de pensarmos em soluções inovadoras e sustentáveis? Uma nova “onda verde” global parece ganhar fôlego.
Desde 2019, uma geração de parlamentares do Partido Democrata dos EUA, liderados pela deputada Alexandria Ocasio-Cortez, está propondo um “New Deal verde”. A ideia surgiu depois de eles terem constatado que parte dos R$ 800 bilhões gastos pelo Estado norte-americano para tirar o país da recessão de 2008 subsidiaram empresas à base de energia não renovável.
Assim, o objetivo do “New Deal verde” é levar o planeta a uma economia de zero emissões de carbono até o ano de 2050. Nesse modelo de produção e consumo sustentáveis, os EUA devem adotar medidas drásticas para reduzir a emissão de poluentes em todos os setores industriais, transportes, eletricidade e sistemas de aquecimento. O plano prevê que até o fim da década 100% da energia elétrica deva ser gerada por fontes renováveis; renovação completa da rede de distribuição de eletricidade e reestruturação de todas as moradias para a economia e eficiência energética; bem como investimentos maciços em transportes públicos e em veículos elétricos.
O “New Deal verde” prevê que o governo crie empregos qualificados na área de meio ambiente, como em energias renováveis. Direitos humanos fundamentais devem incluir ar limpo, água não poluída e comida saudável.
O plano de Alexandria Ocasio-Cortez já foi incorporado por Joe Biden, provável candidato democrata à Casa Branca em novembro, que pretende gastar quase US$ 2 trilhões em investimentos durante uma década.
Compartilhando o temor pela ameaça das alterações climáticas e da degradação do meio ambiente, a União Europeia também elaborou uma estratégia semelhante, o European Green Deal, ou Pacto Ecológico Europeu, com o objetivo de transformar a Europa em uma economia moderna, eficiente no aproveitamento dos recursos e competitiva. Segundo a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o plano prevê gastos de € 1 trilhão em uma década, entre recursos públicos e privados. A Coreia do Sul também está prometendo um “New Deal verde”.
A crise também oferece a nós, brasileiros, uma oportunidade única de superarmos o neoliberalismo e o velho desenvolvimentismo predatórios. Nós temos uma enorme tradição de luta ambiental que deve ser canalizada para a consecução de um novo modelo de desenvolvimento, nos termos do que propõe o “New Deal verde”. A sociedade civil e o campo democrático devem abraçar essa bandeira, a única capaz de garantir o futuro do país, das próximas gerações e do planeta. Vamos surfar nessa onda?
Fonte: O Tempo