Capacidade instalada cresceu 9% em 2016 e foi maior do que a soma de todas as fontes fósseis e já dispensa a necessidade de “energia firme” na matriz elétrica
O principal relatório anual sobre o estado das energias renováveis no mundo foi publicado nesta quinta-feira (7), e tem números para justificar todos os estados de ânimo da humanidade em relação à crise do clima.
Quem quer ver o copo meio cheio gostará de saber que, em 2016, o mundo adicionou 161 gigawatts – o equivalente a mais de dez usinas de Itaipu – de energia renovável à matriz, um crescimento de 9% em relação ao ano anterior.
O preço da geração renovável em alguns países caiu para menos de 5 centavos de dólar o quilowatt/hora; mesmo em nações pobres, essas fontes hoje frequentemente são as opções mais baratas. Aliás, os investimentos em renováveis, de US$ 250 bilhões, representaram mais do que o dobro dos investimentos em todos os fósseis somados (US$ 114 bilhões). O crescimento mais espetacular foi o da energia fotovoltaica: a cada hora de 2016 foram instalados 31 mil painéis solares no mundo.
Quem prefere ver o copo meio vazio argumentará que os investimentos em renováveis caíram 23% no ano passado, o maior tombo em uma década. E dirá também que, mesmo com um crescimento espetacular neste século, duas vezes maior que o da demanda, as novas renováveis, como a solar e a eólica, ainda são anãs: respondem por menos de 2% do consumo total de energia no mundo, contra 78,4% dos combustíveis fósseis. Pior: com US$ 4 gastos em subsídios a combustíveis fósseis para cada dólar de subsídio a renováveis, a transição não está acontecendo em velocidade suficiente para cumprir o objetivo do Acordo de Paris de estabilizar o aquecimento global abaixo de 2oC.
As informações vêm do Ren21, relatório produzido anualmente pela organização homônima que monitora as tendências das energias renováveis, o marca-passo da descarbonização da economia global.
Mesmo diante do desafio de alcançar e ultrapassar os fósseis na matriz global, as energias renováveis em 2016 desmontaram mais uma vez a linha de raciocínio, se é que se pode chamar assim, usada por Donald Trump para abandonar o Acordo de Paris, na semana passada.
Além de adicionar mais megawatts à economia mundial que todos os fósseis somados, o setor de renováveis também gera empregos. Hoje no mundo há 9,8 milhões de pessoas empregadas no setor, 777 mil nos EUA – onde somente a geração de energia solar e eólica tiveram um aumento de 16% na geração de empregos. A China é de longe o maior empregador, com 3,9 milhões de trabalhadores na indústria das renováveis, seguida pelo Brasil, com 1 milhão de empregos – mantidos em grande parte pelo segmento de biocombustíveis.
Dentre todos os renováveis, quem mais emprega é a energia solar, que também lidera a expansão mundial dentre todas as renováveis. No ano passado, 75 gigawatts foram instalados, o equivalente à potência somada das usinas hidrelétricas do Madeira e do Teles Pires. A China respondeu por quase metade da capacidade instalada, 34 gigawatts, seguida por EUA (sim, Donald!) e Japão. O Brasil nem sequer aparece na lista dos países com adições dessa fonte.
Outra conclusão do relatório, que deveria ser lida pelos planejadores energéticos brasileiros, é que a expansão vertiginosa das renováveis está tornando obsoleta a proclamada necessidade de “energia firme” ou “energia de base” na matriz elétrica para compensar a intermitência das renováveis.
Esse argumento tem sido usado pela eletrocracia nacional para justificar a necessidade de grandes hidrelétricas na Amazônia. A ex-presidente Dilma Rousseff, por exemplo, gostava de dizer que “não dá para estocar vento” – ou seja, sem hidrelétricas, o país teria de construir térmicas fósseis para garantir a energia durante os períodos em que hão houvesse sol nem vento.
O Ren21 afirma que isso é um “mito”.
Em 2016, a Dinamarca chegou a fornecer eletricidade apenas com renováveis num pico de demanda 140% maior que a geração; a Alemanha teve um pico de 86% atendido apenas por fontes como vento e sol. Isso acontece por causa de sistemas interligados com outros países e por causa de redes grandes, nas quais a geração de uma fonte sempre compensa a intermitência de outra. Mesmo sem capacidade adicional de estocar energia, países como Portugal, Irlanda e Chipre estão conseguindo ter 20% a 30% de sua eletricidade fornecida por renováveis (excluindo grandes hidrelétricas).
Fonte: Observatório do Clima