Em Alto Paraíso de Goiás, a 242 km de Brasília, uma única cadeira na Câmara Municipal será dividida, em 2017, por cinco pessoas. É que um grupo de amigos foi “eleito” em 2016 para uma única vaga de vereador na cidade, que fica às portas do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros e é famosa por reunir pessoas que buscam avistar óvnis.
Mas como isso foi possível? O mandato coletivo, não reconhecido pela Justiça eleitoral, funcionará em Alto Paraíso de forma informal (apenas um dos amigos foi oficialmente eleito).
A história começou com o advogado João Yuji Moraes e Silva, de 31 anos, autor da ideia. Ele se filiou ao PTN (Partido Trabalhista Nacional) para cumprir as exigências da legislação brasileira, pois todo candidato no país é obrigado a pertencer a uma agremiação política.
“Se não fosse obrigatório, teria apresentado diretamente minha candidatura. Estou conhecendo o PTN apenas agora, depois das eleições”, conta Yuji, que já foi da Rede, o partido de Marina Silva.
Ele se registrou como pretendente a uma vaga na Câmara Municipal e recebeu um número: 19.111. Durante a campanha, que teve gasto declarado de R$ 2.740, o material publicitário, porém, não divulgava apenas um candidato (Yuji), mas cinco.
A proposta do grupo foi: o eleitor que escolhesse digitar na urna eletrônica o número 19.111 veria apenas a foto de Yuji na tela, mas, na verdade, estaria votando nos cinco. Todas as decisões durante o mandato serão tomadas coletivamente.
Eis um breve currículo dos cinco e em que área cada um deles pretende atuar durante o mandato de quatro anos.
CINCO EM UM
JOÃO YUJI MORAES E SILVA
Advogado e assessor jurídico da Câmara Municipal de Alto Paraíso de Goiás desde 2011. Natural de Cotia (SP), mudou-se para Goiás há cerca de seis anos atrás de “qualidade de vida”. Já tinha sido candidato a vereador em 2012, sem sucesso. Cuidará da área jurídica.
IVAN (ANJO) DINIZ SOUZA
Turismólogo, jornalista, orador, poeta e guia turístico. É criador da Festa da Lua Nova, realizada mensalmente na cidade há mais de cinco anos. Montou uma página de caronas para quem vai da Chapada dos Veadeiros a Brasília e vice-versa. Tocou nas bandas Viajarte e Rasta Family. Responsável pela cultura, meio ambiente e turismo.
LARYSSA FANNY GALANTINI PIRES
Bióloga e mestre em biodiversidade e conservação pela Unicamp. Terá funções na área de meio ambiente.
CÉSAR ADRIANO DE SOUZA BARBOSA (PROF. SAT)
Engenheiro industrial e analista de sistemas pela PUC-RJ, é empresário hoteleiro e terapeuta ayurvédico (de ayurveda, tipo de terapia indiana). Foi secretário de Meio Ambiente e Turismo da cidade nos anos 90. Cuidará do tema de educação.
LUÍS PAULO VEIGA NUNES
Mestre em química pela Unesp. Atua em projetos de agroecologia e integra o conselho municipal de educação. Responsável por turismo e comércio.
Como a iniciativa não tem validade para a Justiça eleitoral, que reconhece apenas Yuji como eleito, o grupo decidiu formalizar seus compromissos junto aos eleitores assinando um acordo, que foi registrado em cartório. O documento dá detalhes de como funcionará o mandato.
Quem falará em plenário
Yuji irá proferir os votos na Câmara Municipal, conforme vontade da maioria. As funções legislativa e jurídica serão sempre dele, formalmente registrado como vereador.
Decisões no calor da hora
Se for preciso tomar alguma decisão de forma rápida, sobre um tema não discutido previamente, a questão será votada pelos membros que estiverem na sessão, na área restrita ao público em geral: eles “levantarão o braço para sinalizar o desejo de um voto favorável”, diz o acordo.
Sempre cabe mais um
O grupo pode aumentar, se assim a maioria quiser. Mas também poderá diminuir: um deles será expulso se três quartos decidirem por isso. Quem sair por vontade própria poderá indicar um substituto.
Salário para o bem comum
Segundo o grupo, ninguém ficará com o salário de vereador, de cerca de R$ 5.000. O valor será destinado a “projetos de interesse da comunidade, como o bom funcionamento dos sistemas de saúde e educação, a defesa do meio ambiente, a disseminação de conhecimento agroecológico e a realização de eventos culturais”.
O tamanho da votação
Mas cinco pessoas conseguirão dividir um gabinete? “Aqui em Alto Paraíso nenhum vereador tem gabinete. Nossa ideia é fazer reuniões uma vez por semana para tomarmos as decisões”, afirma Yuji. Ele diz ter se inspirado em iniciativas parecidas que conheceu pelo país. “Mas nenhuma delas se elegeu.”
Sobre a reação dos outros candidatos, Yuji diz ter ouvido reclamações de dois deles. “Um já até me pediu desculpas depois. O outro é cabeça dura mesmo”, conta.
Alto Paraíso de Goiás, com 7.454 habitantes, tem 5.734 eleitores, dos quais 148 (ou 3,53%) votaram no grupo. A cidade possui nove vereadores (ou 13, informalmente, a partir de 2017).
Fonte: nexo